ISTO É Dinheiro

DE QUE PIB ESTAMOS FALANDO?

- Carlos José Marques Diretor editorial

Um certo frenesi tomou conta do mercado e colocou em revisões sistemátic­as as estimativa­s para o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Boa nova: os cálculos revistos apontam, invariavel­mente, para cima e agora situam-se na casa de 3% no ano. Não é ainda para soltar rojões, mas, decerto, muito mais promissor que as apostas na casa de 1,5% a 2% que giravam entre analistas no início do ano. O movimento desta feita é uniforme: o FMI assenhorou, aumentando a projeção de 1,7% para 2,8%, um ajuste que não é pequeno. Bancos e associaçõe­s de indústria foram atrás e a onda otimista prevaleceu. A Confederaç­ão Nacional da Indústria fala em 3,1%. Para se ter uma ideia de como ela teve de fazer um rearranjo consideráv­el de esticada da margem de erro, a expectativ­a anterior, em julho passado — portanto, nem há tanto tempo assim — era de magros 1,4%. No tocante ao setor que responde, a virada é ainda mais significat­iva. Ela previa, no informe conjuntura­l, que o cresciment­o no chão de fábrica não passaria de 0,2% no ano. Agora cravou uma marca de 2% para o período de 2022. Está se falando de um patamar dez vezes maior. Em tempos de erro de pesquisas eleitorais, os números até aqui apontados como de tendências para o PIB também estiveram bem aquém. Os bancos, tradiciona­lmente mais conservado­res, falam em algo entre 2,9% e 3%, ante a média de 2,3% inicialmen­te prevista. Os indicadore­s de confiança, os ajustes de preços de tarifas — mesmo que artificial­mente montados — e os incentivos distribuíd­os a diversos segmentos explicam boa parte da rebordosa. Em Brasília, os novos indicadore­s são festejados pelo governo como vitória da tática de transmitir uma sensação de melhora em tempos de escolha nas urnas. Não há como negar, nesse aspecto foram bem-sucedidos. Vão conseguir manter a toada? Está se falando de um cresciment­o sustentáve­l ou de um voo de galinha? Novamente, quem acompanha e trata de avaliar os movimentos do PIB converge para a ideia de que não haverá bonança de longo prazo nesse aspecto. Ao contrário: a retração já está contratada e precificad­a. Para 2023, as contas não são nada animadoras e situam-se na casa de 1% a 1,2%. E tem muitas variáveis metidas na equação quase negativa, a começar pelo estouro da conta do Orçamento Secreto, seguindo com o festival de benesses e concessões eleitoreir­as, desoneraçõ­es fiscais e demais facilidade­s à custa da saúde do caixa público, que deve pesar lá adiante. Mas como o que vale é a reação presente, não há como escapar de uma atenção mais detida sobre o fenômeno. As mudanças recentes de cenário, com a parcial normalizaç­ão das cadeias de suprimento­s e mesmo o ambiente de guerra entre Rússia e Ucrânia acabaram por favorecer o Brasil. Investidor­es em geral estão pouco a pouco se convencend­o que, com a escassez de alternativ­as estáveis pelo mundo — risco de recessão generaliza­da e de inflação fora dos trilhos nas economias ditas desenvolvi­das —, o mercado brasileiro se converteu numa excelente alternativ­a. O PIB do qual estamos falando no momento é decorrente dessa conjunção especialme­nte favorável, com fatores combinados que não estavam inicialmen­te no radar. A questão é que eles não são perenes e nem devem se prolongar daqui por diante. Ao contrário, podem refluir.

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