O BÁSICO E O PECADO
A regulamentação institui que 15 produtos da cesta básica poderão ser desonerados integralmente. Com preferência para itens como arroz, feijão e farinha, além de itens in natura, e extinguindo da lista produtos ultraprocessados, açucarados ou em desalinho com a OMS. Os alimentos que ficarem de fora dos 15 ainda poderão ter regimes especiais, com reduções entre 40% e 60%.
Para garantir que o básico fique mais barato, o governo irá compensar com o que já ficou conhecido como Imposto do Pecado, na verdade, Imposto Seletivo (IS). Nessa lista entram cigarros, bebidas alcoólicas e açucaradas, veículos poluentes, extração de minério de ferro, petróleo e gás natural. Apesar de dizer quais produtos estarão sujeitos à tributação específica, o governo não previu no texto enviado ao Congresso os percentuais, que ficarão nas mãos do Congresso. A previsão da Fazenda é que as regulamentações aconteçam neste ano e em 2025. Assim, as alterações entrariam em vigor a partir de 2026.
Quem tem comemorado o avanço da regulamentação é a indústria. Atualmente, o setor tem a maior incidência de impostos, com média de 46%, enquanto serviços, atualmente, pagam em torno de 16%. Para o presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva, o modelo atual é anacrônico. “O antigo já tinha cumprido seu papel e estava absolutamente disfuncional. A reforma é um avanço para todos, especialmente para a indústria de transformação”, disse o presidente da Fiesp.
Segundo ele, os destaques na reforma foram a retirada de resíduos tributários cumulativos da cadeia produtiva; o fim dos impostos incidentes sobre bens de capital e dos investimentos; e a devolução às empresas, no prazo máximo de 30 dias, dos créditos retidos a serem recebidos dos entes federados. O vice-presi
dente da República e chefe do MDIC, Geraldo Alckmin, estima que, em 15 anos, a reforma pode aumentar em 12% o PIB e em 20% os investimentos. Mas para isso é preciso acertar agora. “Tudo que é difícil e complexo, o caminho é o gradualismo”, disse. “É melhor fazer de maneira gradual do que não fazer.”
A ideia de um caminho lento, mas constante, preocupa Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo e atual economista-chefe da Warren Investimentos. Para ele, o fato da regulamentação ter mais de 300 páginas indica que há margem para distorções. “Ainda restam dúvidas sobre como funcionará o contencioso tributário, a fiscalização, a arrecadação, funções precípuas dos governos”, afirmou.
Maílson da Nóbrega, ex- ministro da Fazenda, disse que havia espaço para uma alíquota ainda menor, mais próxima dos 20%, mas que as concessões prejudicam esse processo. Ele também ressaltou os problemas de reserva de apenas um trimestre para discussões tão amplas. “Com a eleição municipal, o Congresso pode acelerar as coisas e deixar passar pontos que seriam modificados caso houvesse tempo”, disse. Além disso, ainda há mais duas regulamentações a serem enviadas ao Congresso, sinalizando que o caminho será longo, terá um forte custo político, financeiro e imagético, mas também é capaz de garantir ao governo Lula III mais uma menção honrosa sobre seus feitos à frente do Brasil.