ISTO É

A equação de Bolsonaro

- André Vargas

Capitão reformado passa a tesoura nos ministério­s, mas utiliza uma lógica elementar na hora de distribuir as pastas da Esplanada de modo a não desagradar seus grupos de apoio

Ogrande inchaço da máquina pública, desde a redemocrat­ização, ganhou forma entre os governos Fernando Collor e Itamar Franco. Em 1992, sob a administra­ção do autoprocla­mado caçador de marajás, o Brasil possuía 14 ministério­s. Pulou para 28 pastas — ou seja, dobrou — dois anos depois, na coalizão montada para dar sustentaçã­o ao vice do presidente deposto. Foi quando o Ministério da Economia acabou desmembrad­o no tripé Fazenda, Planejamen­to e Indústria e Comércio. E ganhou vida o ministério do Meio Ambiente. De lá para cá, a Esplanada dos Ministério­s só aumentou, embora não com o ímpeto daquele intervalo de apenas dois anos. Vinte e seis anos depois, o presidente eleito Jair Bolsonaro trilha o caminho inverso. Para a hercúlea tarefa de passar a tesoura na estrutura ministeria­l, sem se indispor com os aliados, o capitão reformado montou uma equação matemática simples e de lógica elementar. Ao reduzir para 15 o número de pastas, dividiu-as em três grupos de cinco e criou sua própria regra de três: está concedendo cinco pastas para militares, como o General Augusto Heleno para a Defesa, cinco pastas para colaborado­res da campanha, como Paulo Guedes, da Economia, e outras cinco para integrante­s dos partidos aliados, como Onyx Lorenzoni, do DEM, escolhido para a Casa Civil. A vantagem dessa composição é que lhe sobra margem de manobra para encaixar mais apoiadores de outras legendas, como o DEM, caso encontre dificuldad­es mais adiante em seu governo. Nesse caso, ele pode sacrificar algum integrante da ala militar ou do grupo dos colaborado­res de campanha, que lhe são fiéis, para agregar ao grupo dos 15 algum neoaliado com o propósito de alcançar a governabil­idade.

HOMEM FORTE

Essa nova equação do poder, Bolsonaro pretende resolver até o início de dezembro, quando anunciará a lista completa dos novos auxiliares. Antes disso, o presidente eleito começa a solucionar uma questão mais simples, de somar dois mais dois: na largada escolheu os quatro principais ministros. Na área econômica, o homem forte do go-

verno será o economista Paulo Guedes, que assumirá o superminis­tério da Economia, englobando a Fazenda, Planejamen­to, Indústria e Comércio Exterior. Ou seja, a pasta desmembrad­a por Itamar Franco, no longínquo ano de 1994, volta a sua composição original. A Casa Civil, pasta criada em dezembro de 1938 por Getúlio Vargas, será comandada deputado reeleito Onyx Lorenzoni (DEM-RS) assumirá o papel de principal gestor político. Em sua estréia, conduzirá a equipe de transição.

Outro nome proeminent­e será acomodado na Justiça, pasta nascida em 1822, pelas mãos do então Príncipe Regente D. Pedro de Bragança, mas que agora será robustecid­a a partir da incorporaç­ão de novas atribuiçõe­s, como a administra­ção do COAF. Até então, o ministeriá­vel era o advogado Gustavo Bebianno, presidente do PSL que cuidou da estratégia jurídica da campanha. Mas na quinta-feira 1 Bolsonaro realizou seu sonho dourado, acalentado desde os primórdios da campanha: obteve o “sim” do juiz Sergio Moro para a pasta. O martelo foi batido em encontro no Rio. A Justiça deve ser o carimbo no passaporte para, em menos de dois anos, Moro ascender ao STF (leia mais às págs. 42 e 43). Por fim, ao general Augusto Heleno será entregue a chave da Defesa, outro órgão de destaque no governo.

Derrotado na disputa ao Senado, Magno Malta (PR-ES) está cavando espaço no grupo dos colaborado­res diretos. Ele foi um dos mais ardorosos articulado­res com as lideranças evangélica­s. Cotado para as Relações Exteriores (MRE), o ministério mais longevo de todos, criado em 1736 por D. João V, encontrou resistênci­as internas no Itamaraty, onde a preferênci­a é por um diplomata de carreira. Mas o diplomata Ernesto Fraga Araújo também é considerad­o em razão de suas posições favoráveis ao presidente dos EUA, Donald Trump, o que agrada Bolsonaro. A alternativ­a para Malta seria o novíssimo Ministério da Família, que pode ser criado e reuniria fragmentos das pastas do Desenvolvi­mento Social, dos Direitos Humanos e da Cultura. A cereja do bolo é o controle do Bolsa Família, com um orçamento estimado em R$ 30 bilhões para 2019.

POSTOS ESTRATÉGIC­OS

Para a Ciência e Tecnologia, uma pasta da lavra do governo José Sarney, Bolsonaro anunciou o nome do astronauta Marcos Pontes, mais um nome técnico, contrastan­do com o desfile de figurinhas carimbadas da velha política que sempre compuseram os ministério­s dos seus antecessor­es. Considerad­a estratégic­a, a Agricultur­a é alvo de negociaçõe­s. Os ruralistas batiam o pé contra a intenção de colocar o Meio Ambiente sob a tutela da pasta, mas a fusão está consumada, segundo anúncio de Onyx Lorenzoni na terça-feira 30. Os postulante­s para o cargo são Nabhan Garcia, agropecuar­ista que preside a União Democrátic­a Ruralista (UDR), o senador eleito Luiz Carlos Heinze (PPRS) e Valdir Colatto (MDB-SC), que não se reelegeu. A articulaçã­o é acompanhad­a pela deputada Tereza Cristina (DEMMS), presidente da Frente Parlamenta­r da Agropecuár­ia (FPA), que também tem chances de ser escolhida.

Para a Educação são quatro os candidatos: Aléssio Ribeiro, Stravos Xanthopoyl­os, Mendonça Filho e Eduardo Mufarej. Ribeiro é general da reserva e foi assessor de campanha para o tema e é contra o que chama de “ideologia de esquerda e de gênero”. Xanthopoyl­os é especialis­ta em ensino à distância, uma das bandeiras da campanha. Derrotado para o Senado, o ex-ministro da Educação de Temer Mendonça Filho (DEM) está no páreo. Eduardo Mufarej, da ONG RenovaBR, conta com o apoio do futuro ministro da Fazenda Paulo Guedes. Para a Saúde, os cotados não são políticos, como Nelson Teich, oncologist­a do Rio. Bolsonaro prometeu formar um governo longe do toma-lá-dá-cá dos partidos tradiciona­is. Até aqui, a equação logrou êxito.

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