Hábitos saudáveis são construídos desde cedo
Atividades lúdicas transformam a relação entre dentistas e crianças
Criança e dentista são duas palavras que, muitas vezes, não “combinam”. Quem nunca ouviu falar sobre a dificuldade para levar um filho, sobrinho ou neto pequeno em um consultório odontológico? Tal entrave é refletido em problemas bucais desde cedo. O medo da criança com relação ao dentista é algo a ser superado e a vida escolar pode ser uma grande aliada na tentativa de passar por cima desse “trauma” da infância. E é justamente nas escolas que o Sesc tenta estimular as crianças a lidar melhor com o consultório odontológico e construir hábitos saudáveis desde cedo. É o caso do ABCDente, programa desenvolvido pelo Sesc em Pernambuco. “Ainda existe muito medo do dentista, da cadeira, do barulhinho dos equipamentos. Esse trabalho ajuda a tirar esse temor. A criança passa a gostar da equipe, se sente à vontade e até quer ir para a clínica participar das atividades. Isso tudo auxilia bastante também em relação ao medo dos próprios pais. As crianças enxergam o dentista como um parceiro”, conta Sulamita Meira Almeida, mãe do Heitor, 13, e do Benjamin, 4.
O ABCDente é destinado à criação de hábitos saudáveis de higiene e dieta dos alunos do Ensino Infantil do Sesc Santo Amaro e Sesc Casa Amarela, no Recife. Por ano, o projeto contempla 400 crianças de três a seis anos com técnicas de escovação e uso de fio dental, utilizando atividades lúdicas, fantoches e teatro. Além disso, é oferecido tratamento curativo na clínica odontológica do Sesc, quando necessário, e aplicação de flúor duas vezes ao ano. Para a dentista Marilene de Fátima Meireles Duarte, coordenadora do ABCDente, as crianças são como agentes amplificadores porque tudo que vivenciam e aprendem no projeto acabam repassando para os pais, avós e demais familiares. “Mesmo aos pequenininhos, nós ensinamos, por exemplo, como os avós devem colocar a prótese dentária. É muito importante porque a criança consegue transmitir os conhecimentos para a família inteira. Conseguimos mudar hábitos, falar sobre nutrição, entre outras coisas. Tudo baseado no que a população local tem acesso”, explica. Além do ABCDente, o OdontoSocial é o outro projeto em Pernambuco. Com 15 anos de existência, foi responsável por beneficiar mais de 3 mil crianças e adolescentes de seis a 16 anos, atendidos por instituições que recebem doações do Banco de Alimentos. De acordo com o chefe de Odontologia do Sesc em Pernambuco, Wladmir Gomes de Lucena, o OdontoSocial realiza tratamentos curativos e preventivos, além de ações educativas sobre saúde bucal. “O projeto promove grande impacto de inclusão e cidadania em crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social. Todo o trabalho ocorre de forma integrada, envolvendo odontólogos, técnicos e auxiliares em odontologia, nutricionistas e assistentes sociais, visando à melhoria da qualidade de vida a partir da educação em higiene bucal e do incentivo a hábitos e dieta alimentar saudáveis”, detalha. O programa Sorrindo para o Futuro é realizado em conjunto com as prefeituras do Rio Grande do Sul desde 2003, responsável por acompanhar cerca de 200 mil alunos da Educação Infantil ao 5º ano do Ensino Fundamental, em mais de 400 cidades do estado. São desenvolvidas ações e conteúdos referentes à importância da saúde bucal, estímulo à escolha por alimentos saudáveis e prática de atividade física. Os alunos recebem um kit para realização de escovação bucal (composto de nécessaire, escova dental, creme dental fluoretado e fio dental) e uma cartilha com conteúdo voltado a esses temas, trabalhados em sala de aula de forma lúdica, com linguagem pedagógica apropriada a cada uma das séries escolares contempladas pelo programa, acrescidas de palestras, teatros de fantoches e outras práticas educativas. Com frequência, estimular os filhos a escovar os dentes se torna uma grande missão para pais e mães. Era o caso do Dérick, de 11 anos, filho da Lucilene Siqueira Morrudo. Segundo a mãe, sempre era preciso insistir, mas após participar do programa Sorrindo para o Futuro na escola, em Bento Gonçalves (RS), a iniciativa passou a ser espontânea. “Não tínhamos o hábito de comprar fio dental e quando ele ganhou o kit, ficou bem feliz, disse que não teria mais desculpa e todos deveriam usar o fio dental em casa”, conta. De acordo com o coordenador estadual do Programa, Leandro Sapiro, o projeto eleva as chances de sedimentar e perpetuar os conhecimentos durante a infância e adolescência, contribuindo para a formação de adultos mais saudáveis e, por consequência, menos dependentes das diversas esferas dos serviços públicos de saúde. Ele destaca que em um cenário de escassez de recursos, associado à crescente longevidade, ganha força a necessidade de a sociedade se conscientizar em relação à responsabilidade social. “Vivermos de forma displicente, descomprometidos em relação à nossa saúde, e simplesmente apresentarmos a conta a um terceiro ao adoecermos, por conta de algo que poderia ser sido facilmente prevenido, não é o ideal. Trata-se de uma atitude cada vez menos compatível com a escassez de leitos hospitalares e a medicina de alta complexidade, que agrega custos exponenciais. É imprescindível valorizarmos ações voltadas à educação e prevenção em saúde - como o Sorrindo Para o Futuro - que contribuem para a redução das doenças ditas comportamentais, agregando sustentabilidade econômica e social”, conclui.