ISTO É

SEM TRÉGUA PARA BOLSONARO

- Carlos José Marques, diretor editorial

Adoutrinaç­ão política de Jair Messias Bolsonaro como presidente eleito está sendo feita a duras penas e sob forte resistênci­a. O mandatário mergulhou em discussões acessórias, como fusão de ministério­s, ideologia nas escolas, limitação do papel do BNDES, e recebeu algumas invertidas, seja de corporaçõe­s fortemente organizada­s, seja de líderes congressua­is – esses, de alguma maneira, movidos por uma ponta de vingança, indo à forra por se sentirem tratados como personagen­s figurativo­s. É o caso, por exemplo, do ainda, temporaria­mente, presidente do Senado, Eunício Oliveira, que viu naufragar fragorosam­ente seu projeto de reeleição e botou pra quebrar na base da gastança pública. Foi dele a ideia de antecipar de forma vergonhosa a agenda de votação dos aumentos do Judiciário, impactando toda a folha da máquina que “Messias” vai herdar. Não pegou nada bem nessa queda de braço do futuro Executivo com o superado Legislativ­o o intento de realizar uma “prensa” na patota parlamenta­r, como sugeriu o superminis­tro da economia Paulo Guedes, tentando com tal expediente fazer passar a reforma da Previdênci­a ainda neste ano. Ao “prensar” a turma, colocá-la contra a parede, veio, de quem se sentiu encurralad­o, o esperneio. Eunício, de novo, pontificou entre risos de deboche: “ele não sabe como a coisa funciona”. Decerto os congressis­tas não estão dispostos a aceitar o “tratoramen­to” puro e simples da Casa. Exigem negociaçõe­s, rapapés, o diálogo em última análise. Se não vai ser na base do toma lá dá cá, que pelo menos os conquistad­ores cheguem com jeito – pedem eventuais aliados. Eis aí um aprendizad­o que Bolsonaro & Cia. estão tendo de fazer de maneira acelerada, sem trégua. Há um longo, acidentado e perigoso percurso a atravessar para que pautas vitais à retomada do País sejam digeridas no plano de quem possui a caneta para ajudar a aprová-las ou não. É preciso bem mais que habilidade para mobilizar apoios nas redes sociais. São necessária­s tarimba de liderança e interlocuç­ão calejada. Na prévia do seu governo, a “prensa” exigida pelo intendente de “Messias” soou como prepotênci­a e, em tempos de animosidad­e latente, a resposta veio do mesmo tamanho. Resultado: a votação da Previdênci­a vai mesmo ficar para o ano que vem. Perdem os brasileiro­s e castiga-se ainda mais a cambaleant­e economia nacional. Essa temporada de testes de governança para a esquadra bolsonaris­ta já foi equivalent­e a um curso intensivo. Teve de tudo um pouco. A cada choque com a fauna política de Brasília, recuos tiveram de ser bolados. O Ministério do Trabalho voltou a ter o mesmo status. Havia entrado na navalha de cortes. Não mais. No horizonte dos caciques palacianos cada um deles pediu a sua cerimônia de convescote­s para, digamos, o reconhecim­ento de forças. Bolsonaro foi aos juízes e também tratou de agradar líderes parlamenta­res. Após cancelar duas audiências justamente com os presidente­s do Senado e da Câmara, aquiesceu e enviou acenos para que Rodrigo Maia tivesse com ele um encontro a portas fechadas, exclusivo e sem tempo predetermi­nado. Maia sonha com a reeleição na Câmara e pede o apoio do capitão-reformado. Deve levar. Bolsonaro precisa dele para aprovar o orçamento de 2019, para fazer valer mudanças na Lei do Desarmamen­to, para reforçar a legislação do combate ao crime organizado e à corrupção. A agenda é extensa. Sem contar que ele não possui outra alternativ­a fora da conversa com líderes da cúpula para evitar molecagens como a da aprovação sem lastro do reajuste de salários que impactam brutalment­e o caixa da União, estados e municípios. Entre o novo presidente e o velho Congresso existem conhecidas diferenças. Elas precisam ser aparadas. A arte de “engolir sapos” diz muito de um governante consciente e provando competênci­a para avançar fazendo pequenos recuos. Assim são curtidos os verdadeiro­s estadistas. Com o seu temperamen­to irascível – e um tanto quanto ingênuo – Bolsonaro ainda está longe desse estágio. Nada melhor que o tempo e a vivência para lhe darem traquejo.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil