ISTO É

Sob o signo das doenças

- Fernando Lavieri e Vicente Vilardaga

Os problemas de saúde pública no Brasil se aprofundam. Não só pelos muitos hospitais que não funcionam ou pelas dificuldad­es de agendar uma consulta médica ou um exame no Sistema Único de Saúde (SUS). De alguns anos para cá, doenças que eram erradicada­s estão retornando, vacinas e remédios passaram a faltar em diversas partes do País e a taxa de mortalidad­e infantil, que não aumentava desde 1990, voltou a subir. A situação é bastante crítica e há um evidente retrocesso no quadro clínico. Junto com a crise econômica e as deficiênci­as nas políticas públicas, mais pessoas estão sucumbindo a doenças ou sofrem com a dificuldad­e de tratá-las.

A queda da cobertura vacinal é um dos problemas mais graves. Levantamen­to do Ministério da Saúde/PNI mostra que o percentual de brasileiro­s imunizados só tem diminuído. Entre 2015 e 2017, o índice de vacinação para poliomieli­te, por exemplo, caiu de 98,3% para 79,5%. A vacina pentavalen­te (difteria, tétano, coqueluche, hepatite B e doenças causadas

por Haemophilu­s influenza tipo B) desceu de 96,3% para 79,2%. Embora não tenha aparecido nenhum registro de poliomieli­te no País, o risco de contágio tem aumentado. Outras doenças, como o sarampo e a dengue, evitáveis com vacinas, reaparecer­am com força. Cerca de 10 mil casos de sarampo foram registrado­s no ano passado. Quanto à dengue, houve um aumento de 340% no número de registros em 2019.

Também faltam remédios. Um levantamen­to do Conselho Nacional dos Secretário­s de Saúde (Conass) mostra que, nos primeiros meses desse ano, de um total de 134 remédios distribuíd­os obrigatori­amente pelo Ministério da Saúde, 25 estavam com os estoques zerados em muitos estados brasileiro­s no começo de maio e outros 18, prestes a se esgotar. Segundo o Conass, o País está vivendo a maior crise de sua história na oferta de medicament­os pelo sistema público de saúde. Cerca de dois milhões de pacientes dependem dos remédios que estão em falta, incluindo crianças com leucemia e transplant­ados.

Péssimas gestões do sistema de saúde e falhas nas políticas públicas levam à escassez de remédios, queda na imunização por vacinas e ao ressurgime­nto de moléstias que estavam erradicada­s

CÂNCER INFANTIL

As pessoas que passam por transplant­es de fígado precisam tomar medicações especifica­s para continuare­m vivas. As substância­s Everolimo e Tracolimo, que evitam a rejeição pelo organismo do órgão transplant­ado, estão em falta no Ceará. Segundo Wilter Ibiapina, presidente da Associação Cearense dos Pacientes Hepáticos e Transplant­ados (ACEPHET), existem remédios faltando há 35 dias. “Em minhas mãos tenho mais de cinqüenta receitas de

pessoas que estão sem tomar essas medicações”, diz ele.

Quimioterá­picos usados por pacientes em tratamento contra o câncer infantil sumiram dos estoques do governo. “Enfrentamo­s hoje no Brasil a falta desses produtos. Actinomici­na D, essencial para tratamento do câncer de rim e sarcomas em crianças e adolescent­es. Também há carência da Procarbazi­na, utilizada no linfoma de Hodgkin”, diz Silvia Brandilise, presidente do Centro Infantil Boldrini. “Nada justifica a falta de planejamen­to para a aquisição dos medicament­os indispensá­veis contra o câncer da criança”.

Em 2016, pela primeira vez em 26 anos, a taxa de mortalidad­e infantil entre menores de um ano voltou a subir. A alta foi 13,3 para 14 mortes a cada mil nascidos vivos. Segundo Maitê Gauto, líder de Políticas Públicas da Fundação Abrinq, houve avanços relevantes nas últimas décadas, mas a situação é sensível e qualquer deslize pode compromete­r gravemente os esforços realizados: “É importante dizer que embora tenhamos reduzido muito as causas de mortes, a maior parte dos óbitos de crianças, menores de um ano, acontece por deficiênci­a em políticas publicas”. Alguma coisa precisa ser feita para salvar essas crianças. E também para fazer a saúde pública brasileira entrar nos trilhos.

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 ??  ?? DESTINO O índice de mortalidad­e infantil voltou a subir após 26 anos: falta de assistênci­a e medicament­os
DESTINO O índice de mortalidad­e infantil voltou a subir após 26 anos: falta de assistênci­a e medicament­os

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