ISTO É

Capanema , o homem que era um ministério

Biografia revela como o político mineiro se tornou ministro da Educação a contragost­o, mas, ainda assim, conseguiu modernizar o ensino e a cultura na Era Vargas

- Luís Antônio Giron

Toda vez que a educação corre perigo, manifestan­tes marcham em frente à sede do Ministério da Educação no Rio de Janeiro. Mal sabem que o prédio, de 1943, é um marco da arquitetur­a modernista e da renovação da cultura e do ensino. Projetado por Le Corbusier e Oscar Niemeyer, é conhecido como Palácio Capanema, nome de seu idealizado­r: Gustavo Capanema (1900-1985).

“O edifício resume a visão de um político que nunca pensou em apear do governo”, diz o historiado­r e jornalista Fábio Silvestre Cardoso, autor da biografia “Capanema: a história do ministro da Educação que atraiu intelectua­is, tentou controlar o poder e sobreviveu à Era Vargas” (editora Record). “Para não deixar o poder, evitou concorrer a cargos eletivos.”

“Capanema foi o típico conservado­r mineiro”, diz Cardoso. “Era discreto e se aliava a amigos importante­s.” Mesmo desprovido de carisma e jamais sorrir, manteve-se em cargos públicos por 50 anos, de 1929 a 1979. De intervento­r de Minas Gerais a senador biônico da ditadura, passou por seu momento glorioso, entre 1934 e 1945, o de sua gestão no Ministério da Educação e Saúde (MES), o mais longevo da história. Getúlio Vargas convidou-o para o ministério como consolação, pois sonhava em seguir como intervento­r.

Tão logo assumiu a sinecura, converteu-a em palanque. Iniciou uma gestão moderna, embora ditatorial. Fundou órgãos, como o Instituto Nacional do Livro e o Instituto

do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Convidou o poeta Carlos Drummond de Andrade, para atrair intelectua­is e artistas, entre eles o escritor Mário de Andrade e o músico Villa-Lobos. O círculo de celebridad­es deu brilho ao “Ministério Capanema”. À sombra do glamour, chefiou a nacionaliz­ação do ensino em 1942, após o Brasil entrar na guerra contra o Eixo. Foi então que chamou o exército para forçar as colônias italianas e alemãs dos estados do Sul a abandonar seus idiomas de origem. Mandou demolir escolas rurais e prender quem não falasse o português.

DE JANGO AO CAOS

Getulista, defendeu o presidente na crise que o levaria ao suicídio em 1954, como deputado pelo Partido Social Democrátic­o (PSD). Apoiou o correligio­nário JK à presidênci­a, e se assustou quando João Goulart assumiu o cargo em 1961. Foi então que proferiu a imprecação: “Entre Jango e o caos, prefiro o caos.”

Organizou o caos: apoiou o golpe e se filiou à Aliança Renovadora Nacional (Arena), onde se manteve até morrer.

“No início, queria traçar o perfil de um homem discreto”, afirma Cardoso. “Descobri que ele era muito vaidoso.” Cobiçava a imortalida­de com dois livros, um de discurso e outro de aforismos. Mas perdeu a eleição à ABL em 1980. Apesar de ter criado um instituto de preservaçã­o da memória, Capanema é um vulto esquecido. Eis um de seus ditos célebres: “Política é a arte de conquistar e conservar o poder”. Cumpriu a divisa até o final.

 ??  ?? AUSTERO Gustavo Capanema em Paris (c. 1950): reunião de artistas e intelectua­is para criar o Ministério da Educação, hoje conhecido como “Ministério Capanema”
AUSTERO Gustavo Capanema em Paris (c. 1950): reunião de artistas e intelectua­is para criar o Ministério da Educação, hoje conhecido como “Ministério Capanema”
 ??  ?? NEGOCIADOR Capanema entre o general Artur da Costa e Silva e o presidente Getúlio Vargas (c. 1952): sempre em cargos públicos, faz a ponte entre duas ditaduras
NEGOCIADOR Capanema entre o general Artur da Costa e Silva e o presidente Getúlio Vargas (c. 1952): sempre em cargos públicos, faz a ponte entre duas ditaduras

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