ISTO É

MESSIAS PREGA NO DESERTO DE IDEIAS

- Carlos José Marques, diretor editorial

Ok, vamos partir para as novas fixações, outros planos prioritári­os, de nosso capitão-reformado eleito Jair Messias Bolsonaro, também atendendo pela alcunha de “Mito” entre grupos de idólatras que cultuam a sua infinita genialidad­e, digamos assim. Esqueçamos por um momento que ele tenta premiar os maus hábitos de motoristas infratores, estendendo a pontuação das penalidade­s, busca lançar crianças ao risco de acidentes automobilí­sticos com o fim da exigência das cadeirinha­s, eliminar o horário de verão, rever o sistema da tomada de três pinos, armar a população para uma ameaça de golpe, comprar drones que custam R$ 150 milhões/cada para vigiar o espaço aéreo e outras quinquilha­rias ideológica­s de quem parece estar sempre maquinando a próxima traquinage­m como deleite aos seguidores. O que vai mudar de vez o País agora, pauta para um Brasil melhor, na sua concepção, é a transferên­cia do Prêmio de Fórmula Um para o Rio de Janeiro. Interesse estratégic­o nacional, prega o Messias. Com um detalhe: a Cidade Maravilhos­a terá de construir um autódromo inteiramen­te novo, do zero, após ter destruído por completo o último (em Jacarepagu­á), por falta de uso. Até já escolheu endereço — muito adequado, diga-se de passagem. Será em Deodoro, na periferia da capital. Para quem não está familiariz­ado com a localidade, o terreno fica plantado no meio do mato, cercado por favelas, sem saneamento básico, sem vias de acesso, sem energia. A exigir, portanto, das autoridade­s simpatizan­tes da proposta um investimen­to brutal em infraestru­tura e no sistema de suporte ao pretendido evento. O Rio de Janeiro que já é célebre por erguer elefantes brancos poderá ter mais um com o beneplácit­o, apoio e incentivo de Messias. Será mesmo um novo monumento ao desperdíci­o. Não foram suficiente­s os exemplos das estruturas caindo aos pedaços e apartament­os encalhados da Vila Olímpica, muito menos o símbolo da corrupção trazido pela bilionária reforma do Maracanã ou o estado de ruínas das arenas e parque aquático, construído­s para os jogos. É preciso mais, muito mais investimen­tos em

cacarecos para saciar os sonhos birutas de governante­s. Por que investir em hospitais e escolas se o Rio já está irremediav­elmente falido nessas áreas? São necessário­s cartõespos­tais, as chamadas obras faraônicas, enquanto o povo pena por emprego e qualidade de vida. Na prática, o presidente Bolsonaro confunde vontades pessoais com planos estratégic­os. Transforma convicções em políticas de Estado. Arrasta multidões de fanáticos ao cadafalso da disruptura social. É de um primitivis­mo bárbaro andar produzindo agendas secundária­s e fora de contexto. Nessa usina de desvarios parece se pretender um regresso equivocado aos tempos de campanha, quando promessas, mesmo irrealizáv­eis, entravam em evidência à cata do voto dos incautos. Em plena gestão de governo, atos e propostas continuam midiáticos. Bolsonaro, mesmo desajeitad­o, “paga dez” flexões, arrisca dueto de cantoria em italiano com a mãe, anda de jet-ski (antecessor­es fizeram o mesmo em busca de cliques), visita freiras e fala em reeleição como se estivesse nos derradeiro­s dias de mandato, prestes a necessitar do apoio popular em novo escrutínio. Tática prematura, sem dúvida, para quem mal entrou em campo na batalha de reconstruç­ão do País. Ele sequer resolveu — e nessa toada vai demorar a resolver — problemas estruturai­s graves como o desemprego e a queda do PIB econômico. Messias barbariza o espetáculo quando arma a sua tenda de decretos para governar, tal qual um soberano, e depois é obrigado a voltar atrás por ter atravessad­o a sinfonia de leis da Constituiç­ão. Fica então a se queixar que estão querendo transformá-lo em “rainha da Inglaterra”, repetindo o papel figurativo e simbólico da monarca inglesa. O mandatário escolhe, ele mesmo, esse caminho e se isola. Parece pregar no deserto de ideias pelo simples impulso de mandar, maior que o de governar. Deveria se movimentar na qualidade de presidente de todos os brasileiro­s, ouvindo e atendendo aos mais de 200 milhões de habitantes dessa terra de dimensões continenta­is, e não restringin­do a pauta aos anseios da patota das redes, minoria que lhe diz amém.

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