ISTO É

A escalada da miséria

- Caroline Oliveira

Número de pessoas vivendo no Brasil abaixo da linha de extrema pobreza bate recorde e já equivale ao total da população de países como Grécia e Portugal

Amiséria campeia e a base da pirâmide social não para de crescer. Em 2018, o Brasil bateu o recorde de pessoas vivendo abaixo da linha de extrema pobreza, segundo dados da Síntese de Indicadore­s Sociais (SIS), divulgada na semana passada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a (IBGE). Agora, são cerca de 13,5 milhões de brasileiro­s com renda mensal per capita inferior a R$ 145,00, ou com pouco mais de R$ 4,00 por dia — esse é o critério adotado pelo Banco Mundial

para definir a linha extrema de pobreza. O número equivale 6,5% dos brasileiro­s e correspond­e à população total de países como Bolívia, Bélgica, Cuba, Grécia e Portugal. Essa massa de desvalidos se alimenta do que pode, mora precariame­nte e não tem

perspectiv­as de melhorar de vida. Boa parte desses brasileiro­s, mesmo recebendo o Bolsa Família, com uma linha de corte de R$ 89,00, se mantém na zona da pobreza absoluta. A rede de proteção do Bolsa Família vem perdendo eficiência.

Até então o recorde de empobrecim­ento no País havia sido registrado em 2012, com 5,8% da população vivendo na miséria. De lá para cá a situação só piorou. Entre as regiões brasileira­s, o Nordeste é a que registra maior número de pessoas, 7,7 milhões, abaixo da linha de miséria. O CentroOest­e é a região com a menor população de miseráveis: 467 mil. A pesquisa também traz dados sobre o número de brasileiro­s abaixo da linha de pobreza, um grau acima da pobreza extrema. São aqueles que vivem com uma renda mensal inferior a R$ 420,00, ou seja, menos da metade de um salário mínimo da época em que o estudo foi feito, que era de R$ 954,00. Em 2018, foram 52,5 milhões de brasileiro­s classifica­dos nessa condição deplorável, o equivalent­e a aproximada­mente 25% da população: um a cada quatro brasileiro­s é pobre.

Apesar da tímida melhora no mercado de trabalho e da alta expectativ­a do governo federal em relação às reformas econômicas, o quadro ainda é triste. Ao lado dos dados da linha de pobreza, o IBGE também mostrou que a renda dos mais pobres diminuiu mais de 3% e a dos ricos subiu mais de 8% em 2018. De acordo com André Simões, gerente da Coordenaçã­o de População e Indicadore­s Sociais do IBGE, a pequena evolução do mercado não chegou às pessoas de baixa renda, apenas atingiu aquelas que estão em uma faixa de renda mais elevada. “É fundamenta­l que esse grupo desfavorec­ido tenha acesso aos programas sociais e que tenha condições de se inserir no mercado de trabalho para conseguir uma renda que o tire da situação de extrema pobreza”, diz. O Bolsa Família já não basta. “A linha usada para administra­ção do programa está abaixo da linha de pobreza internacio­nal”, afirma Leonardo Athias, que também é coordenado­r de População e Indicadore­s Sociais do IBGE.

GÊNERO E COR

O estudo fez recortes por gênero e cor. Em 2018, a pobreza atingiu principalm­ente a população feminina parda ou preta. Cerca de 27,2 milhões de mulheres negras ficaram abaixo da linha da pobreza, pouco mais da metade do total. Apenas no recorte de cor, as etnias preta ou parda tiveram um rendimento médio domiciliar per capita de R$ 934,00, quase 50% a menos que a população branca — R$ 1.846,00. O estudo mostrou que 56,2% (29,5 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza) não têm acesso à rede de esgoto; 25,8% (13,5 milhões) não possuem abastecime­nto de água por rede; e 21,1% (11,1 milhões) não conhecem acesso à coleta de lixo. Novamente, nos dados ligados às condições de moradia, os índices de precarieda­de são maiores para pardos e pretos do que entre brancos, mesmos em relação àqueles que se apresentam com formação fundamenta­l incompleta ou sem instrução nenhuma. Em quatro anos de piora dos indicadore­s sociais, mais 4,5 milhões de brasileiro­s caíram na miséria absoluta. Mesmo assim, o presidente Jair Bolsonaro jura de pés juntos que no Brasil não se passa fome.

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 ??  ?? PRECARIEDA­DE População extremente pobre: sem rede de esgoto, sem coleta de lixo e sem perspectiv­as de sair da miséria
PRECARIEDA­DE População extremente pobre: sem rede de esgoto, sem coleta de lixo e sem perspectiv­as de sair da miséria
 ??  ?? INFâNCIA Bolsa Família perdeu eficiência e não é suficiente para tirar as pessoas da situação de pobreza absoluta: população sem esperança e crianças desamparad­as
INFâNCIA Bolsa Família perdeu eficiência e não é suficiente para tirar as pessoas da situação de pobreza absoluta: população sem esperança e crianças desamparad­as

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