ISTO É

INTERNACIO­NAL

A Alemanha se reunificou quando a população derrubou, em 1989, o Muro de Berlim, construído pelo regime comunista. Mas até quando a união ainda vair durar?

- Antonio Carlos Prado

Há três décadas os alemães reunificar­am o país derrubando o Muro de Berlim. Até quando essa união deve durar?

Os países democrátic­os e que prezam a liberdade, o direito à livre iniciativa e as garantias individuai­s da cidadania, incluída entre tais nações, sobretudo, a Alemanha, comemoram as três décadas da derrubada do Muro de Berlim, nesse sábado 9. Foi ele, o muro, em seus vinte e oito anos de existência, o mais vergonhoso, desumano e autoritári­o símbolo do regime comunista a separar um povo. A sua construção, em agosto de 1961, dera a prova definitiva de que, vencido em 1945 o plano expansioni­sta da ditadura do nazismo e fascismo na Segunda Guerra Mundial, uma parte da Alemanha e demais países do Leste Europeu viveriam o inferno do comunismo espalhado pela ex-União das Repúblicas Socialista­s Soviéticas (URSS), tiranizada por Joseph Stalin. Terminada a guerra, teve início outro conflito, opondo nos campos da ideologia e geopolític­a um bloco de países capitalist­as, liderado pelos EUA, a outro bloco integrado por países socialista­s, sufocados e obrigatori­amente obedientes à URSS. Foi a chamada “Guerra Fria”. No caso do território alemão, especifica­mente, a parte Oeste alinhou-se à democracia e ao governo americano, passando a se chamar República Federal da Alemanha; a porção Leste, demagogica­mente denominada República Democrátic­a Alemã, ficou sob o jugo comunista do regime soviético.

CÃES FAMINTOS

Uma frase não bem colocada em uma entrevista coletiva, transmitid­a ao vivo pela rede estatal de televisão da Alemanha comunista, acabou sendo decisiva para que o povo corresse ao muro carregando explosivos, marretas, picaretas e o incansável desejo de liberdade. Günter Schabowski, membro do governo da região Leste que vinha sendo pressionad­a externamen­te a se oxigenar do ponto de vista político, declarou que estavam abolidas as restrições de viagens para o outro lado do país. O povo entendeu da

mais saudável maneira que quis entender: o Muro de Berlim não mais existira, portanto se tratava de colocá-lo no chão.

E assim foi feito. Como se sabe, a vontade de ser livre tem fortes garras, ou seja, quem correu até o apelidado “Muro da Vergonha” e “Cortina de Ferro” sem portar nenhuma ferramenta tentava arrancar tijolos com as mãos, ainda que as ferisse. Para se ter uma ideia da opressão que o Muro de Berlim significav­a, vamos a alguns aspectos concretos: ele possuía trezentas e duas torres de observação, cento e vinte e sete redes metálicas eletrifica­das com arame, duzentas e cinquenta e cinco pistas de corrida para cães de guarda (mantidos intenciona­lmente sempre famintos) e cerca de sessenta quilômetro­s de gradeament­o. A quem tentasse ultrapassá-lo em fuga para o lado Oeste, valia para os militares vigilantes aplicar aquilo que o governo chamava de “ordem cento e um”. Ou seja: atirar para matar.

Trinta anos se passaram, a Alemanha unificada mudou, a Europa mudou, o mundo mudou. Naquela época, uma ferrenha ativista contra o comunismo e a existência do muro começava a ganhar notoriedad­e na cidade de Leipzig. Seu nome: Angela Merkel, atualmente primeira-ministra do país, cargo que ocupa desde 2005, e ex-lider da União Democrata Cristã, função que exerceu entre 1998 e o ano 2000. Por ironia da história e da política, ela, que tanto batalhou contra o autoritari­smo da esquerda e do comunismo, é responsabi­lizada agora pelo fato de a Alemanha enveredar politicame­nte à direita.

DESEMPREGO E IMIGRANTES

Igualmente irônico, na perspectiv­a sociológic­a, é que esse radicalism­o da direita ganhe corpo justamente no Leste alemão, que tanto sofreu com a “Cortina de Ferro”. O partido Alternativ­a para a Alemanha (AfD) já é o terceiro mais forte do País com noventa e quatro cadeiras no Bundestag (Parlamento). A razão de tal cresciment­o é a insatisfaç­ão com a questão do desemprego e a profunda discrepânc­ia de renda em comparação à populaçãod­a região Oeste do país. Há, no entanto, um motivo que pesa decisivame­nte — a linha política coerente e democrátic­a de Angela Merkel sobre um ponto que hoje é crucial à União Européia: acertadame­nte, ela tem acolhido imigrantes e refugiados.

Angela Merkel lutou contra a divisão do país. Hoje é responsabi­lizada pelo cresciment­o da extrema direita devido ao acolhecime­nto de refugiados

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 ??  ?? 2019 Obra de arte marca um dos trechos da fronteira que era ocupado por parte do Muro de Berlim: liberdade e união
2019 Obra de arte marca um dos trechos da fronteira que era ocupado por parte do Muro de Berlim: liberdade e união
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 ??  ?? 1989 A população do Leste derrubou a “Cortina de Ferro” imposta pelo regime comunista: festa e sentimento de pertencer a uma nação
1989 A população do Leste derrubou a “Cortina de Ferro” imposta pelo regime comunista: festa e sentimento de pertencer a uma nação

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