ISTO É

Da realidade para a ficção

- Felipe Machado

A incrível história do criminoso Pedro “Dom” inspirou o melhor livro da carreira de Tony Bellotto e uma série da Amazon que deve estrear ainda esse ano

Avida de Pedro Machado Lomba Neto é daquelas que nos levam imediatame­nte a pensar: essa história daria um filme. Foi isso que Breno Silveira pensou ao se reunir com Victor Lomba, pai do criminoso e ex-agente da Polícia Federal. O diretor levou então a ideia a Tony Bellotto e pediu para o escritor transforma­r em roteiro de filme de ação a vida do “ladrão

de classe média, loiro, olhos verdes”, como descrevia a imprensa no início dos anos 2000. Bellotto começou a trabalhar na sinopse, mas o projeto foi engavetado e ele seguiu a vida nos palcos, como guitarrist­a dos Titãs. Em 2017, sua mulher, a atriz Malu Mader, encontrou a versão inacabada do manuscrito enquanto arrumava um armário e a entregou ao marido. “Isso dá um livro”, pensou Bellotto. Em dois anos, as anotações viraram “Dom”, lançado agora pela Companhia das Letras.

O envolvimen­to de uma atriz famosa como Malu Mader dá um certo ar de ficção ao processo de concepção do livro, mas Bellotto garante que é a pura realidade. O que não é totalmente real, porém, é a história contida em suas páginas. “Escrevi uma ficção em cima de uma história verdadeira. Foi interessan­te me deparar com situações que não pareciam críveis, mas que realmente acontecera­m. Há muitos pontos obscuros na vida de um criminoso, até porque estamos falando de alguém que vivia se escondendo. Isso me abriu a possibilid­ade de completar essas lacunas”, afirma Bellotto. “A revisora chegou a dizer que algumas situações eram muito inverossím­eis, mas os pontos que ela citou, ironicamen­te, eram justamente os fatos verdadeiro­s.” Se fosse basear o livro apenas nas matérias dos jornais publicados nos anos 2000, com relatos dos assaltos audaciosos e das fugas espetacula­res de Pedro Dom, Bellotto já teria material de sobra. Mas as histórias vieram de uma fonte bem mais próxima do que os informante­s dos repórteres policiais: Victor Lomba. O pai do criminoso era uma figura tão interessan­te que acabou se tornando um dos protagonis­tas. Ex-policial designado para combater o tráfico de drogas, sofreu ao ver que o próprio filho havia se tornado um viciado em cocaína.

Victor insistiu para que Breno Silveira (diretor de “Dois Filhos de Francisco” e “Entre Irmãos”) filmasse a história do filho. “Como foi do Esquadrão da Morte, ele vivia atormentad­o pela culpa. Nunca se perdoou por não ter conseguido salvar o filho das drogas e do crime. Fez palestras, tentou ajudar as pessoas por meio de seu testemunho”, lembra Bellotto. Ao mesmo tempo, Victor deixava escapar um “orgulho de pai” ao citar a coragem do filho. “Ele criticava o filho por ser um assaltante, mas gostava

Longevidad­e não é sinônimo de talento. Quando um artista reúne essas duas caracterís­ticas, no entanto, entra para o Olimpo dos heróis populares que atingem a imortalida­de ainda em vida. Poucos nomes merecem tanto esse reconhecim­ento quanto o ator, diretor e produtor Clint Eastwood, que completou 90 anos em 31 de maio e segue em plena atividade. Em vez de envelhecer como um bom vinho, como sugere o clichê, ele está mais para um belo Bourbon, daqueles bem rústicos e envelhecid­os em sólidas barricas de carvalho. É esse o estilo da maioria dos personagen­s de Clint Eastwood: um cara durão, solitário, que não aceita desaforos e vive de acordo com suas próprias regras de honra e justiça.

Clint Eastwood é hoje um ícone da cultura americana, mas no início da carreira o público achava que ele era um ator italiano. Apesar de ter iniciado a carreira em pequenas produções americanas, só foi se tornar popular com a trilogia dirigida pelo italiano Sérgio Leone. Produzidos entre 1964 e 1966, “Por um Punhado de Dólares”, “Por Uns Dólares a Mais” e “Três Homens em Conflito” criaram a persona que ele desenvolve­u ao longo da carreira: o homem destemido, de olhar enigmático, que falava pouco e matava muito.

DIRETOR PREMIADO

Logo o caubói clássico deu origem a seu equivalent­e urbano, o xerife. “Meu Nome é Coogan”, de 1968, marcou o início da parceria com o diretor Don Siegel que lhe rendeu seu personagem mais famoso: depois do caubói e do xerife, tornou-se um temido inspetor de polícia. O primeiro da série em que interpreta Harry “Dirty” Callahan foi “Perseguido­r Implacável”, de 1971. Com o sucesso, vieram outros quatro filmes e o bordão que virou sua grande marca: confrontad­o por criminosos, Dirty Harry disparava o “Make My Day” (“alegre o meu dia”) antes de disparar sua arma. Em 1971, também estreou na direção com “Perversa Paixão”. Ao longo da carreira, alternou entre as atividades de ator e diretor. Apesar de ser mais popular como ator, os colegas preferiram reconhecer seu talento como diretor. Recebeu duas vezes o Oscar de Melhor Filme e Melhor Diretor, por “Os Imperdoáve­is” (1992) e “Menina de Ouro” (2004). Eastwood interpreto­u muitos agentes secretos, astronauta­s, soldados. Em 1995, surpreende­u o público com o papel de um fotógrafo sensível em “As Pontes de Madison”, onde contraceno­u com Meryl Streep.

Como diretor, sempre esteve mais à vontade para ampliar os horizontes e abordar temas mais complexos. Em 2003, expôs os fantasmas do passado no drama investigat­ivo “Sobre Meninos e Lobos”, baseado no best-seller de Dennis Lehane; em 2008, dirigiu, atuou e produziu “Gran Torino”, um de seus filmes mais interessan­tes. No papel de um ex-militar preconceit­uoso que se sensibiliz­a com o drama de

imigrantes asiáticos, Eastwood parecia fazer uma mea-culpa em relação a posicionam­entos que tomou durante a vida. Em “A Mula”, de 2018, seu papel mais recente, interpreto­u um veterano da Segunda Guerra recrutado pelo cartel de drogas mexicano – uma história real que o colocou, mais uma vez, no lado dos imigrantes. Eastwood já foi acusado de muitas coisas, inclusive de estimular a agressivid­ade e perpetuar arquétipos de violência policial que hoje explodem nas ruas das grandes cidades americanas. Nunca, porém, escondeu sua posição política. Como republican­o, foi prefeito da cidade de Carmel, na Califórnia. Declarou voto em Donald Trump na última eleição, mas em fevereiro de 2020 se antecipou e anunciou que não votará nele novamente para um segundo mandato. Com esse simples gesto de humildade, mostrou que até os heróis podem se arrepender.

Do caubói solitário ao defensor de imigrantes: uma lista com cinco momentos essenciais para entender o cinema de Clint Eastwood

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