ISTO É

“ÉRAMOS JOVENS, LOUCOS E MARAVILHOS­OS”

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profundida­de do espírito humano. É tudo superficia­l, rapidinho.

E os programas de auditório, que importânci­a tiveram para a TV?

Antigament­e existia o animador de auditório, mas ele não servia só para jogar coisas para a platéia. Ele imaginava o público, pensava no que eles estavam esperando. Hoje tem muito filósofo posando de animador de auditório na TV. Alguns são cultos, inteligent­es, mas não sei se o público está muito disposto a ouvi-los.

Como você vê a evolução das telenovela­s?

O Walter George Durst criou toda a dramaturgi­a naquela época, e era praticamen­te igual a tudo que existe hoje. Tudo já foi feito, nós fizemos.

Qual foi a atuação mais marcante que você viu?

Não foi na TV, mas no circo. Eu trabalhava com minha mãe em Bebedouro, interior de São Paulo, em 1945. Eu estava na coxia, ela era atriz, estava encenando “Maria Cachucha”, do Joracy Camargo. De repente o público começou a cochichar e a se dispersar.

Mas o que aconteceu?

Ela me chamou: “menino, vai ver o que está acontecend­o”. Eu fui.

Tinha acabado a guerra. Eu voltei e contei a ela, no ouvido. Minha mãe se virou e começou a declamar: “Ouviram do Ipiranga às margens plácidas, de um povo heróico o brado retumbante...” O povo a ouviu, e começou a acompanhá-la.

Então pensei: “não foi a guerra que acabou, foi minha mãe que acabou com ela”. Foi lindo.

conversou com Campos para descobrir o que está por trás dessa produção da Netflix que já está sendo apontada como possível candidata ao Oscar de 2021.

“Diabo de Cada Dia” é um filme intenso e violento. O que te atraiu nesse projeto?

Quis contar uma história geracional sobre um trauma que passa de pai para filho. Me apaixonei pela atmosfera

e gótica da trama.

Você reuniu um elenco de estrelas. Como foi o processo de escolha dos atores?

Robert Pattinson foi o primeiro a ler o esboço do roteiro. Eu disse a ele: “pode escolher qualquer papel”. Ele quis fazer o padre perverso. Tom Holland já havia sido escalado para o papel do Homem-Aranha, mas o filme ainda não havia estreado. O timing foi bom e acho que o roteiro foi interessan­te o suficiente para atraí-los.

O filme é sobre fé, religião e pecado. O protagonis­ta, Arvin, seria um instrument­o divino para punir os personagen­s malignos?

Ele também é um pecador, mas há algo de bom nele, ao contrário dos outros. Ele acaba corrigindo o mal causado nas diversas situações, promovendo um equilíbrio na comunidade.

A complexa relação entre os personagen­s vai se revelando aos poucos. Foi difícil contar uma história com tantas reviravolt­as?

Sim, foi um grande desafio. Me senti como se estivesse resolvendo um verdadeiro quebra-cabeças e compartilh­ando essa experiênci­a com o público.

A violência que você mostra é diferente do que vemos no Brasil. Esse filme só poderia se passar nos EUA, onde grande parte da população anda armada?

Acho que esse é um filme americano sobre uma região específica, onde a fé e a violência estão conectadas. Mas acho que seria possível encontrar uma maneira de traduzir essa história para outros países e culturas.

Vivemos em um mundo polarizado e sensível, onde a opinião das redes sociais conta muito. Você teme as críticas de grupos religiosos?

Não. Quem assistir ao filme verá que ele mostra diversos lados da experiênci­a religiosa, mas é focado no comportame­nto dos fanáticos. Não tento negar ou provar a existência de Deus, eu estava mais interessad­o em mostrar o perigo do fanatismo. Quem tem uma relação saudável com a religião verá isso.

O autor da história, o escritor Donald Ray Pollock, é o narrador do filme. Por que você optou por convidá-lo?

Eu sabia que a única pessoa capaz de fazer justiça à voz do narrador seria Donald. Ele é de Ohio, ainda mora naquela região, então achei que sua familiarid­ade com os personagen­s acrescenta­ria autenticid­ade ao filme.

Qual foi sua orientação para a atuação de Tom Holland no papel de Arvin? Ele parece sempre no limite, alguém que vai explodir a qualquer momento.

Tom atua de forma contida, como uma panela no fogão com uma tampa em cima. Está confuso, cheio de emoção. Há muita tensão, frustração e raiva em sua vida, mas ele vem de um mundo onde os homens não costumam expressar suas emoções . E então o personagem explode e revela o que está sob a superfície.

Vocé costuma mostrar seus filmes em festivais. Qual é a diferença em lancar diretament­e no streaming?

É algo novo para mim. Já tive filmes exibidos na Netflix, dirigi séries como “The Sinner” e sei o alcance da plataforma. Mas nesse caso nem cheguei a pensar nisso, me preocupei apenas em contar uma boa história. Fomos prejudicad­os em relação aos festivais, eu teria participad­o se não fosse pela pandemia.

O filme tem algumas cenas de violência explícita. Você acha que isso pode assustar o grande público?

Acho que não, porque ela está ligada emocionalm­ente à construção da história. E o narrador já avisa logo no início do filme: essa será uma história chocante.

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Lima Duarte: sua carreira como ator se confunde com a história da TV brasileira
PIONEIRO Lima Duarte: sua carreira como ator se confunde com a história da TV brasileira
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HEROI E VILãO
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PASTOR PERVERSO

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