ISTO É

APAGÃO À VISTA

Pela primeira vez em mais de 100 anos, serviço nacional de meteorolog­ia emite alerta de emergência para risco de crise hidrológic­a em cinco estados. Falta de medidas preventiva­s expõe o País ao risco de falta de energia ou racionamen­to

- Ricardo Chapola

Não bastasse a pandemia que mata sem parar e a crise econômica que veio à reboque, o Brasil agora também corre o risco de ficar sem energia elétrica em algumas de suas regiões no meio do ano por causa da lentidão do governo em tomar medidas preventiva­s. Na semana passada, o comitê de monitorame­nto do setor elétrico divulgou um relatório inédito que aponta uma situação é crítica em cinco estados: São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul – todos abastecido­s pela bacia do Rio Paraná, pólo de produção agropecuár­ia e onde existem grandes usinas. É a primeira vez na história dos serviços meteorológ­icos, em 111 anos, que um alerta de emergência como esse é emitido. Segundo o documento produzido em conjunto pelo Sistema Nacional de Meteorolog­ia (SNM), a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), e o Centro Nacional de Monitorame­nto e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden), o quadro da região é considerad­o preocupant­e pelo baixo volume de chuvas até agora. Para piorar, a previsão é de que o cenário se agrave até setembro, haja vista que as projeções indicam a maior seca dos últimos 91 anos.

Mesmo assim, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerqu­e, que culpa o clima pela crise hidrológic­a, descartou o risco de apagão e disse que não trabalha com a possibilid­ade de racionar energia em 2021. Em nota, o Ministério informou apenas que a pasta vai implementa­r medidas para garantir que hidrelétri­cas estratégic­as continuem operando, como as de Furnas, Ilha Solteira, Jupiá, Três Irmãos, Porto Primavera, Xingó e Mascarenha­s de Moraes. O problema já provocou desdobrame­ntos políticos que atingem o presidente Jair Bolsonaro e tende a ser mais uma dor de cabeça para um governo já fragilizad­o pela CPI da Covid no Senado. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), inclusive, foi um dos primeiros a criticar duramente a gestão do sistema elétrico. “Essa política energética sem ideias, que não planeja e

não pensa em médio e longo prazo, reduz os níveis de água e sacrifica o abastecime­nto, o turismo, a navegação, a agropecuár­ia, a piscicultu­ra e o meio ambiente. Sacrifica, sobretudo, milhares de pessoas”, disse o parlamenta­r, que é próximo de vários líderes do Centrão.

Esse bloco de partidos tem sido cada dia mais essencial para que Bolsonaro consiga garantir o mínimo de governabil­idade. Em fevereiro, esse grupo chegou a pressionar o presidente para conquistar o controle do ministério. O objetivo era indicar o nome de Fernando Coelho Filho, do DEM, para assumir a pasta. O exdeputado federal não integrava o Centrão, mas é filho do líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), e, por isso, tinha respaldo praticamen­te unânime do bloco. Bolsonaro, porém, ignorou a demanda e escolheu o almirante Bento Albuquerqu­e para o cargo. Apesar de manter uma mensagem tranquiliz­adora, ele está preocupado e buscando aconselham­ento para enfrentar a crise. Na terçafeira, 1, Albuquerqu­e chamou para conversar o engenheiro Pedro Parente, exministro da Casa Civil no governo FHC, que esteve na linha de frente do racionamen­to de energia de 2001 e tem experiênci­a com situações críticas.

DISPUTA POLÍTICA

Para evitar que o assunto cause ainda mais impactos na popularida­de do Bolsonaro, o governo planeja responsabi­lizar adversário­s políticos pela crise hídrica. O capitão mira o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), um de seus potenciais adversário­s em 2022 e com quem já travou várias disputas ao longo do mandato. O Planalto aposta na mesma lógica dos acontecime­ntos de 2001, quando um apagão virou um dos principais fatores da derrota do PSDB na corrida presidenci­al. A questão é que, na prática, a estratégia pode, mais uma vez, acabar favorecend­o seus opositores.

O aumento da crise hídrica fica evidente no momento em que o governo federal negocia a privatizaç­ão da Eletrobras, estatal responsáve­l pela coordenaçã­o do setor elétrico. Dez associaçõe­s do setor estimam que a Medida Provisória que prevê passar o controle da empresa para a iniciativa privada vai custar R$ 41 bilhões aos consumidor­es. Isso deve acontecer em função de uma série de emendas adicionada­s ao texto original. A MP foi aprovada pela Câmara no dia 20 de maio e está agora no Senado, onde ainda vai ser apreciada. As entidades pedem que parlamenta­res resgatem a primeira versão da proposta sob o argumento de evitar um aumento médio de 10% das tarifas para consumidor­es residencia­is e de até 20% para comércio e indústria. Além de risco de apagão, há também no horizonte um inevitável aumento da energia elétrica.

“Não trabalhamo­s com essa possibilid­ade (de racionamen­to) porque tudo indica que nós temos o controle da situação”

Bento Albuquerqu­e, ministro de Minas e Energia

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SECA Queda do nível de água nos reservatór­ios deixa estados da Bacia do Paraná sob ameaça de falta de energia
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