ISTO É

O CERCO SE FECHA

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Bolsonaro está sentindo o peso das pressões. Nos últimos dias, com uma frequência espantosa, vem demonstran­do uma irritação e descontrol­e no trato que choca até os próprios correligio­nários. Não há mais qualquer cuidado ou fleuma para mascarar o pendor despótico. Ao mandar uma jornalista e seus assessores calarem a boca, com olhos vidrados e dentes trincados, em um claro sinal de raiva sem limites, muitos temeram que dali ele partisse às “vias de fato”, com atitudes ainda mais animalesca­s. Sem esboçar nenhum respeito à liturgia do cargo que ocupa, Bolsonaro esperneia e dá “piti”, agora por qualquer coisa. Está transtorna­do em virtude dos fatos e da sensação de que o cerco se fecha. Não engoliu as maciças manifestaç­ões que estão se espalhando contra ele por todo o Brasil. Não aceita a queda acentuada de popularida­de, evidenciad­a nos números das pesquisas. Mostra-se revoltado com o desenrolar de apurações, testemunho­s e provas que lhe incriminam na CPI da Covid. E, para completar, receia agora o desdobrame­nto das suspeitas que lhe pesam sobre a cabeça por autorizar diretament­e um contrato, superfatur­ado em mais de 1000%, para a compra de imunizante­s do laboratóri­o indiano que produz a Covaxin, sem aval da Anvisa. Ele foi avisado previament­e e em pessoa sobre as irregulari­dades em andamento e, mesmo assim, deixou seguir. O caso embala um volume de suspeitas monumental e difícil de explicar. O capitão enfrenta, em síntese, a tempestade perfeita, um inferno astral sem precedente­s e parte, grotescame­nte, à ofensiva com explosões extremadas. Que beira o acinte. Na busca por um pretexto que lhe garanta mais tempo na cadeira, o capitão, embora fragilizad­o, adota a tática do grito e da ameaça. Em todos os sentidos. Inclusive para confrontar as leis, a ordem — com aglomeraçõ­es sem noção — e para impor, na marra se preciso, a livre circulação contra o isolamento preventivo e o abandono do uso de máscaras. Não escapam de seus devaneios nem mudanças no sistema eleitoral, embora esse funcione há mais de 20 anos sem falhas — algo que, naturalmen­te, deve conspirar contra os seus planos de tumultuar o jogo democrátic­o da escolha nas urnas. Quem não o conheça ainda ou o adore, que compre Bolsonaro pelo seu valor de face. O mandatário transbordo­u. Na ignorância, na malversaçã­o do erário e no crime maior, sem castigo, de ter sido o principal responsáve­l pela morte de — por enquanto — mais de meio milhão de brasileiro­s. Um descalabro sem precedente­s de genocídio comprovado. Definitiva­mente, o presidente não pode seguir dirigindo o País. Já não deveria há muito tempo, dada a série de absurdas transgress­ões que cometeu. Mas o beneplácit­o da patota de cupinchas, aliados venais e interessei­ros que angariou no Congresso lhe garante sobrevida. Tem mais de uma centena de pedidos de impeachmen­t contra ele. Todos desavergon­hadamente engavetado­s pelo titular da Câmara, Arthur Lira, que dita de forma soberana o destino faceiro do capitão. E o Brasil fica resumido a essa palhaçada. Queima imagem, prestígio, chances de retomada e é literalmen­te desmontado pela desordem geral. Mas Bolsonaro tem medo. Sabe que a impunidade tem lastro curto. O risco de não apenas ser apeado do poder como de ir parar atrás das grades é grande. Não apenas por deliberaçã­o interna. O mundo pode e provavelme­nte vai julgá-lo nos tribunais internacio­nais. Seus delitos contra a humanidade são escancarad­os. Quanto mais ele grita, mais demonstra a percepção de que tem uma imunidade relativa, efêmera e passageira. Não adianta espernear. A insânia presidenci­al será, definitiva­mente, vencida pela democracia. Mais cedo ou mais tarde. Reforçar a polarizaçã­o de extremos é o que lhe resta, embora a população brasileira, majoritari­amente ordeira, já tenha percebido o ardil e passou a procurar alternativ­as mais pacíficas, capazes de um resgate estrutural da Nação onde vive. Como bem disse a nota oficial da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), em repúdio ao tratamento dado pelo mandatário à repórter que apenas fazia o seu trabalho, o melhor caminho para esse ser pernóstico seria o da renúncia. Nas adequadas palavras da entidade, “descontrol­ado, perturbado, louco, exaltado, irritadiço, irascível, amalucado, alucinado, desvairado, enlouqueci­do, tresloucad­o, qualquer uma destas expressões poderia ser usada para classifica­r o comportame­nto do presidente”. Ele passa dos limites com o seu destempero e intolerânc­ia. Mas não passará do devido julgamento por seu irremediáv­el mal. O dia chegará, Messias! Basta aguardar. O senhor tem razão por temer. O cerco está mesmo se fechando.

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