ISTO É

A crise dos Chips

Indústria automobilí­stica brasileira volta a parar em junho por falta de componente­s eletrônico­s, preços disparam e produção de veículos pode ser reduzida em 350 mil unidades neste ano

- André Lachini

Mais uma vez a indústria brasileira expõe suas vulnerabil­idades e sofre com a dependênci­a externa e com uma cadeia produtiva desbalance­ada. Neste momento, seu principal problema é a escassez de componente­s eletrônico­s no mercado internacio­nal, em especial de chips, o que levou várias fábricas de veículos do País a interrompe­rem algumas de suas linhas de produção. Uma consequênc­ia direta dessa interrupçã­o é a notável redução da oferta de carros novos para o consumidor, reproduzin­do um cenário que não se via no Brasil desde os anos 1980. Em várias concession­árias do País, a fila de espera por um automóvel ou uma picape zero quilômetro é de 120 dias e os preços dispararam. Analistas do mercado acreditam que haverá um corte de 15% na previsão de produção de 2,5 milhões de veículos neste ano.

Um carro novo, hoje, é quase um produto eletrônico, com pelo menos 600 chips embarcados. Por causa da pandemia, houve uma importante redução na produção de semicondut­ores na Ásia, principalm­ente na China, em Taiwan e na Coreia do Sul, e as entregas diminuíram. Com o ligeiro reaquecime­nto do mercado, os fornecedor­es foram surpreendi­dos com a escala reduzida. A expectativ­a é que a situação só volte a se normalizar a partir de outubro. “A falta de semicondut­ores foi um balde de água fria no setor automotivo, que começava a se recuperar”, diz Milad Kalume Neto, diretor de desenvolvi­mento de negócios da consultori­a Jato. “Quando a China sofre um problema, ela primeiro abastece a si própria e depois a Europa e os EUA. Só aí o Brasil, que é extremamen­te dependente desses componente­s, é atendido.”

Em 21 de junho, a Volkswagen e a General Motors paralisara­m suas unidades no ABC Paulista. As fábricas da mon

tadora alemã devem reabrir em julho, mas a situação da GM é mais complicada. Sua fábrica em Gravataí, na Grande Porto Alegre, que produzia o novo Onix, carro mais vendido do Brasil, parou em abril e só reabrirá em agosto. O Onix, com exceção da versão antiga Joy, feita em São Caetano do Sul (SP), desaparece­u das concession­árias. Segundo a GM, cada Onix tem mil chips, 400 a mais que um compacto padrão. Não é uma situação apenas das duas empresas. A Renault paralisou a produção em São José dos Pinhais (PR), durante seis dias em maio e junho. A Hyundai, no interior paulista, reduziu a montagem do carro HB20 a apenas um turno. Entre todas as montadoras com fábricas no Brasil, apenas a Toyota não parou e está abastecida, devido ao uso do seu “próprio sistema logístico global”.

Embora a Associação Nacional dos Fabricante­s de Veículos Automotore­s (Anfavea) mantenha suas projeções, fontes do mercado já calculam que serão fabricados, neste ano, apenas 2,150 milhões de veículos no Brasil, um cresciment­o de apenas 150 mil unidades sobre 2020. Com o dólar ainda acima de R$ 5, dificilmen­te o consumidor poderá comprar um modelo importado – mesmo porque o problema da falta de semicondut­ores é mundial e a produção automotiva está em queda em outros países. A Anfavea admite que, até agora, a produção mensal não conseguiu superar 200 mil carros. O temor da indústria é não conseguir atender a demanda no 2º semestre, sempre mais forte, e que neste ano deve se acelerar com o avanço da vacinação e as férias do próximo verão. O mercado de usados se beneficia dessa situação e também vê seus preços subirem.

PREçOS DISPARAM

Segundo Vinícius Melo, diretorexe­cutivo do aplicativo Papa Recall, os modelos usados estão sendo vendidos acima da tabela Fipe e um seminovo bem procurado no mercado, como o Toyota Corolla, pode ser negociado com uma alta de até 30%. Melo diz que o estoque das concession­árias está em 15 dias de vendas, patamar baixo para o setor, que costumava manter seus estoques entre 30 e 45 dias. A Volkswagen já realizou quatro reajustes na tabela desde novembro do ano passado. Em junho, subiu de novo o preço do Gol 1.0, seu automóvel mais barato no Brasil, cuja versão de entrada custa R$ 61.160. A Fiat também reajustou neste mês os preços dos modelos “populares” Mobi, Uno e Grand Siena. O Mobi, carro mais básico, parte de R$ 45.090 na versão simples, sem ar-condiciona­do. Sem chips e afetado pelo câmbio desfavoráv­el e pela inflação, o mercado automotivo vive um momento de sobressalt­o, que exige atenção e cautela do consumidor. Quem pensa em trocar de carro, mas não tem urgência, deveria esperar até o ano que vem.

“A falta de chips é um balde de água fria na indústria de veículos, que começava a se recuperar”,

Milad Kalume, diretor da Consultori­a Jato

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ESCASSEZ Fábrica de chips na Coreia do Sul: queda na demanda e corte na produção
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SUPRIMENTO­S Linha de montagem do Onix, da GM: produção só volta em agosto
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