ISTO É

Reforma eleitoreir­a

Com o domínio dos postos-chave no Congresso, os bolsonaris­tas conduzem mudanças na legislação para favorecer a reeleição do mandatário: o voto impresso é uma delas

- Ricardo Chapola

Sob a batuta de Arthur Lira, aliado de Bolsonaro, a Câmara começou a analisar o que pode ser a mais impactante reforma político-eleitoral dos últimos 30 anos e que tem como pano de fundo alavancar o projeto de reeleição do presidente. Desde a redemocrat­ização, a Casa nunca teve tantas frentes de discussões de mudanças na legislação eleitoral, com propostas açodadas e medidas que representa­m um claro retrocesso no processo democrátic­o, como é o caso da volta do voto impresso, defendido pelo capitão.

As discussões acontecem a pouco mais de um ano do pleito de 2022, quando Bolsonaro já manifestou que tentará a reeleição para se manter no cargo a qualquer custo. Em maio, o mandatário chegou a ameaçar virar a mesa caso suas iniciativa­s não sejam colocadas em prática.“Vai ter voto impresso e ponto final. Não vou nem falar mais nada. Vai ter voto impresso, porque se não tiver voto impresso, é sinal de que não vai ter eleição”, afirmou o mandatário em uma live.

CASUíSMO

As medidas casuística­s em estudo na Câmara deixam as próximas eleições envoltas em grandes incertezas. A mudança mais esdrúxula é a que está sendo proposta pela deputada Bia Kicis, fiel escudeira de Bolsonaro, e que prevê o voto impresso. Se a medida for aprovada, o processo eleitoral poderá retroceder e fazer o País voltar aos tempos do voto de cabresto, já que o eleitor terá um comprovant­e com o nome impresso do candidato em que votou, propiciand­o a corrupção da compra de votos. O presidente o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, já disse que “a votação pelas urnas eletrônica­s derrotaram um passado de fraudes que marcaram a história eleitoral brasileira”. O TSE estima que, em 10 anos, a impressão dos votos custará cerca de R$ 2,5 bilhões aos cofres públicos.

Paralelame­nte à excrescênc­ia do voto impresso, mudanças na legislação eleitoral são discutidas em três colegiados da Câmara de uma só vez. Na Comissão Especial de Reforma Política, os parlamenta­res se debruçam sobre a Proposta de Emenda à Constituiç­ão (PEC) 125/11, que é uma verdadeira colcha de retalhos, reunindo inúmeras emendas apresentad­as por dezenas de deputados. Dentre outras coisas, elas sugerem modificaçõ­es quanto ao tempo de mandato; ao número total de deputados; ao voto facultativ­o; ao financiame­nto de campanhas; às cotas raciais e de gênero; e às candidatur­as avulsas. É um saco de gatos, mas são alterações que podem vigorar nas próximas eleições, desde que as emendas sejam aprovadas até outubro, um ano antes do pleito.

Atualmente, as eleições para vereadores e deputados acontecem pelo sistema proporcion­al, baseado nos votos recebidos por todos os candidatos de um partido e nos votos recebidos pela legenda. Na prática, isso permite que partidos menores garantam o mínimo de representa­tividade no parlamento. A relatora da PEC, deputada Renata Abreu, porém, já adiantou que a manutenção desse modelo está descartada. A alternativ­a que será apresentad­a por ela propõe a adoção de um modelo misto, em que metade dos parlamenta­res seria eleita da forma atual e a outra parte pelo distritão, no qual os candidatos mais votados em cada estado ficam com as vagas.

Os termos da reforma, bem como a maneira como ela vem sendo discutida, tem despertado críticas dentro da própria Casa. “Vejo com grande preocupaçã­o o debate sobre uma nova reforma eleitoral, seja pelo seu ritmo apressado, seja pelas circunstân­cias em que se dá, no meio de uma pandemia e com o Congresso fechado para o povo”, criticou Alessandro Molon. O diretor da Transparên­cia Partidária, Marcelo Issa, afirmou que a entidade assinou um manifesto contra a reforma eleitoral. “As audiências para o debate dos assuntos têm acontecido remotament­e, o que prejudica muito. Não tem debate”. As emendas, neste caso, ficarão piores do que o soneto.

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FIEL ALIADO Arthur Lira trabalha para agradar Bolsonaro: mudanças açodadas
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VOTO IMPRESSO Bia Kicis propõe modelo que pode levar à compra de votos

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