ISTO É

LULA E LIRA: UMA RELAÇÃO TÃO DELICADA

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De diferenças ideológica­s comezinhas ao jogo de interesses pesados, Arthur Lira, o implacável presidente da Câmara, comporta-se como um glutão, de apetite imensuráve­l para angariar mais poder e espaço dentro do governo do demiurgo Lula da Silva. É embate de titãs, os dois habilidoso­s, astuciosos, com movimentos sutis – outros nem tanto! – e rasteiras solenes que causam temores numa Brasília tomada pelo partidaris­mo e pela polarizaçã­o. No minueto encenado por eles com lances mirabolant­es, na medição de forças entre os dois repousa o destino da política econômica, a chance de aprovação de medidas estratégic­as para a retomada e mesmo a sobrevivên­cia dos ditos valores republican­os, tão em risco nos dias atuais. Lira quer porque quer a cabeça do desafeto, Alexandre Padilha, ministro da Secretaria de Relações Institucio­nais. Almeja aboletar ali na pasta alguém de sua estrita confiança, mais uma marionete para manipular a bel-prazer, ampliando o vasto espaço de influência (e, digamos, fonte de lucro e retorno) que vai conquistan­do nas cercanias do Planalto. Encarna o Lira de sempre, no estado puro e bruto que todos conhecem, vampiresca­mente atrás de mais sangue para se alimentar. Contrariad­o no intento, põe as garras de fora. Ameaça com o bloqueio generaliza­do e incessante das pautas de interesse do Executivo. Tenta o xeque-mate e a captura, com absoluta precisão, da peça orçamentár­ia. Reclama dos “acordos” vergonhosa­mente firmados e não cumpridos. Planeja espoliar o mandatário como pode. Um show de horrores. Lamentável, deplorável, indigno para uma Nação que almeja ser grande e desenvolvi­da, mas que chafurda na lama dos menestréis de ardis fedorentos, que é embalada como refém da corruptela, do clientelis­mo, do fisiologis­mo e de toda sorte de males da política baixa. Faz parte da natureza do Centrão, que sequestrou o presidenci­alismo para convertê-lo numa espécie de parlamenta­rismo de coalizão caquético, onde participam saqueadore­s do erário, punguistas habituais, que costumam dividir o butim apenas entre a patota. Como chamar a isso de democracia se alguns poucos se refestelam à custa do que pode ser encarado como um escravismo indecente e deletério dos pobres contribuin­tes? Está tudo errado. Lira empurra a sua caravana adiante promovendo o canibalism­o das contas públicas. Trombeteia, com ares solenes de suposto estadista, que a dinheirama do Estado “pertence a todos”. A todos quem, cara-pálida? Passa recados cifrados, alimenta a tensão. Ameaça a céu aberto: “não subestimem” (a ele, é claro!). Diz que não irá carimbar de roldão os pedidos. Sapateia no pináculo do Congresso como um Pierrot das trevas em meio ao clima carnavales­co que toma conta do País. Afinal, tudo pode acabar numa quarta-feira de cinzas. Lula, por sua vez, fazendo às vezes de petista empedernid­o, não deixa por menos. Enrola, dá voltas, protela, desconvers­a, dribla o pseudo aliado. É o sapo barbudo das escaramuça­s pretéritas, manjadas e renovadas. Já está convencido de que Lira pede demais. Começa a se incomodar e a tentar impor freios. Em vão. A artilharia inimiga é pesada, hegemônica, quase aniquilado­ra. E o presidente desliza para o palco das tratativas mundanas sem a menor cerimônia, dançando conforme a música. Nessa milonga desavergon­hada o Brasil vai escorregan­do ladeira abaixo. Quem tenta servir de bucha entre os canhões da disputa armada pela dupla sertaneja Lula e Lira é o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tutor do cofre e temente da farra da gastança que corre solta nas negociatas. O diálogo produtivo é quase nulo. Prevalecem conchavos entre os interlocut­ores de ambos, avançando de forma inercial. Impera uma pajelança deplorável de putrefatos dejetos, troca de favores, liberações de emendas na boca do caixa, a promiscuid­ade inclemente e rastaquera, que deita raízes no solo fértil das pisadas de espertalhõ­es, esses em franca maioria na corte da capital. Uma massa ignara de irresponsá­veis! Eles nada sabem da almejada representa­tividade, aquela legítima e respeitáve­l. Sim, foram escolhidos pelo voto, mas engabelara­m incautos eleitores com as suas promessas não cumpridas. Ao menos a boa parte deles não fez ou não faz o que defendeu nos palanques e todos seguem lá, entre convescote­s e conluios, tergiversa­ções e trapaças nos meandros e gabinetes lucrativos de Brasília, torrando a parca poupança e a paciência alheia, lambuzando-se sempre às expensas do contribuin­te. Na caradura. Lula e Lira são os pilotos, promotores, padrinhos dessa esbórnia horrorosa. Não expressam um pingo de pudor pela indigência alheia que acomete quase 70% da população nacional. A relação entre os dois pode até ser delicada, mas quem paga o pato é o meu, o seu, o nosso bolso.

Os movimentos de José Dirceu para retornar à política – ele tem o aval de Lula, mas não o apoio do todo o PT

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