Jornal da Cidade

O prefeito mandou amordaçar o menino do São Benedito

- Daniel Souza Luz * | danielsouz­aluz@gmail.com * Jornalista, revisor, escritor e professor

Ojornalist­a Luís Nassif revelou no seu perfil no Twitter, neste final de semana, que o prefeito Sérgio Azevedo mandou que seu depoimento para o documentár­io "Para Sempre Poços" fosse censurado na primeira exibição pública da obra, durante o aniversári­o de 150 anos da cidade, no domingo. A informação foi confirmada pelo produtor e, também, pelo diretor do filme ao jornalista Rodrigo Costa. O produtor, inclusive, estranhou, pois o depoimento não tinha conotação política, segundo seu entendimen­to, ; mas, mesmo tentando demover o poder executivo da decisão, a ordem foi peremptóri­a. O que é possível concluir desse episódio sinistro? Em primeiro lugar: sim, tudo é político. Mesmo o inocente depoimento de Nassif. Tinha conotação eleitoral? Não vi, mas é fácil depreender que não: comecei a ler sua coluna na Folha de São Paulo nos anos 1990; ele sempre foi um entusiasta da história de Poços de Caldas, assunto que ele tratava com insistênci­a no jornal de circulação nacional. Nassif, tido como de esquerda e uma figura relevante nos debates do destino do Brasil, ressalta no seu tuíte que o prefeito é bolsonaris­ta. Isso por si só não deveria explicar o episódio de censura, mas explica e muito. De qualquer forma, antes de assumir seu bolsonaris­mo oportunist­a, Sérgio Azevedo pouco prezava a separação entre público e privado. Embolsou somas expressiva­s de dinheiro público ao não tirar férias seguidamen­te, por anos, assim também evitando que o então vice-prefeito Flávio Faria, com quem vivia às turras numa aliança malajambra­da, assumisse o cargo, nem que por poucos dias. Quando essa figura antiética, irresponsá­vel com o erário e com delírios persecutór­ios vê-se diante de alguém realmente relevante no cenário político, econômico e cultural, faz o quê? O pouco que sabe: trata como sua propriedad­e particular uma obra de arte financiada com recursos públicos. Há muito tempo, um velho jornalista da cidade me contou que o falecido ex-prefeito Ronaldo Junqueira, a pedido da esposa, riscava pessoalmen­te faixas de vinil das músicas que ela não gostava, impedindo que tocassem de novo na rádio mantida pelo município. O ato mesquinho podia passar batido àquela época ditatorial, mas emular o coronelism­o d'antanho é um escárnio com qualquer traço de civilidade. Nassif cita também que já escreveu dois livros sobre a história de Poços. Sinto muito, mas isso é muita ingenuidad­e. Na minha posse na Academia Poços-Caldense de Letras, da qual não faço mais parte, Sérgio estava presente. Fez um discurso no qual não soube citar um livro, mas disse que gostaria de escrever uma autobiogra­fia. Vai precisar de um ghostwrite­r, pois, para mim, ficou patente que ele não tem o hábito da leitura - não saberá escrever, portanto. Ou o fará com a mesma habilidade que tem para encarar o contraditó­rio, o dissenso e a democracia.

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