Jornal do Commercio

Ronaldinho Gaúcho

- ARTHUR CARVALHO ● Arthur Carvalho éda Federação Internacio­nal dos Jornalista­s.

Quando me perguntam qual foi o maior pontadirei­ta brasileiro, digo que foi Julinho. Aí, vem o espanto: e Garrincha? Digo que Garrincha não foi jogador de futebol, foi um misto de anjo e acrobata, docemente irresponsá­vel, que fazia do futebol uma atividade lúdica como outra qualquer, da qual se aproveitav­a para gozar a vida da forma mais leve e prazerosa. Tanto que nunca revidou as faltas desleais e até criminosas que sofria, sem se interessar pela qualidade técnica ou pela fragilidad­e do adversário que iria marcá-lo.

Ronaldinho Gaúcho se assemelha a Garrincha na forma de ser. Seu futebol era alegre e fora do comum. Nos áureos tempos, exibia um controle de bola perfeito, um gingado de corpo sensaciona­l, o que facilitava fintas espetacula­res, uma velocidade fantástica e uma visão de gol perfeita. Além de tudo, passava com açúcar e foi artilheiro. Nunca vi, nos meus 78 anos de futebol, um gol igual àquele que ele fez, de bola parada, na Inglaterra. Aquela bola foi impulsiona­da por que entidade? Até hoje ninguém sabe explicar.

Como todos os atletas, alguns jogadores de vôlei, basquete e futebol duram muito, outros duram pouco. Na década de 60, o Botafogo do Rio tinha um centroavan­te mulato, de cabelos lisos e negros, exímio artilheiro. Oswaldo foi comprado do São Paulo, e, numa decisão de campeonato paulista, foi flagrado numa boate, com uma bela loura, pelo famoso locutor esportivo Oduvaldo Cozzi, que o abordou: "Você não vai jogar a decisiva amanhã contra o Corinthian­s? O que está fazendo aqui?". E Oswaldo: “Você também não está aqui?” E Cozzi: “Estou, mas não vou jogar amanhã contra o Corinthian­s!”.

Não vou enumerar os grandes craques que abreviaram a carreira no alcoolismo. Isso acontece também com os esportista­s do mundo inteiro, agravado pelas drogas. Fica a impressão de que homens de talento e inteligênc­ia superiores não suportam o peso da glória e procuram viajar num mundo diferente e “ideal” de nirvana. O problema é que, quando exageram na dose, morrem mais cedo. Tudo isso é inerente à condição humana. O homem é o que é.

Entrevista­do sobre a decadência de Ronaldinho, Tostão filosofou, como sempre, com sabedoria: “Ele preferiu viver a vida”. Triste para nós, admiradore­s do seu brilhante futebol, é vê-lo na cadeia, de outro país, num constrange­dor crepúsculo existencia­l. E pensar que ele foi eleito duas vezes o maior jogador do mundo.

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