MP trabalhista e pacote
CORONAVÍRUS Texto permite corte salarial de até 70% ou suspensão dos contratos
Estimativa é de que novas regras evitem demissão de 8,5 milhões. No Senado, pacote social é aprovado com medidas para conter tendência de desemprego.
Dez dias depois de recuar numa proposta que previa a suspensão do contrato de trabalho durante a crise do coronavírus sem qualquer contrapartida do governo, o presidente Jair Bolsonaro anunciou ontem uma nova medida provisória (MP). Desta vez, o texto autoriza a redução salarial de até 70% ou a suspensão total dos contratos (ou seja, redução de 100% dos salários pagos pela empresa). Agora, em qualquer cenário haverá complementação de parte da renda do trabalhador pelo governo. Além disso, a medida prevê um período em que o funcionário não poderá ser demitido.
Se uma empresa reduzir jornada e salário por dois meses, por exemplo, o funcionário terá o emprego garantido por quatro meses (incluindo o período com remuneração reduzida). A proteção na vaga corresponde ao dobro do tempo no qual o governo pagará parte dos salários. Não foi especificado, porém, como será feita a fiscalização.
A estimativa da equipe econômica é que 24,5 milhões de trabalhadores terão o salário reduzido ou o contrato suspenso. Isso, segundo o governo, vai evitar a demissão de 8,5 milhões.
Criticado por especialistas e parlamentares pela demora na adoção das medidas para reduzir os impactos da covid-19, Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmaram ontem que o pacote de ações contra a crise soma R$ 200 bilhões. As ações já haviam sido anunciadas, mas precisam ser efetivadas pelo governo.
Serão R$ 98 bilhões para o pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 por três meses para trabalhadores informais, sancionado ontem por Bolsonaro. Mais R$ 51,2 bilhões para bancar o programa que vai permitir a redução do salário com contrapartida do governo. Outros R$ 36 bilhões vão compor um financiamento para pequenas e médias empresas pagarem suas folhas salariais por dois meses – bancos privados vão entrar com R$ 6 bilhões. Há ainda R$ 16 bilhões de transferência para Estados e municípios. “O total é de R$ 200 bilhões, 2,6% do PIB, para manutenção da saúde, a preservação de vidas e a manutenção do emprego”, disse Guedes.
A medida trabalhista, por se tratar de MP, valerá imediatamente após a publicação e poderá ser adotada pelos empregadores. Caberá ao Congresso validar ou alterar o texto.
Segundo o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, a nova legislação prevê três faixas de cortes salarial por três meses, com redução proporcional da carga horária: 25%, 50% e 70%. O governo complementará a renda de trabalhadores afetados, usando como base o valor do seguro-desemprego. Assim, se o corte salarial for de 70%, o governo entrará com 70% do valor do seguro-desemprego ao qual o trabalhador teria direito, caso fosse demitido. O mesmo ocorre com as outras faixas de cortes.
Na suspensão do contrato de trabalho ou corte de 100% do salário em empresas com receita bruta menor que R$ 4,8 milhões, o trabalhador terá direito a 100% do valor de seguro-desemprego ao qual teria direito. Empresas com receita bruta anual maior do que isso deverão manter o pagamento de 30% da remuneração do funcionário, que receberá 70% do seguro-desemprego.
O governo voltou atrás em um trecho da regra que chegou a ser anunciada há duas semanas, que previa que o valor representaria uma antecipação do seguro desemprego, a ser descontada em caso de demissão no futuro. Agora, o benefício será bancado inteiramente pelo governo. Caso o funcionário seja demitido após a crise, continuará a ter acesso ao seguro desemprego normalmente. “Estamos nos comprometendo com todos. Literalmente, todos. E com isso estamos evitando mais de 12 milhões de desempregados no Brasil. Esse é o compromisso do governo de tutelar mais de 25 milhões de pessoas”, disse Bianco, citando outras medidas, como o auxílio emergencial: “Estamos focando em mais de 150 milhões de brasileiros. Isso é muito relevante”.
Segundo o secretário de Trabalho, Bruno Dalcolmo, os benefícios não precisarão ser solicitados pelos trabalhadores. Em caso de redução, os valores serão depositados diretamente na conta. Dalcolmo afirmou que a medida abrange mais de 70% de todos os funcionários formais.
Quem recebe salário mínimo, caso da maioria dos trabalhadores domésticos incluídos na MP, terá reposição integral da remuneração. Segundo a MP, para os trabalhadores com remuneração até R$ 3.135 será possível reduzir os salários por intermédio de acordos individuais entre patrões e empregados, independentemente dos percentuais aplicados.
No caso de salários entre R$ 3.135 e R$ 12.202, será necessária a intermediação das entidades sindicais se a redução for superior a 25%. Acima de R$ 12.202 (duas vezes o teto do INSS), a CLT já permite acordo individual. Para reduzir o salário fora dos percentuais determinados pelo governo, de 70%, 50% e 25%, as empresas terão que negociar com sindicatos das categorias.
Com a Medida Provisória Trabalhista, a estimativa da equipe econômica é evitar a demissão de 8,5 milhões de trabalhadores