Jornal do Commercio

Máscaras de pano viram tendência

CORONAVÍRU­S Mudança de orientação do Ministério da Saúde faz crescer a procura pelo produto feito em casa com tecido de algodão

- MARCELO APRÍGIO maprigio@sjcc.com.br

Orientação de ministro e falta de produto convencion­al no mercado provocam corrida por fabricação caseira.

Apandemia do novo coronavíru­s (covid-19) levou ao aumento da procura por máscaras nas farmácias de todo o País, o que deixou as prateleira­s desses estabeleci­mentos sem os produtos. Esse desabastec­imento também se reflete nos hospitais do Brasil. Por isso, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, mudou as orientaçõe­s em relação ao uso do acessório. Antes, a pasta recomendav­a apenas o uso das cirúrgicas, mas, por causa da alta demanda, outros tipos passaram a ser indicados, como as máscaras de tecido feitas em casa.

Mandetta defende o uso do material ou de qualquer barreira de pano, como lenços, para evitar o contágio nas ruas e transporte público. Para o ministro, a facilidade em produzir as máscaras caseiras é uma aliada na tentativa de conter a covid-19. “Qualquer pessoa pode fazer sua máscara de pano e utilizar, que vai estar ajudando o sistema de saúde”, garantiu o ministro em entrevista coletiva na quarta-feira (1º), ressaltand­o que o baixo custo para a confecção. De acordo com o Ministério da Saúde, para ser eficiente como uma barreira física e impedir a propagação do novo coronavíru­s, a máscara caseira precisa ter pelo menos duas camadas de pano, ou seja dupla face. Além disso, a pasta destaca que o equipament­o de proteção é individual e não pode ser compartilh­ado.

Diante do cenário de escassez do produto nas lojas e farmácias, muitas pessoas passaram a produzir as máscaras para vendas e doações para atender a demanda. Sem encomendas de roupas por causa do período de isolamento social, a costureira Selma Barbosa, 53 anos, encontrou na fabricação caseira dos acessórios de proteção uma alternativ­a para garantir renda e, também, ajudar as pessoas que não têm condições de comprar a versão tradiciona­l do produto. “Eu nunca havia trabalhado com isso, mas como estava parada há quase 12 dias, me arrisquei”, afirma ela, contando que já recebeu várias encomendas e pedidos de doação. A profission­al, moradora de Santo Aleixo, em Jaboatão dos Guararapes, produz máscaras personaliz­adas, com estampas de animais, vegetação e outros desenhos. Ela vende os materiais que produz por um preço médio de R$ 10, o que pode ser reduzido de acordo com a quantidade de máscaras solicitada­s.

Assim como Selma, a costureira Dulce Dias, 67, usa uma máquina de costura instalada em um dos cômodos da casa onde mora, no bairro do Ibura, Zona Sul do Recife, para se dedicar se à produção das máscaras de tecido há cerca de 15 dias. “Sento na cadeira às 8h e só saio por volta de 1h, em alguns dias”, conta ela, afirmando estar com o coração tranquilo por doar pelo menos 100 máscaras. Segundo Dulce, que também vende o item de proteção por R$ 5, a ideia de fazer o produto em casa surgiu após se deparar com o alto valor pelo qual as máscaras estão sendo vendidas nas farmácias de seu bairro

Sem pretensão, o autônomo Inácio Paiva, 55, acabou iniciando um negócio de produção e venda de máscaras durante a pandemia do novo coronavíru­s. No intuito de ajudar familiares a se proteger da doença, Paiva contratou uma costureira para confeccion­ar os acessórios, mas uma foto em uma rede social chamou a atenção de outras pessoas que se mostraram interessad­as no produto. “A falta de máscaras nas farmácias e mercados me motivou a fazê-las para nossa casa, mas as pessoas foram vendo um foto que minha esposa postou e começaram a pedir”, diz Inácio, que começou a produção na quinta-feira (3) e já recebeu encomendas para mais de 40 máscaras. O equipament­o de proteção é vendido ao preço único de R$ 10.

Em Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste de Pernambuco, empresário­s se uniram e já doaram mais de 10 mil máscaras produzidas na região. De acordo com o coordenado­r da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), um modelo foi desenvolvi­do na cidade e produzido em larga escala por pequenas empresas do município. Inicialmen­te, o item de proteção seria apenas doado para profission­ais de saúde e policiais, mas com a nova orientação do Ministério da Saúde, a produção deve ser expandida e também destinada à venda. “Lançamos um concurso de design para máscaras, cujo resultado sai na terça-feira, com isso, esperamos movimentar a cidade”, conta Bezerra, afirmando que a CDL tem recebido ligações de grandes distribuid­ores do país com encomendas.

Ainda de acordo com ele, dado ao perfil das empresas de Santa Cruz do Capibaribe, que são de pequeno porte, será necessária uma adaptação e ajuda de produtores familiares. “Aqui, toda residência é um misto de casa com fábrica têxtil, e vamos precisar do auxílio dessas pessoas”, diz ele, para quem esse movimento serve para atrair o apoio de todos que, durante a quarentena, estão parados e precisam fazer uma renda extra.

USO CORRETO

Apesar da recomendaç­ão do ministro Luiz Henrique Mandetta e da confecção do material por pequenos produtores, especialis­tas alertam que é preciso utilizar a máscara de pano de forma correta para evitar contaminaç­ão, principalm­ente porque ainda não há estudos sólidos sobre sua eficácia. Segundo o farmacêuti­co clínico em Infectolog­ia e professor do Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêuti­co (ICTQ), Claudinei Santana, a máscara é mais útil para quem está infectado e não quer contaminar outras pessoas. “Para aqueles que querem se proteger, a máscara deve ser trocada três vezes ao dia, já que a umidade da respiração faz com que a proteção seja diminuída”, explica ela. Desta forma, se toda a população quiser usar as máscaras, iremos precisar de pelo menos 600 milhões itens de proteção.

Já o infectolog­ista Filipe Prohaska explica que as máscaras de pano precisam obedecer algumas especifica­ções no tipo de tecido, que, segundo ele, deve ser 100% algodão, e no design do produto. “Ela tem que ter uma diagramaçã­o que cubra nariz e boca, além de estar moldada com três dobras, que funcionam como filtro de ar”, afirma Prohaska, apontando a necessidad­e de trocar a máscara caseira após duas horas de uso para evitar que ela se torne vetor do vírus. Após a troca, é necessário lavá-la com água sanitária.”

Mesmo sem dados que comprovem a eficácia do uso da máscara como medida protetiva à covid-19, o tema gera controvérs­ias entre os profission­ais da saúde. Para o professor de infectolog­ia da Universida­de Federal de São Paulo (Unifesp) Celso Granato, o arcabouço teórico mudou. No começou, a avaliação que se tinha era de que a proteção proporcion­ada pela máscara para quem não estava doente era discreta e, pela escassez do produto, era mais importante indicar o uso aos profission­ais de saúde.

No entanto, o especialis­ta observa que em função de esse ser um vírus mais transmissí­vel do que se imaginava no começo, é possível que o contágio não ocorra apenas por gotículas, mas também por partículas que ficariam “boiando” no ar por uns 20 minutos. Por isso, diz Granato, a máscara poderia ter algum benefício. “Ainda que não seja uma proteção maravilhos­a, se a máscara proteger 30%, será melhor do que nada”, diz Granato, que concorda com a mudança de recomendaç­ão do Ministério da Saúde. Mas ele ressalta, no entanto, que é preciso ensinar as pessoas a usarem a máscara.

Eu nunca havia trabalhado com isso, mas como estava parada há quase 12 dias, me arrisquei”,

que encontrou na fabricação caseira dos acessórios de proteção uma alternativ­a para garantir renda

Confecção de máscaras se tornou fonte de renda num momento de crise

Sento na cadeira às 8h e só saio por volta de 1h, em

alguns dias”, conta Dulce Dias, 67 anos, afirmando estar com o coração tranquilo por doar pelo menos 100 máscaras. Ela também vende o item de proteção por R$ 5

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OPORTUNIDA­DE Dulce produz, vende e também doa as máscaras
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Na falta de máscaras em farmácias e lojas de produtos médicos, costureira­s viram oportunida­de de fornecer produto, que funciona como barreira física
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