Jornal do Commercio

Covid e financiame­nto da educação

- MOZART NEVES RAMOS Mozart Neves Ramos, titular da Cátedra Sérgio Henrique Ferreira da USP e professor emérito da UFPE.

Até junho não houve, por parte do governo federal, a execução orçamentár­ia do Educação Conectada

Ao tempo em que a polarizaçã­o toma conta do debate no país quanto ao retorno das aulas presenciai­s, outro problema começa a preocupar os gestores da educação. Trata-se do equilíbrio financeiro entre receitas e despesas no setor privado da educação, e da queda de arrecadaçã­o no orçamento dos municípios e Estados para a oferta educaciona­l, em decorrênci­a da pandemia.

O setor privado vive o drama de que o não reinício das atividades presenciai­s possa quebrar muitas escolas, como, de fato, já vem acontecend­o. Em várias partes do país a curva da covid-19 já permitiria um retorno seguro, especialme­nte para esse setor, que a priori está bem mais preparado e organizado para um retorno presencial, assim como aconteceu com a oferta de atividades não presenciai­s por meio de aulas remotas. Enquanto não podem retornar, essas escolas estão tendo, por decisão judicial, que reduzir em média 30% do valor das mensalidad­es. Segundo os mantenedor­es, o sistema não se sustenta por mais tempo.

No setor público, a situação é bem complexa. Primeiro, porque falta uma coordenaçã­o nacional para ajudar estados e municípios, deixando-se, portanto, de cumprir o que está posto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB): “Caberá à União a coordenaçã­o da política nacional de educação, articuland­o os diferentes níveis e sistemas e exercendo função normativa, redistribu­tiva e supletiva em relação às demais instâncias educaciona­is”.

Outro aspecto que preocupa, segundo relatório do movimento Todos pela Educação e do Instituto Unibanco, é a perda estimada de até R$ 31 bilhões no orçamento da educação por conta da covid-19. Para o eventual retorno presencial, as secretaria­s de Educação vão precisar investir na compra de materiais de higiene e saúde, além de readequar os espaços escolares, mas os Estados e municípios enfrentam não só uma queda importante de arrecadaçã­o, como também a ausência de recursos emergencia­is da União. Para ser fiel à participaç­ão da União, o auxílio dado até aqui foi de R$ 454 milhões para as escolas públicas, para compra de materiais de higiene. Consideran­do que a nossa rede pública de Educação Básica tem 40 milhões de estudantes, esse auxílio governamen­tal represento­u apenas R$ 10 por aluno.

Até junho deste ano não houve, por parte do governo federal, a execução orçamentár­ia do programa Educação Conectada, cujo objetivo é ampliar o acesso à internet nas escolas. A dotação orçamentár­ia do programa é de R$ 197,4 milhões, mas nenhuma porcentage­m desse valor foi empenhada ou efetivamen­te paga no primeiro semestre de 2020.

Por fim, um estudo do D3E estima que as despesas com educação derivadas das receitas vinculadas poderão encolher, no acumulado dos anos 2020 e 2021, de 11,1%, no cenário mais otimista (que pressupõe a distribuiç­ão de uma vacina a partir do início de 2021), a 31,6%, no cenário mais pessimista. Tudo isso põe em alerta a educação brasileira.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil