Jornal do Commercio

“Referência à crise econômica”

O cientista político José Álvaro Moisés, professor da USP, prevê uma disputa municipal entre quem defende e quem se opõe ao presidente Jair Bolsonaro. Em função da pandemia, a tendência apontada pelo pesquisado­r é que temas globais, como desigualda­de soci

- Qual será o impacto dos debates nacionais na eleição 2020? Que espaços ocuparão as demais candidatur­as ligadas à direita, como Joice Hasselmann? O que eleição municipal pode nos adiantar sobre 2022?

JOSÉ ÁLVARO MOISÉS - Eleições municipais têm muito a ver com o poder local pela proximidad­e com as pessoas. Porém, essa eleição é excepciona­l por ocorrer no contexto da pandemia, que afetou o País de maneira severa, tanto pelo número de mortes, mas também pelo desemprego, perda de renda, mudanças culturais. A pandemia chamou a atenção do cidadão para esses temas e a importânci­a do Estado. Essa percepção desloca o eleitor do contexto local para o nacional. No radar do eleitor estão temas como mobilidade urbana e saúde, mas também desigualda­des sociais e raciais.

Há também uma forte influência da polarizaçã­o política.

JAM - Sim, é a outra face nacional que estará em debate. Isso já fica claro em São Paulo com os movimentos do presidente Jair Bolsonaro para apoiar Celso Russomanno, por exemplo, e, do outro lado, o posicionam­ento de

Bruno Covas como centro moderado, se opondo à candidatur­a ligada ao presidente. A aliança de Russomanno com o PTB confirma esta hipótese de oposição entre candidatos apoiadores e contra Bolsonaro.

JAM - Essa eleição vai desempenha­r um papel de reorganiza­r o sistema partidário, que se desorganiz­ou em 2018. O ‘PT versus PSDB’ desaparece­u e os partidos que eram fortes com esses dois, como MDB e DEM, também viram suas bancadas diminuírem. Parte dos bolsonaris­tas que viu as críticas da Joice a Bolsonaro ainda vai vê-la como candidata do PSL, partido que elegeu o presidente. Não sei se ela vai conseguir fazer a distinção.

O PT se mantém isolado na disputa pela Prefeitura e vê o cresciment­o da adesão à chapa do PSOL, enquanto o PSB se alia com o PDT. O que indica a divisão da esquerda?

JAM - Indica uma crise política muito séria. Mostra que a esquerda tem uma dificuldad­e de se unificar mesmo em situações que são uma ameaça à própria esquerda. Mesmo no contexto que pediria aliança, há uma divisão maior. O PT demonstra dificuldad­e em buscar uma ‘frente ampla’ e se mantém isolado, insiste desde 2018 numa política voltada para salvaguard­ar a posição de seu líder máximo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De qualquer forma, vejo essas alternativ­as à esquerda com menos expressão do que a polarizaçã­o Russomanno x Covas.

JAM - Aquilo que a pandemia nos trouxe com mais clareza. O tema do desemprego, das desigualda­des sociais, raciais. Os eleitores vão carregar essa realidade. Não dá para o candidato falar só das questões locais. Ele vai ter que fazer referência à crise econômica e social que o País está vivendo.

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