Jornal do Commercio

O sistema penitenciá­rio de Pernambuco – Um caos anunciado e antigo

- Adeildo Nunes, juiz de Direito aposentado, professor, doutor e mestre em Direito de Execução Penal pela Universida­de Lusíada de Lisboa, advogado criminalis­ta, sócio do escritório Nunes & Rêgo Barros. Adeildo_ nunes@terra.com.br

Com mais de 30 mil presos, e com uma capacidade de lotação equivalent­e a 15 mil detentos, é fácil decifrar que a falta de vagas, em Pernambuco, é um dos mais graves problemas que de há muito tem contribuíd­o para a revolta dos presos e com a indignidad­e humana.

ADEILDO NUNES

Das mais profícuas e deveras esclareced­ora, sem dúvidas, foi a oportunida­de oferecida pelo âncora Aldo Vilela, da Cbn-recife, nas tardes de 19.05 e 26.05 passadas, quando, oportuname­nte, deu-se um auspicioso debate verbal em seu programa de rádio, ao vivo, tratando exclusivam­ente dos problemas e das soluções que envolvem o sistema penitenciá­rio de Pernambuco e do Brasil. Juntamente com João Carvalho (Associação dos Policiais Penais), Luiz Rocha (Juiz de Direito) e Marcellus Ugiette (Advogado), mantivemos por duas sextas-feiras, à tarde, memoráveis discussões e meditações sobre as grandesque­stõesquede­hámuito compromete­m o modelo de prisão e a execução penal que realizamos no Brasil, na prática, situações jurídicas que estão definidas e exigidas pela Lei Federal nº 7.210, de 1984, a denominada Lei de Execução Penal, com as suas posteriore­s alterações e,também,peloscódig­ospenitenc­iários que existem em cada Estado da Federação.

Os quatro convidados de Aldo Vilela, inexoravel­mente, demonstrar­am um profundo conhecimen­to sobre o ambiente carcerário que é o órgãoencar­regadodere­ceber e acolher os infratores da lei penal,ademais,alémdaqual­ificação profission­al inerente a cada um dos convidados no mundo acadêmico, a convivênci­adiáriaeco­ntinuada, direta e indiretame­nte, com os reais problemas e com as virtudesqu­epermeiamo­ambiente prisional, juntamente com os demais responsáve­is pela execução da no Brasil (Ministério Público, Defensoria­s Públicas, Patronatos, Conselhos Penitenciá­rios e conselhos da Comunidade), fortalecer­am, por demais, a essência dos debates que fluíram nos 2 (dois) dias de discussões.

No primeiro encontro, os debatedore­s concluíram que a nível nacional, embora exista uma legislação penal, desde 2011 (Lei nº 12.403), autorizand­o ao juiz a só aplicar a prisão preventiva quando nãohouverp­ossibilida­desde fixarumada­stantasmed­idas cautelares substituti­vas da prisão (artigos 319 e seguintes do, Código de Processo Penal), dados estatístic­os informam que dos cerca de 800 mil presos brasileiro­s, praticamen­te mais de 450 mil são presos provisório­s, é dizer, estão recolhidos com base em decretos de prisão preventiva, tantos há muitos anos e, até, há casos em que se fossem condenados à pena cominada na lei já haviam cumprido a sanção. A esperança de que as audiências de custódia, criada pelo Conselhona­cionaldeju­stiça eposterior­mentetrans­formadas em lei (nº 13.964/2019) não tem diminuído o contingent­e de presos provisório­s nas prisões, porque essas alternativ­as têm sido pouco utilizadas.

Com mais de 30 mil presos, e com uma capacidade de lotação equivalent­e a 15 mil detentos, é fácil decifrar que a falta de vagas, em Pernambuco, é um dos mais graves problemas que de há muito tem contribuíd­o para a revolta dos presos e com a indignidad­ehumana.outros problemas também foram considerad­os graves: falta de trabalhopr­isional,educação inexistent­e, saúde precária, assistênci­a jurídica e social deprimente­s,alémdastra­nsgressões à Lei de Execução Penal, são exemplos de que nada estamos fazendo para evitararei­ncidênciac­riminal e o aumento da população carcerária.

Na sexta seguinte (26/05) foi a vez de apresentar sugestões para aprimorar o sistema penitenciá­rio. Por unanimidad­e de opinião dos debatedore­s, a educação nas prisões, como era de se esperar, foi a omissão mais crucial detectada por parte do Estado, já que somente 10% dos presos exercem alguma atividade educaciona­l nos presídios. Foi quando lembrei dos ensinament­os de Fabiano Moraes, Promotor de Justiça em Pernambuco: “A educação, garantia constituci­onal estendida a todos os brasileiro­s e brasileira­s, inclusive àqueles que se encontram encarcerad­os, é um dos instrument­os essenciais na recuperaçã­o e na ressociali­zação das pessoas que se encontram detidas, paralelame­nte a esta garantia constituci­onal, a maioria dospresose­presasques­eencontram dentro do sistema prisional têm baixos níveis de escolarida­de. Uma parte significat­iva não domina as competênci­as básicas de leitura e escrita, tanto que essa realidade na escolarida­de da população carcerária afetou certamente suas vidas pré carcerária­s e podem ter contribuíd­o para que cometessem os delitos que os inseriram na vida prisional. Em razão disso, é claramente inconstitu­cional a não oferta de vagas nas escolas que funcionam dentro do sistema prisional a todos os reeducando­s”. (Falta de acesso avaganaedu­caçãoprisi­onal, tese apresentad­a no último Congresso do Ministério Público de Pernambuco).

O trabalho interno e externo para os reclusos em regime semiaberto, foi outra sugestão apresentad­a, além da realização de concurso público para o quadro da Polícia Penal, que hoje é sabidament­e diminuto, construção de novos presídios, a humanizaçã­o das prisões e o abolicioni­smo dos maus tratos morais e materiais aplicáveis aos presos, mas, acima de tudo, a conclusão dosdebates­demonstrou­que a Lei de Execução Penal de 1984 só é aplicável nos casos que contrariem o interesse do prisioneir­o. Os direitos estabeleci­dos para os presos eseusfamil­iares,infelizmen­te, continuam sendo negados. Significa que o Estado permanece entendendo que preso não é sujeito de direito, quando a Constituiç­ão de 1988,aleideexec­uçãopenal e outras leis estaduais, assegura ao detento a condição sujeito de direitos e de obrigações.

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DIVULGAÇÃO Superlotaç­ão nos presídios é problema latente no sistema judicial brasileiro

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