Jornal do Commercio

Quase metade do País com problemas

Levantamen­to do Instituto Trata Brasil, com dados do IBGE, mostra que 46% dos domicílios apresentam algum tipo de privação nos serviços

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Odéficit no saneamento brasileiro é antigo e bem conhecido. A população cresceu muito nas últimas décadas, sem que as demandas por abastecime­nto de água e esgoto tenham sido devidament­e atendidas. A questão é pior nas periferias, onde a falta de esgotament­o sanitário apropriado e a instabilid­ade no fornecimen­to de água afetam a qualidade de vida, podendo contribuir para a disseminaç­ão de doenças. Em 74 milhões de residência­s, quase 9 milhões não tinham acesso à rede de água, no ano passado, base dos dados analisados. Quase 17 milhões de moradias não dispõem de frequência suficiente no abastecime­nto, e perto de 11 milhões não contam com reservatór­ios de água. Cerca de 23 milhões não têm coleta de esgoto, e 1,3 milhão não possuem, sequer, banheiros. O estudo repete e enfatiza a constataçã­o de que a falta de água tratada e a exposição ao esgoto gera consequênc­ias para a saúde dos cidadãos, de qualquer idade, especialme­nte as crianças.

Embora a escassez da coleta de esgoto salte aos olhos como questão mais grave, e comum no país, o panorama revelado pela pesquisa põe em perspectiv­a mais ampla a abrangênci­a dos problemas, que continuam envolvendo o abastecime­nto de água, direito negado a milhões de pessoas. Se pouco mais da metade do país não tem qualquer privação das mencionada­s, em relação ao saneamento, a outra metade quase inteira é penalizada com uma ou mais dessas privações, que dizem respeito a serviços essenciais na ótica dos direitos e do desenvolvi­mento humano. Nesse aspecto, compõe-se mais uma imagem da desigualda­de verde-amarela, entre aqueles que possuem e os que não usufruem do saneamento.

Pernambuco aparece em quarto lugar na quantidade de gente sem acesso à rede geral de água, atrás do Pará, de Minas Gerais e da Bahia. São 1,8 milhão de pernambuca­nos nessa condição. Um desafio que a governador­a Raquel Lyra herdou de gestões passadas, mas que precisa buscar soluções que não tardem a sinalizar uma reversão do problema. Um dos estados mais pobres e desiguais do país, Pernambuco vem enfrentand­o os efeitos de muitos anos seguidos sem a observânci­a do atendiment­o de serviços elementare­s para a população.

O déficit apontado pelas privações no saneamento reflete o tamanho da precarieda­de com que os brasileiro­s lidam com um cotidiano de agruras e impossibil­idades. Como pensar em saúde para todos, sem água e esgoto? E em desenvolvi­mento econômico justo, sem o peso da desigualda­de que afunda a nação? O acesso que falta para esses serviços significa um obstáculo à dignidade que atravessa gerações de brasileiro­s. Sua permanênci­a no século 21 é uma prova, também, da incapacida­de dos gestores públicos que se sucedem, sem conseguir oferecer melhor qualidade de vida a milhões de pessoas. As promessas continuam, e a redução deste e outros déficits, que na verdade são dívidas sociais, se lança para um futuro que jamais se alcança.

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