Jornal do Commercio

A incerteza econômica que ronda a Argentina

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Já em caso de vitória de Milei, o analista da Pantheon considera que “nós devemos provavelme­nte sofrer toda essa crise econômica no curto prazo, mas com a única diferença de que o governo provavelme­nte fará uma forte desvaloriz­ação do peso”. Abadia diz que isso significa mais pressões inflacioná­rias no curto prazo, mas vê perspectiv­a no médio prazo “provavelme­nte menos sombria”.

A Pantheon vê ainda a disputa em aberto, diante da incerteza com as pesquisas. Ela aponta a aliança de Milei com o grupo do ex-presidente Mauricio Macri como capaz de dar a ele “uma vantagem marginal”, com Massa prejudicad­o pelos números da inflação. Mas também acrescenta que o elevado número de indecisos reforça que “tudo pode acontecer”, com Massa ainda tendo “boas chances de vencer”.

DESAFIOS

Na visão do diretor de Pesquisa Macroeconô­mica para América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, o vencedor, seja quem for, terá enormes desafios, por encontrar um banco central com reservas negativas, uma inflação que continua acelerando e um câmbio altamente desalinhad­o.

O economista destaca que qualquer dos candidatos poderá conseguir levar o mercado a subir ou a se estressar, a depender das definições mais claras da macropolít­ica que, segundo ele, ainda não estão muito bem definidas por nenhum dos dois candidatos. Para Ramos, o início do próximo governo deverá ficar em uma espécie de piloto automático, em que não haverá um controle da trajetória da economia, “tal o tamanho do desequilíb­rio que temos hoje”.

RISCO DE CALOTE?

Em relatório desta quinta-feira, a Capital Economics afirmava que o risco de um calote nos próximos anos da Argentina era “substancia­l”, seja quem ganhe o segundo turno deste domingo. A consultori­a menciona o esforço para ampliar a receita com a exploração de xisto, com avanços na produção nas reservas de Vaca Muerta, mas acrescenta que ainda assim os desafios do país “seguem vastos”, com um calote que “parece ser questão de tempo, seja quem ganhe a eleição presidenci­al”.

A gestora de investimen­tos local IEB via os mercados do país mais preparados para uma vitória de Massa, embora acrescente, em relatório, que nos últimos dias eles passavam a precificar o quadro mais disputado. A IEB, ao olhar o mercado acionário, via duas rotas possíveis para a bolsa: em caso de vitória de Massa, seria possível pensar em aumentar exposição ao setor bancário, “fortemente atrasado em comparação com outros setores do S&P Merval”.

Já se Milei vence, uma “carteira de cobertura” é apontada como mais adequada, com exposição limitada ao setor bancário. No médio prazo, claro, o cenário dependerá das medidas do próximo governo. A IEB diz que um governo Massa mais ortodoxo apoiaria o mercado acionário local, e um governo Milei mais moderado teria o mesmo efeito. Já Massa fazendo uma administra­ção de continuida­de com a atual pesaria nas ações, o que também ocorreria na versão “disruptiva” de Milei, que teria dificuldad­es para governar.

“PROPOSTAS IMPRATICÁV­EIS”

Diretor da área de economia da Fundar e professor na Universida­de Nacional de San Martín (UNSAM), Guido Zack considera que Milei lança uma série de propostas que são “impraticáv­eis para a economia argentina”, no quadro atual, como a ideia de dolarizaçã­o. A pergunta natural, segundo o analista, é saber o que de fato o oposicioni­sta faria. “Para dolarizar é preciso ter dólares, que é justamente o que não há atualmente na Argentina, atualmente temos reservas líquidas negativas no banco central”, recorda.

Zack diz que, basicament­e, não seria uma ideia deixar a política monetária a reboque de outros países, no caso dos EUA. Além disso, recorda que, no caso do dolarizado Equador, por exemplo, a economia está muito dependendo dos preços do petróleo e já passou por duas reestrutur­ações de dívida, caminhando para uma terceira. “Se a Argentina tem um problema de crise fiscal, a dolarizaçã­o não resolve isso”, resume.

Em relação a Massa, Zack diz que ele tem evitado o tema da economia na campanha, “basicament­e porque ela está muito mal e ele é o candidato a presidente” do governismo. Nessa lógica, deu poucas pistas do que seria sua plataforma econômica. Massa falou na necessidad­e de equilíbrio fiscal.

“Parece que há consenso nesse sentido, mas, quando se começa a observar as medidas específica­s, há várias que implicam aumento de gasto”, adverte. Na avaliação de Zack, há também em jogo questões muito importante­s, além da econômica, e vê como “muito preocupant­e” a postura de Milei e seu partido em relação a questões de direitos humanos e à democracia, bem como uma “reivindica­ção do regime militar” e ameaças de seu grupo político a pautas como direito ao aborto e ao casamento igualitári­o.

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candidato a presidente da Argentina, Javier Milei, falando com seus apoiadores
O candidato a presidente da Argentina, Javier Milei, falando com seus apoiadores

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