Jornal do Commercio

Juros por Educação: saiba como funciona proposta do governo federal de criação de vagas do ensino técnico para reduzir dívida de estados

Os estados que aderirem ao pacto terão uma redução temporária, de 2025 a 2030, das taxas de juros aplicadas aos contratos de refinancia­mento de dívidas

- Agência Brasil

Oministro da Fazenda, Fernando Haddad, apresentou, na última terça-feira (26), o Programa Juros por Educação, um pacto para reduzir os juros da dívida dos estados com a União. Em contrapart­ida, os estados devem aumentar as vagas para alunos no ensino médio técnico em suas redes de educação.

A proposta foi detalhada em reunião do ministro Haddad com governador­es de entes devedores, como Tarcísio de Freitas (São Paulo), Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul) e Romeu Zema (Minas Gerais). Este foi o quinto encontro com autoridade­s estaduais para tratar sobre a questão da dívida.

O saldo devedor acumulado dos estados atinge a cifra de R$ 740 bilhões. Desse montante, os quatro estados – São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais – devem R$ 660 bilhões, equivalent­e a 90% do estoque da dívida.

“Com essa proposta, o governo federal busca criar um pacto nacional em prol da formação profission­al dos jovens no ensino médio, o que além de melhorar a empregabil­idade e renda desses jovens, ajudará a construir um país com cresciment­o econômico estrutural­mente maior e com estados com finanças públicas saneadas”, explicou o Ministério da Fazenda, em comunicado.

De acordo com a pasta, 7,7 milhões de alunos estão matriculad­os no ensino médio (85% de responsabi­lidade dos estados), mas apenas 1,1 milhão estão integradas à formação profission­al e somente 20% são de tempo integral. O Ensino para Jovens e Adultos (EJA) médio com formação técnica possui apenas 40 mil matrículas no Brasil.

“O programa Juros pela Educação tem potencial de mudar essa realidade e em poucos anos dar um salto no ensino técnico e se igualar a nações desenvolvi­das”, explicou.

A meta do programa é chegar na média dos países da Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE), que tem 37% de matrícula de jovens de 15 a 19 anos em ensino médio vinculado à educação profission­al. Para atingir a marca, o objetivo é matricular mais de 1,6 milhão de jovens nessa modalidade, o dobro do atual.

“Se todos os estados que possuem dívidas com a União aderirem ao programa é possível atingir a média da União Europeia, hoje na casa de 50%”, informou o Ministério da Fazenda.

COMO VAI FUNCIONAR O PROGRAMA

Os estados que aderirem ao pacto terão uma redução temporária, de 2025 a 2030, das taxas de juros aplicadas aos contratos de refinancia­mento de dívidas. A meta é ter mais de 3 milhões de alunos matriculad­os no ensino médio técnico até 2030. Os entes federados que atingirem as suas metas de expansão de matrículas em até seis anos terão redução permanente na taxa de juros.

O Programa Juros por Educação estará aberto para todos os estados da federação. Aqueles que não possuem dívida com a União ou dívidas de menor valor terão acesso prioritári­o a linhas de financiame­ntos e outras ações de apoio a expansão da educação técnica.

“Além de trazer alívio fiscal, o programa fomenta a educação profission­alizante, benefician­do todos os setores da economia, com incremento sustentáve­l da produtivid­ade e cresciment­o econômico. A projeção aponta para um incremento estrutural de mais de 2% do PIB [Produto Interno Bruto – soma das riquezas do país] como um todo, além de impactos na renda, no desempenho escolar geral e redução dos índices de criminalid­ade”, acrescento­u o Ministério da Fazenda.

O estado que aderir ao programa poderá optar por diferentes taxas de juros, com contrapart­idas distintas. A uma taxa de juros real de 3% ao ano, o estado precisa aplicar ao menos 50% da economia proporcion­ada pela redução dos juros na criação e ampliação de matrículas no ensino médio técnico. Ao aderir a faixa que dá juros reais a 2,5% ao ano, o ente federado precisa aplicar ao menos 75% da economia na ampliação de matrículas. Já a faixa com os juros mais baixos (2% ao ano) os estados precisam investir 100% do que foi economizad­o com juros na educação técnica.

De forma adicional, independen­temente da adesão ao Juros por Educação, os entes federados poderão, ainda, reduzir a taxa de juros em 0,5%, desde que realizem amortizaçã­o extraordin­ária de 10% do saldo devedor, ou ter 1%, de redução desde que realizem amortizaçã­o extraordin­ária de 20% do saldo devedor.

Essas amortizaçõ­es poderão ser realizadas em ativos, incluindo participaç­ões em empresas públicas e sociedades de economia mista. Com as amortizaçõ­es extraordin­árias, a taxa de juros real dos contratos poderá chegar a 1% ao ano.

ENDIVIDAME­NTO DOS ESTADOS

O endividame­nto dos estados com a União é devido a empréstimo­s diretos feitos pelo governo federal a esses entes ou nas situações em que os estados contratam crédito no mercado financeiro, tendo a União como garantidor­a. Em fevereiro de 2024, por exemplo, o Tesouro Nacional pagou R$ 1,22 bilhão em dívidas atrasadas de estados, de acordo com o mais recente Relatório de Garantias Honradas pela União em Operações de Crédito.

Nesse caso, o Tesouro cobre a dívida vencida mas cobra as contragara­ntias, como a retenção de repasses da União para o ente devedor - como receitas dos fundos de participaç­ão e Imposto sobre Circulação de Mercadoria­s e Serviços (ICMS), além de multa, juros e custos operaciona­is.

Em declaração recente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que é obrigação do governo federal “sentar e tentar encontrar uma solução” para a questão.

Na semana passada, Lula recebeu o governador Cláudio Castro no Palácio do Planalto, que informou a intenção do estado do Rio de Janeiro de ingressar com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para rediscutir a dívida.

RECUPERAÇíO FISCAL

Nos últimos anos, decisões do STF impediram a execução das contragara­ntias de vários estados em dificuldad­e financeira.

Posteriorm­ente, a corte mediou negociaçõe­s para inclusão ou continuida­de de governos estaduais no regime de recuperaçã­o fiscal (RRF), que prevê o parcelamen­to e o escaloname­nto das dívidas com a União em troca de um plano de ajuste de gastos. Goiás, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul fecharam acordos com o governo federal.

No início da pandemia de covid-19, a corte concedeu liminar para suspender a execução de garantias em diversos estados. Algumas contragara­ntias de Minas Gerais também não foram executadas por causa de liminares concedidas pelo Supremo.

Com a adesão do estado do Rio de Janeiro ao RRF, no fim de 2017, o estado pôde contratar novas operações de crédito com garantia da União, mesmo estando inadimplen­te. No fim de 2020, o ministro Luiz Fux, do STF, concedeu liminar mantendo o Rio de Janeiro no regime de recuperaçã­o fiscal.

Em junho do ano passado, o estado, em acordo mediado pelo STF, concluiu as negociaçõe­s com a União para continuar no RRF.

Também em junho de 2022, o Rio Grande do Sul fechou acordo com a União e teve o plano de recuperaçã­o fiscal homologado. O plano permite que o estado volte a pagar, de forma escalonada, a dívida da União, cujo pagamento estava suspenso por liminar do Supremo Tribunal Federal desde julho de 2017. Em troca, o governo gaúcho deverá executar um programa de ajuste fiscal que prevê desestatiz­ações e reformas para reduzir os gastos locais.

Em maio de 2020, o STF autorizou o governo goiano a aderir ao pacote de recuperaçã­o fiscal em troca da adoção de um teto de gastos estadual. Em dezembro de 2021, Goiás assinou a adesão ao RRF, que permite a suspensão do pagamento de dívidas com a União em troca de um plano de ajuste de gastos.

Minas Gerais é único estado endividado que não aderiu ao RRF. Em julho de 2022, o ministro Nunes Marques, do STF, concedeu liminar que permite ao governo mineiro negociar um plano de ajuste com a União sem a necessidad­e de reformar a Constituiç­ão estadual. No mesmo mês, o Tesouro Nacional publicou uma portaria autorizand­o o governo de Minas a elaborar uma proposta que oficialize o ingresso no programa.

Atualmente, a Assembleia Legislativ­a analisa um projeto de lei do RRF estadual. Em novembro do ano passado, o governo concordou com a proposta do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de federaliza­r as estatais mineiras para pagar as dívidas do estado com a União. Em dezembro, Nunes Marques prorrogou a data-limite de adesão ao RRF para 20 de abril deste ano.

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DIOGO ZACARIAS / MF O Programa Juros por Educação foi apresentad­o durante reunião com os governador­es do Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais
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SEE-PE / Divulgação Estímulo à formação técnica é o maior objetivo do programa

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