Crianças expostas à violência das telas
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, precisamos prestar mais atenção à ameaça do cyberbullying em crianças e adolescentes
Desde o final do século 20, o admirável mundo das telas vem seduzindo as novas gerações, com a proliferação de celulares que deixaram de ser telefones para se transformar em dispositivos com múltiplas funções, incorporando aquelas que popularizaram os computadores. O mundo de imagens vivificadas nas redes sociais, ou da vida virtualizada nos jogos que permitem a interação de participantes distantes, anônimos ou conhecidos, hoje é parte do cotidiano de pré-adolescentes e adolescentes, tanto quanto seus pais e responsáveis estão conectados, para o trabalho ou por diversão. A ubiquidade da internet parece uma conquista civilizatória, um direito da cidadania no século 21, do qual não se pode abrir mão, e que deve ser democratizado para não seguir causando um tipo de desigualdade baseada na exclusão digital.
A ampliação dos horizontes e das perspectivas de comunicação é um fenômeno de nossa era, intrinsecamente bom, cujo valor positivo se destaca e se sobrepõe aos danos que porventura possa causar. No entanto, nos últimos anos, tem se ampliado a compreensão de que tais danos envolvem riscos de efeito imediato ou longo alcance no tempo. A exposição das crianças e adolescente às telas, por exemplo, durante horas a fio, sem o controle do que acessam e assistem e fazem, já se tem como um consenso, após diversos estudos e da percepção das famílias em casa e dos professores nas escolas – essa exposição prolongada e descontrolada faz mal, prejudica a formação cognitiva e o próprio desenvolvimento social de um indivíduo.
É nesse pano de fundo do comportamento tecnológico que a pesquisa da Organização Mundial de Saúde (OMS) sobre o cyberbullying traz informações alarmantes, mas coerentes com o que se tem visto como danoso. Em um levantamento em 44 países, abrangendo 279 mil adolescentes de 11 a 15 anos, um em cada seis afirmou ter sido vítima de assédio virtual em 2022 – passando por situações de ofensas, humilhação ou constrangimento. Para o diretor da OMS na Europa, Hans Kluge, o resultado é um alerta sobre o assédio e a violência que se esconde atrás das telas, mas trazem consequências para os jovens, de ordem psicológica, além do comprometimento das relações sociais.
A violência virtual entre colegas da mesma idade aumentou depois da pandemia, quando a convivência teve que ficar restrita ao distanciamento das telas. De lá para cá, com o costume e a permissão de passar até 6 horas online, em média, o risco de assédio também se elevou. A OMS recomenda mais monitoramento da exposição diária às interações virtuais, bem como solicita normas de regulação das redes sociais que sejam capazes de reduzir a vulnerabilidade das crianças e adolescentes. Para tanto, os agentes públicos devem assumir o papel de defesa da sociedade, no plano institucional, assim como aos pais, responsáveis, professores e gestores escolares cabe a avaliação dos riscos envolvidos, e o estabelecimento de limites claros, como prevenção ao bullying que vem do brilho da virtualidade.