Investigada por omissão, Prefeitura de Jaboatão tenta fazer ajustes no Transporte Complementar após atropelamento de fiéis
Cobrança por reestruturação é feita dias depois do atropelamento coletivo no bairro de Marcos Freire, pelo condutor do sistema de transporte que conduzia um veículo com problemas mecânicos
APrefeitura de Jaboatão dos Guararapes, no Grande Recife, começou a tentar fazer ajustes operacionais no Sistema de Transporte Complementar Municipal após o condutor de um dos micro-ônibus do serviço atropelar fiéis que participavam de uma procissão no Domingo de Páscoa. O atropelamento coletivo feriu 34 pessoas e provocou a morte de pelo menos cinco delas.
Nesta quarta-feira (3/4), a gestão municipal - que é responsável pelo controle do serviço de transporte público deu um basta na batalha judicial que se arrasta desde 2018 sobre a implantação da bilhetagem eletrônica do sistema. A prefeitura determinou que em 15 dias os permissionários do serviço contratem o Sistema de Bilhetagem Eletrônica Municipal, Monitoramento e Gestão.
E mais: que em 60 dias o sistema seja implantado nos 235 veículos que atualmente têm permissão para rodar, dos 283 cadastrados. Na última quarta-feira (27), a Prefeitura intermediou reunião na qual a categoria aprovou os novos termos contratuais junto às empresas selecionadas, Tacom e Kim+.
A implantação da bilhetagem e renovação da frota, inclusive, foram colocadas como condicionantes para que os permissionários mantenham as permissões de operação, segundo a prefeitura.
Vale lembrar que uma possível omissão da prefeitura no atropelamento coletivo está sendo investigada pelo MPPE.
BILHETAGEM ELETRÔNICA É FUNDAMENTAL E O MÍNIMO EM UM SISTEMA DE TRANSPORTE
A intensa batalha judicial entre os permissionários vinha adiando a implementação da medida, fundamental não só para a modernização do pagamento para os passageiros, mas, principalmente, por representar um controle de gestão administrativa e financeira da operação.
Também há vantagens para os permissionários, apesar de haver custos: a partir da bilhetagem, os permissionários passam a ter possibilidade de contratação de financiamento, devendo adquirir novos veículos.
A ausência do sistema no Transporte Complementar de Jaboatão é mais uma evidência do sucateamento do serviço municipal e da ausência de controle sobre ele de diversas gestões públicas.
“A reestruturação do Sistema de Transporte Complementar Municipal passa pela bilhetagem eletrônica. Além de dar mais economia, segurança e praticidade aos usuários, ela traz dados fundamentais para um melhor gerenciamento do serviço por parte do município e para que os permissionários possam comprovar renda e contratar financiamento para melhorias e renovação da frota”, destaca o prefeito de Jaboatão, Mano Medeiros.
E seguiu firme: “A implantação da bilhetagem e renovação de frota são condicionantes para que os permissionários mantenham suas permissões”, avisa.
O secretário-executivo de Ordem Pública e Mobilidade, Carlos Sá, explicou o motivo da batalha judicial. “Alguns dos permissionários são cooperados, outros não. Isso gerou um impasse entre eles na contratação do sistema, judicializado pela própria categoria. Com a recente liminar judicial, a aquisição da bilhetagem foi colocada em votação e aprovada pela maioria dos permissionários, devendo ser dada continuidade ao processo. O edital estabelece as regras para essa continuidade”, afirma.
A seleção da empresa e aquisição dos equipamentos é de responsabilidade dos permissionários, vale ressaltar.
ENTENDA O SISTEMA DE TRANSPORTE COMPLEMENTAR DE JABOATÃO
O Sistema de Transporte Complementar do Jaboatão tem 283 permissionários cadastrados, que cobrem 15 linhas municipais. Mas só 235 estão operando. Cada permissionário pode contratar seis operadores, sendo três motoristas e três cobradores. As informações são oficiais.
O regulamento estabelece uma circulação de 80% da frota, para que a frota reserva possa fazer as devidas manutenções e os operadores possam ter férias e folgas. Veículos com 10 anos ou mais precisam fazer, obrigatoriamente, pelo menos uma inspeção anual junto a órgão certificado pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia), que assegure as suas condições de funcionamento. Documentação de permissionários, operadores e veículos também precisam estar sempre regularizadas.
GARANTIA DE FISCALIZAÇÃO DO SISTEMA DE TRANSPORTE
A Secretaria de Ordem Pública e Mobilidade garante que faz inspeção anual e fiscalização rotineira do sistema, tendo retirado de circulação, só este ano, 15 micro-ônibus. “Aqueles que solucionam o problema verificado, como a falta de um equipamento obrigatório, comprovam o ajuste e podem voltar a circular. Se o problema não for resolvido, ele permanece fora da operação”, explica Carlos Sá.
No caso do veículo que atropelou os fiéis, o município garante que ele não estava em operação no dia, fazia parte da frota reserva. Mas tinha o laudo do Inmetro e todas as documentações em dia.
Os 24 micro-ônibus que fazem a linha Marcos Freire/barra de Jangada paralisaram o serviço após o atropelamento, alegando questões de segurança, já que havia denúncias de que a população iria tocar fogo nos veículos que retornassem ao bairro. A prefeitura garantiu estar agindo para a retomada do serviço.
MICRO-ÔNIBUS ENVOLVIDO NO ATROPELAMENTO TEM DEZ ANOS DE USO E ESTAVA COM PROBLEMAS MECÂNICOS
O micro-ônibus que ficou desgovernado e, sob condução do motorista, atropelou fiéis em uma procissão em Jaboatão dos Guararapes é um veículo velho, com dez anos de uso, e que estava com problemas mecânicos sérios.
A idade veícular do micro-ônibus foi confirmada pela própria Prefeitura de Jaboatão dos Guararapes, que garantiu, ao mesmo tempo, que, apesar dos anos de operação transportando pessoas, o veículo estava em dia com as regras exigidas pelo município. Tinha o laudo da inspeção técnica veicular do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), realizada há cinco meses e com validade anual.
Mas denúncias feitas por passageiros que utilizam a linha 118 - Marcos
Freire/barra de Jangada revelam que o micro-ônibus estava com problemas mecânicos graves, como a falta de freios, e que seguia para a garagem quando aconteceu o sinistro de trânsito.
MICRO-ÔNIBUS SEGUIA PARA A GARAGEM DEVIDO AOS PROBLEMAS
Segundo a denúncia, cujo áudio foi divulgado por familiares das vítimas durante protesto por mais fiscalização do Sistema de Transporte Municipal de Jaboatão dos Guararapes, realizado na manhã desta segunda-feira (01/4), o micro-ônibus já tinha sido colocado para rodar “no tranco”, como se diz popularmente o ato de empurrar o veículo para ligar, e estava apenas com o freio dianteiro. Seguiria para a garagem para passar por reparos.
“O carro estava travado e foram destravá-lo no terminal para que conseguisse chegar na garagem. Ele estava só com o freio dianteiro, que foi enchido de ar para que conseguisse chegar na garagem. Botaram para rodar no tranco e mandaram ir para a garagem. Ele (o motorista) saiu atrás da procissão e ficou em cima da ladeira esperando. Mas quando ele desceu, o freio não funcionou. O carro baixou o balão de vez e ficou sem freio”, diz o áudio.
VEÍCULO NÃO CONSEGUE SER LIGADO E ATRASA PERÍCIA
A situação mecânica do micro-ônibus envolvido no atropelamento é tão grave que dois dias depois do sinistro a perícia técnica não conseguiu ligar o veículo, atrasando a realização completa da perícia.
Por nota, a Secretaria de Defesa Social (SDS) informou que o resultado dos exames periciais, realizados pela equipe do Instituto de Criminalística (IC), tem prazo de até 30 dias para conclusão, podendo ser prorrogado, se necessário. E que o resultado será encaminhado à Polícia Civil, que investiga o caso.