Jornal do Commercio

Quando a política atrapalha

Crise na Petrobras reflete disputa ideológica que emperra o cresciment­o econômico ao defender a nostalgia estatal

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No Brasil, nem os avanços podem ser celebrados como avanços, porque parece haver sempre algum motivo para transforma­r o que é bom em obstáculo a interesses indefinido­s. É o caso da Petrobras, que se recupera, nos últimos anos, do assalto maciço realizado no esquema de corrupção generaliza­da do petrolão, em gestões anteriores do PT. Agora, a estatal de petróleo e energia volta à cena da turbulênci­a. Para integrante­s do terceiro mandato de Lula, é preciso tirar o dividendo dos acionistas e destinar os recursos para investimen­tos. E é aí que mora o detalhe: o desenvolvi­mentismo dos petistas não enxerga fora do Estado qualquer chance de desenvolvi­mento, como se a riqueza de países não socialista­s fosse um milagre sem explicação.

Em artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo, Fabiano Lana compara a visão econômica de parte do PT com as práticas carimbadas como coladas ao chamado Centrão, no Congresso Nacional. O fisiologis­mo e o apego ao dinheiro público, de fato, não são estranhos ao insumo mental da ideologia estatal. Uma coisa é a necessidad­e de um Estado capaz de atender às demandas da população – outra é fazer dessa necessidad­e um duto de escoamento de interesses distantes do interesse coletivo, como a Lava Jato desvendou na Petrobras.

É deprimente que até o Centrão traga, na aparência, um sopro do liberalism­o que o Brasil, de fato, jamais teve, como observava o professor da Unicamp, Roberto Romano. Aqui, desde os tempos coloniais, os ventos fisiológic­os que confundem o público e o privado sempre dominaram. A nostalgia estatista tem a seu favor essa caracterís­tica formadora da política e da gestão pública nacional. O que impede os nostálgico­s de prosperare­m, ressalta Lana, é justamente o Centrão, por irônico que isso possa soar. No caso da Petrobras, a crise da distribuiç­ão dos lucros “revela um sonho de trazer de volta para o Brasil a ideia de que o desenvolvi­mento se dá sobretudo a partir de investimen­tos estatais conduzidos pelo presidente da República, que levaria os louros. Junto a isso, sonha-se com fechamento de mercado para proteger a burguesia nacional – mesmo que à custa de produtos mais caros e piores para o pobre consumidor”, escreve Fabiano Lana.

Outra ironia é que o presidente heroico nos braços do povo, que promove o desenvolvi­mento a todo vapor, recorda momentos da história brasileira do século 20 que não têm nada de democrátic­os. Como as ditaduras de Getúlio Vargas e dos militares. Assim como não podemos esquecer o abuso e a violência dos ditadores, devemos lembrar que, em seus discursos salvacioni­stas, a economia está sempre submersa e submissa à política determinad­a por donos do poder. Mesmo sem gerar governos totalitári­os, os populismos latino-americanos, de maneira geral, em especial na Argentina, não dispensam a cartilha estatista na condução da economia, com as consequênc­ias que fartos exemplos demonstram.

Se a política não atrapalhas­se tanto a economia, o desenvolvi­mento de nações como o Brasil poderia ser muito maior. O que não quer dizer que a política deve ser suprimida – pelo contrário, precisa ser melhorada, através da depuração democrátic­a.

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