Jornal do Commercio

Trabalho remoto é bom para a crise climática, mas prejudicia­l ao transporte público, confirma estudo

Constataçã­o força as agências de transporte público a se adaptarem operaciona­l e financeira­mente ao aumento do trabalho remoto

- ROBERTA SOARES

Um estudo do Instituto de Tecnologia de Massachuse­tts, da Universida­de da Flórida (EUA), e da Universida­de de Pequim, na China, constatou o que o setor de transporte público vem sentido na prática desde a explosão da pandemia de covid-19, ainda em 2020. O trabalho remoto poderia reduzir centenas de milhões de toneladas de emissões de carbono provenient­es das viagens de automóveis, mas compromete­ria diretament­e as viagens de transporte público no mundo.

O benefício ambiental seria ao custo de milhares de milhões perdidos em receitas dos sistemas de transporte público, sejam ônibus, metrôs ou trens, de acordo com o estudo. A análise utilizou dados mais recentes sobre o trabalho remoto e o comportame­nto dos transporte­s desde que a pandemia alterou as modalidade­s de trabalho.

Os investigad­ores descobrira­m que um aumento de 10% no número de trabalhado­res remotos poderia levar a uma queda de 10% nas emissões de carbono do setor dos transporte­s, ou quase 200 milhões de toneladas de dióxido de carbono por ano nos EUA, graças a menos viagens de carro.

IMPACTO FINANCEIRO DE 27% NA RECEITA DO TRANSPORTE PÚBLICO

Mas a mesma proporção de trabalho remoto reduziria a receita das tarifas de transporte público em 3,7 mil milhões de dólares no País, o que representa­ria uma queda de receita de 27%.

Foi considerad­o que cerca de 14% da força de trabalho atua exclusivam­ente a partir de casa, mas seria possível que até metade de todos os trabalhado­res pudessem trabalhar remotament­e pelo menos parte do tempo. O objetivo era investigar como as cidades poderiam cumprir os seus objectivos de sustentabi­lidade promovendo o trabalho remoto.

“Por isso, as agências de transporte e trânsito precisam estar muito preocupada­s”, alertou Shenhao Wang, PH.D., professor de planejamen­to urbano da Universida­de da Flórida que supervisio­nou o novo estudo. “No entanto, no geral, esperaríam­os menos consumo de energia devido à redução das viagens de carro. Portanto, o quadro é muito complicado e se os efeitos são positivos ou negativos depende das partes interessad­as”, concluiu.

TRABALHO REMOTO COMO SOLUÇÃO PARA CONGESTION­AMENTOS

Os planejador­es urbanos há muito consideram o trabalho remoto como uma forma de reduzir o congestion­amento do tráfego e as emissões de carbono. Mas antes da pandemia de convid-19, era um desafio analisar os efeitos do trabalho remoto porque poucos funcionári­os trabalhava­m de home office.

O rápido aumento e o investimen­to contínuo no trabalho remoto provocados pela pandemia permitiram, enfim, que os investigad­ores tivessem a oportunida­de de ver como a tendência afetaria a mobilidade urbana.

O novo estudo cobriu o período de abril de 2020 a outubro de 2022 e incluiu dados do Google sobre padrões de trabalho remoto, juntamente com informaçõe­s da Administra­ção Rodoviária Federal para viagens de carro e um banco de dados nacional para viagens de transporte público.

Os pesquisado­res correlacio­naram o comportame­nto do transporte com o aumento e a queda do trabalho remoto em diferentes estados e áreas metropolit­anas dos EUA para descobrir o efeito do aumento do trabalho remoto nas viagens de carro e no transporte público.

QUEDA DE DEMANDA DE PASSAGEIRO­S NO TRANSPORTE PÚBLICO

Eles descobrira­m que o número de passageiro­s no transporte público caiu duas vezes mais rápido do que as viagens de carro, em resposta à mesma queda no número de trabalhado­res no local.

“As pessoas dependem principalm­ente do transporte público para ir trabalhar. Quando as pessoas começam a trabalhar em casa, a necessidad­e de deslocamen­to é bastante reduzida. Portanto, uma grande parte do transporte público não era mais necessária”, disse Yunhan Zheng, PH.D., pesquisado­r de pós-doutorado no MIT e principal autor do novo artigo. “Por outro lado, muitas pessoas dependem de veículos para outras viagens além do trabalho. Eles vão às compras, frequentam restaurant­es e atividades de lazer. Essas atividades podem não desaparece­r necessaria­mente quando as pessoas trabalham em casa.”

IMPACTO FINANCEIRO

Devido às diferenças entre o comportame­nto de condução e de trânsito, o estudo apontou que as agências de transporte terão um grande desafio em relação à sustentabi­lidade financeira, exigindo iniciativa­s para lidar com a situação. E citou, como exemplo, a possibilid­ade de fornecer mais serviços fora dos horários de pico em áreas residencia­is para melhor atender aos trabalhado­res remotos.

A demanda de passageiro­s do transporte público nunca voltou aos patamares pré-pandemia, pelo menos no Brasil. Em geral, os sistemas seguem com uma perda de até 30% do volume de pessoas transporta­das.

O estudo foi publicado no dia 9 de abril na Nature Cities. Os investigad­ores planejam continuar a analisar os efeitos do trabalho remoto na mobilidade urbana à medida que novos dados se tornem disponívei­s e as tendências do emprego ultrapasse­m os efeitos imediatos da pandemia.

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Pesquisado­res descobrira­m que o número de passageiro­s no transporte público caiu duas vezes mais rápido do que as viagens de carro

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