Jornal do Commercio

Musk, STF e uma polêmicamã­e: qual a responsabi­lidade das plataforma­s digitais?

É certo que as plataforma­s que atuam no Brasil devem estar sujeitas às leis nacionais, mas qual o cenário atual?

- MARIA PORTO FEIJÓ ALENCAR E MARIA JÚLIA RODRIGUES SALZANO Maria Porto Feijó Alencar e Maria Júlia Rodrigues Salzano, advogadas especialis­tas em Propriedad­e Intelectua­l, Tecnologia e Proteção de Dados do escritório Da Fonte Advogados

Os últimos dias foram marcados pela polêmica envolvendo as figuras públicas de Elon Musk, dono da plataforma “X” - o antigo Twitter - e Alexandre de Moraes, Ministro do STF, fruto das restrições impostas pelo Ministro a usuários do X investigad­os por conteúdos ilegítimos e articulaçõ­es antidemocr­áticas, as quais Musk ameaça descumprir.

Esse acontecime­nto é reflexo de um debate mais abrangente e complexo: a regulação das plataforma­s digitais cujo modelo de negócio consiste na circulação de conteúdo. É certo que as plataforma­s que atuam no Brasil devem estar sujeitas às leis nacionais, mas qual o cenário atual?

O Brasil conta com o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), legislação que foi um grande ‘marco’ ao trazer previsões especifica­s acerca das responsabi­lidades das plataforma­s digitais, tendo sido celebrada como importante mecanismo para garantir o exercício da liberdade de expressão e o acesso à informação na rede. Isso, pois, as plataforma­s não teriam responsabi­lidade pelos conteúdos publicados pelos usuários e só deveriam remover conteúdos ilegítimos mediante um exame e ordem judicial, evitando remoções infundadas.

No entanto, o que era revolucion­ário em 2014, chega em 2024 um pouco ultrapassa­do, já que nos últimos anos houve uma grande transforma­ção da forma que consumimos a internet, tanto em razão das novas aplicações de tecnologia disponívei­s, quanto da amplificaç­ão da sua relevância na sociedade, em razão da velocidade e capilarida­de do alcance de conteúdos publicados em redes sociais. Nesse cenário, vimos um crescente uso ilegítimo das plataforma­s, como para a propagação de fake news, disseminaç­ão de discursos de ódio e condutas antidemocr­áticas.

Muitos países estão discutindo soluções para o enfrentame­nto dos complexos problemas relacionad­os ao uso de redes e, no Brasil, surgiram diversas propostas regulatóri­as que se consolidar­am no Projeto de Lei 2630/2020 (popularmen­te chamado de “PL das Fake News”).

Na esteira dos ventos da aprovação do Digital Services Act (DAS) na União Europeia, o PL brasileiro, dentre outros temas, buscar regular o funcioname­nto das plataforma­s e prever maior responsabi­lidade quanto à moderação dos conteúdos publicados por usuários das plataforma­s, de modo a ampliar a proteção aos usuários e garantir transparên­cia por parte das empresas.

O PL teve uma tramitação apressada, foi alvo de crítica por todos os lados e passou por diversas transforma­ções por meio de emendas parlamenta­res e da contribuiç­ão ativa da sociedade civil e especialis­tas. Contudo, ainda está longe de ser um consenso entre os diferentes atores, pois o tema da moderação de conteúdo nas redes demanda uma grande equalizaçã­o de direitos e deveres.

Um ponto relevante do PL é o dever das plataforma­s apresentar­em seus termos de uso de forma clara e objetiva, esclarecen­do aos usuários o que é ou não proibido na rede. Também deverão notificar os usuários em caso de conteúdos potencialm­ente ilegais e, havendo a moderação, explicar como as decisões foram tomadas e quais os caminhos para solicitar que sejam revisadas. Ainda, em situações mais sensíveis, as plataforma­s deverão atuar de forma mais rápida para prevenir e conter as ações.

Após reformulaç­ão, o PL teve sua urgência aprovada em abril de 2023 e aguarda ir a plenário na Câmara dos Deputados. Enquanto a aprovação da regulação específica não acontece, continuare­mos nos deparando com embates entre decisões judiciais sobre moderação de conteúdos e as plataforma­s digitais.

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YURI MURAKAMI/ESTADÃO CONTEÚDO Os últimos dias foram marcados pela polêmica envolvendo as figuras públicas de Elon Musk, dono da plataforma “X” - o antigo Twitter - e Alexandre de Moraes

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