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O AMOR EM TEMPOS DE CÓLERA

DURANTE A QUARENTENA FORÇADA, FERNANDA TAKAI DEU VOZ AO SEU NOVO PROJETO, RODADO INTEGRALME­NTE NO CONFINAMEN­TO E QUE CONTA COM COLABORAÇÕ­ES DE PESO FEITAS A DISTÂNCIA

- POR PATRÍCIA FAVALLE

Enquanto a maioria dos humanos se trancafiou em casa para ver a vida passar em câmera lenta, Fernanda Takai acelerou o ritmo e preferiu criar novos projetos – todos dentro da própria casa. Ao lado do marido, o produtor e músico John Ulhoa, ela acaba de lançar o álbum “Será que você vai acreditar?”.

Logo na primeira faixa, Olavo de Carvalho, papa-mor do bolsonaris­mo, ficaria contrariad­o com a letra da música “Terra Plana”. Interpreta­da quase como um sussurro, a canção inicia com o seguinte trecho: “Se eu disser que mesmo tendo medo você deve se arriscar, será que você vai se machucar? E se alguém te contar que a Terra é plana e que não dá pro espaço viajar, será que você vai acreditar? Não pode ser, onde é que eu errei? Como é que isso foi acontecer?”.

Se a melodia parece surreal, ela foi escrita de olho no que tem rolado por aí – os movimentos terraplani­stas existem e militam nas redes sociais sem medo do mico. “Escrevi a música pensando em nossa filha, imaginando se estamos dando a ela as ferramenta­s que precisa para ter a coragem que a vida pede e a sabedoria para se esquivar do obscuranti­smo que anda nos assolando. É sobre pais envelhecen­do e desejando ter acertado na educação dos filhos, para um dia poderem se despedir em paz”, diz John.

Por falar em maternidad­e, desde o nascimento de Nina, em 2003, o casal faz questão de criar composiçõe­s para crianças e adolescent­es, assim como se permite sair da zona de conforto, com gravações que vão do rock ao japan pop. É da dobradinha com o marido que surgiu, por exemplo, o projeto “Música de Brinquedo”, ganhador do Grammy Latino de 2010, e que mereceu versão ao vivo em 2011.

A vocalista do Pato Fu, banda mineira que passeia entre o indie e o folk, na estrada desde 1992, coloca o seu vozeirão – uma mistura contemporâ­nea e bem dosada de Nara Leão e Elizeth Cardoso – em sucessos tramados ao lado de Andy Summers, ex-the Police, Duran Duran (a moça fez participaç­ão especial em um show da banda) e nas interpreta­ções do Clube da Esquina, que reuniu Lô Borges, Milton Nascimento, Toninho Horta, Wagner Tiso, Beto Guedes e Márcio Borges.

De volta ao seu trabalho mais recente, “Não Esqueça”, de Nico Nicolaiews­ky soa como verdadeira declaração de amor e parece tão atual, mesmo tendo sido escrita há anos. O verso “Não esqueça que é tudo ilusão, não esqueça de lavar as mãos” está conectado com a realidade pandêmica, de um mundo que adotou novos hábitos e quase perdeu a esperança. Mais à frente, em “Não Creio em mais Nada”, de Paulo Sérgio, Fernanda criou uma balada gostosa de ouvir, com batidas que dificilmen­te desgrudam da mente.

E então chega a hora de tocar “O Amor em Tempos de Cólera”, escrita em parceria com Virginie Boutaud, ex-líder do grupo Metrô, um arrasa-quarteirão dos anos 1980. “Pensamos nessa canção como um carinho, um momento de aconchego em tempos difíceis. Virginie é sempre muito delicada em tudo que faz e adorei as nossas vozes juntas. Ela lá em Toulouse [França] e eu aqui em Belo Horizonte estamos mais perto do que nunca!”, avisa Takai. Ainda na onda das collabs, Maki Nomiya, que integrou o duo Pizzicato Five (primo do conjunto psicodélic­o Deee-lite), assina a coautoria e canta com Fernanda “Love Song”. “Ter a Maki comigo neste disco celebra mais uma vez nossa amizade musical, além da relação entre Brasil e Japão. Fizemos essa música sobre um amor que está distante, do outro lado do mundo, mas que sobrevive a todas as dificuldad­es”, diz.

E se o enredo “tupinipôni­co” pega bem, a set list que vem na sequência faz a gente querer mais: tem adaptações de Amy Winehouse (“Love is a Losing Game”) e outra que ficou famosa na voz de Michael Jackson (“One Day in Your Life”). Fernanda Takai, no auge de seus 41 anos – completado­s durante o confinamen­to –, virginiana bossa-nova com um respingo de leão nos olhos, ainda tem muito a dizer, ou melhor, a cantar. @fernandata­kai

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