BELEZA ENGAJADA
VIVEMOS NUM MUNDO EM QUE OS COSMÉTICOS DE FORMULAÇÕES MAIS LIMPAS E LIVRES DE CRUELDADE ANIMAL ENTRAM NO SELECT DOS ITENS DESEJADOS, ACEITOS E CONSUMIDOS
Carlos Ferreirinha, especialista em mercado de luxo, já dizia que um dos pilares mais importantes para as empresas prosperarem era o da sustentabilidade. A fala de um dos mais respeitados profissionais desse ramo aconteceu na 6ª edição do Fórum MCF, em outubro de 2019. Ele frisou que isso deveria, inclusive, ultrapassar o marketing, fazendo parte do coração e dos valores das corporações. Naquele momento não havia pandemia. Os índices de queimadas, globalmente, não eram uma pauta que pegava no calcanhar de Aquiles da audiência, como veio a acontecer tempos depois na Austrália, na Califórnia e no Pantanal.
O expert estava certo. O consumidor caminha com uma avalanche de informações sobre o meio ambiente e a crescente percepção de que o clima do mundo mudou. É cada vez mais compreensível notar o consumo menos desvairado e pautado principalmente em ideais. Se as pessoas ainda não ponderam de forma coletiva, elas pensam no próprio corpo. Se não entendem as duas premissas anteriores, levam em conta o que vão sofrer as gerações futuras.
Uma das pressões mais significativas dentro de tal esteira comportamental acerta em cheio o mercado de bens de beleza e higiene pessoal.
SAINDO DO PAPEL
Dez anos atrás era muito difícil saber se um produto era vegano ou livre de componentes controversos, como parabenos e petrolatos. Hoje, da marca com valores convidativos, como Dailus, Hinode ou Salon Line, até casas de grande luxo, a exemplo da Sisley e seus ativos botânicos, ou da Shiseido e sua linha clean
WASO, é possível chegar mais perto do conceito do green beauty.
Apesar de tais termos – clean ou green – não terem uma regulamentação global unificada, dando margem a equívocos ou jogadas de marketing conhecidas como “greenwashing” (quando a empresa só quer parecer limpa, mas não é), é notório que boa parte da indústria da beleza está levando a sério uma produção mais limpa para o planeta e para o corpo. E isso se deu graças à pressão do consumidor.
Com tamanho interesse a respeito do tema, a empresa cosmética Biossance agora lança uma espécie de escola de clean beauty para educar os consumidores sobre os “do and don’ts” da beleza mais natural, chamada “The Clean Academy”. Eles também popularizaram no Brasil o uso do esqualano vegetal, extraído da cana-de-açúcar e não mais da exploração predatória do tubarão.
Para a empresária Patricia Lima, fundadora da marca Simple Organic, a beleza limpa, livre de sintéticos, gera muitos benefícios para o meio ambiente e para a saúde. “O esforço da beleza natural é para neutralizar e minimizar todo esse impacto ambiental. Ou seja, vai desde os compostos do produto até o descarte de sua embalagem”, explica. A última iniciativa da marca brasileira pelo caminho da sustentabilidade foi apoiar o podcast “O Tempo Virou”, que leva informação ao público de como os pequenos atos podem ajudar a cuidar do planeta, capitaneado por Giovanna Nader, consultora sustentável.
Destacamos, a seguir, outras iniciativas no mesmo caminho:
GRANDES AMIGOS
As abelhas podem visitar cerca de sete mil flores por dia, atuando como agentes fundamentais para o equilíbrio dos ecossistemas e garantindo a segurança alimentar do nosso planeta. Por causa do uso abusivo de agrotóxicos e das mudanças climáticas, elas estão em risco. A taxa de mortalidade desses insetos, atualmente, é de 30%. As taxas normais de mortalidade para um ecossistema saudável são estimadas em 5%.
A Guerlain, gigante francesa de beleza dentro do segmento de luxo, tem reconhecimento internacional por seu compromisso com a preservação das abelhas, criaturas tão necessárias para o equilíbrio do meio ambiente, através da polinização e da reprodução de espécies vegetais. A empresa é investidora da Associação de Abelhas Britânicas, na Ilha de Ouessant, desde 2011, dando suporte financeiro para pesquisa e comunicação.
Desde 2015, também é parceira do Observatório Francês de Abelhas, responsável por desenvolver estoques de colmeias em toda a Europa e promover a profissão de apicultor. Entre outras iniciativas, em 2020, a grife lançou uma parceria com a Unesco-mab para promover treinamento a apicultores, além de medir os benefícios da polinização nas reservas da biosfera.
CERTIFICADO
Além do luxo, o Grupo O Boticário lançou, em meados de outubro, a linha Nativa SPA Orgânico. Ela possui o certificado ECOCERT, um dos organismos de inspeção para produtos ecologicamente corretos mais respeitados do mundo, fundado na França e presente em mais de cem países.
A novidade conta com itens para o corpo e o cabelo. Eles são armazenados em embalagens feitas de PETS 100% recicladas, ingredientes orgânicos, veganos e naturais. “A beleza sustentável era um assunto para poucos. Agora não. É possível consumi-la e também saber o que é real ou não de forma muito mais fácil. Ela não é um fim, mas uma jornada”, diz Chiara Gadaleta, embaixadora da ONU Pacto Global e consultora em sustentabilidade.
NOS OCEANOS
Ainda na trilha das grandes empresas, a Natura lançou Kaiak Oceano, uma fragrância que convida para um novo olhar ao cuidado com os oceanos. Cerca de 50% da maior peça plástica que compõe a embalagem do produto, chamada de ombro, é feita de plástico reciclado. Além disso, 8% do material vem do litoral brasileiro, coletado por cooperativas de reciclagem que lutam para que o lixo não chegue ao mar. O restante é plástico retirado de aterros sanitários. Já 30% do vidro do produto é reciclado, e o filme plástico que envolve o cartucho do perfume foi totalmente eliminado. Com a iniciativa, cerca de seis toneladas de plástico reciclado serão utilizadas – o que equivale a três milhões de tampas de garrafas d’água.
A TRILHA LIMPA
Mas como consumir produtos mais limpos e seguros para o corpo e para o meio ambiente?
Privilegie cosméticos que usam óleos essenciais para perfumar – e não fragrâncias sintéticas;
Descubra se os produtos têm selos como ECOCERT, Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento ou The Leaping Bunny;
Leia o rótulo. Aprenda a descobrir se os seus cosméticos possuem petrolato na composição. A substância pode não ter ainda um consenso científico sobre fazer mal para a saúde, mas faz muito mal para a vida marinha e para os ecossistemas;
Prefira produtos em refil, embalagens recicladas ou recicláveis e que têm constituição sustentável, como xampus e condicionadores em barras. Novos ingredientes naturais que dispensam embalagens foram destaque no evento de beleza “in-cosmetics virtual”, realizado este ano. Um deles foi o Simplysolid™, da Aprinnova. Ele é um ingrediente de formato sólido para a elaboração de produtos para a pele, corpo, desodorantes, entre outros. Não necessita de plástico para ser comercializado;
O consumo da beleza sustentável é um campo de leitura constante. Busque informações científicas sobre o que impacta mais ou menos no ecossistema. Por exemplo, não consuma esfoliantes ou cremes dentais que tenham partículas plásticas em sua composição. Eles são grandes vilões da poluição das águas.
Utilize o SAC e as redes sociais das empresas que você consome para perguntar se elas possuem políticas de reciclagem e se são empresas livres de crueldade animal. Caso ainda não sejam, peça para que se tornem. A pressão do consumidor é o maior “estímulo” para o mercado da beleza.
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