Movimentação interna
Abraçando a urgência da questão antirracista, a NYFW abre espaço para segmento exclusivo de estilistas pretos.
Enquanto as temporadas internacionais seguem se adaptando a um mundo ainda em quarentena, a semana de moda de Nova York se mexe para ressignificar o papel dos eventos de apresentação de coleções para o século 21. Abrindo a temporada de inverno 2021, em fevereiro, o evento fez parte do que o CFDA (o conselho de estilistas da América) agora chama de American Collections Calendar. Ou seja, o foco não está mais totalmente nos desfiles que acontecem em Nova York, mas também abriga estilistas americanos que se apresentam em dias fora do calendário oficial ou até em outras cidades. Um movimento que serve não só para reforçar o soft power da moda criada pelos EUA, mas dar maior peso paralelo à NYFW, esvaziada de seus principais nomes midiáticos.
Porém é outra iniciativa, ainda mais essencial, que chamou atenção nesta temporada: o segmento dedicado exclusivamente à moda de criadores pretos. Em parceria com o Black in Fashion Council (BIFC), a semana abriu espaço especial para 16 novos nomes, entre estilistas e designers de acessórios, que fizeram apresentações especiais e montaram um coeltivo de vendas.
Entre os selecionados estão Christopher John Rogers, que vestiu a vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, na posse; o coletivo Studio 189, que tem entre suas fundadoras a atriz Rosario Dawson e atua com comunidades de trabalho manual espalhadas pela África – especialmente na capital de Gana; a Teophilio, do expert em cores Edvin Thompson, que produz moda contemporânea com símbolos tradicionais da sua Jamaica natal; e a novíssima Kendra Duplantier, que já ganhou a bênção de Beyoncé.
Criado em meados de 2020, em paralelo aos protestos do movimento Black Lives Matter nos EUA, o BIFC é uma plataforma de discussão horizontal no cenário de lá. Quem encabeça é a jornalista Lindsay Peoples Wagner, ao lado da relações-públicas Sandrine Charles. A dupla se propõe a ajudar a operacionalizar a representatividade preta na indústria em geral, trazendo para perto grandes empresas, da Farfetch à L’oréal, que se comprometeram a fazer mudanças estruturais em seus negócios. Um relatório de “índice de igualdade” deve ser divulgado em julho, mostrando o resultado deste primeiro ano de trabalho.
O BIFC não é uma expressão isolada. Em maio de 2020, o Brasil viu nascer a Célula Preta, coletivo militante de estilistas que fazem parte da Casa de Criadores e têm debatido questões raciais internas, além de criar uma rede de apoio essencial a profissionais criativos no mercado. Agora, em 2021, foi lançado o projeto Sankofa, filhote direto do movimento Pretos na Moda mais o grupo VAMO, que se propõe a incluir oito marcas racializadas no calendário do SPFW, em abril. Tanto cá quanto lá, novos ares que devem trazer mudanças necessárias.