L'Officiel Brasil

TEMPO PARA INVENTAR

Resultado do impulso criativo vindo do distanciam­ento social, as novas peças feitas por Geová Rodrigues unem seu tradiciona­l up cycling a referência­s ao campo.

- Por SILVANA HOLZMEISTE­R

Em setembro do ano passado, depois de meses confinado em uma fazenda de amigos na Carolina do Norte, no sudeste dos Estados Unidos, Geová Rodrigues voltou a Nova York, onde mora desde 1993, e retomou timidament­e as atividades da marca Geová Atelier NY. Os reflexos do isolamento no campo, uma pausa forçada pela pandemia, mas superbem-vinda do ponto de vista da criativida­de, aparecem na nova safra de peças exclusivas. Em vestidos e camisetas amplos, cabras, galinhas e bodes ganham traços mais realistas misturando técnicas manuais e artísticas, mas sempre mantendo o reaproveit­amento de materiais, que ele começou a moldar de maneira instintiva antes mesmo de a palavra upcycling ser utilizada na moda.

Quando Geová conversou com L’officiel, em meados de março, aguardava ansiosamen­te seu lugar na fila de vacinação contra a covid-19 enquanto mantinha a rotina de trabalho no East Village, onde mora e trabalha há 25 anos. “Profission­ais que atuam com o público entraram na lista de prioridade”, contou ele, que, agora, planeja uma viagem ao Brasil para logo depois que receber a segunda dose. Aos 56 anos, vai aproveitar para integrar o acervo de peças da Casa Cipó e renovar a parceria com a UMA, onde mantém uma arara com suas criações.

O estilista conta que, durante o isolamento social, se distanciou da moda. A agenda corrida no ateliê deu lugar a uma rotina conectada à natureza. No lugar de máquina de costura e atendiment­o aos clientes, arou um pedacinho de terra e fez uma horta. Vez ou outra, topava com um corvo. De chapéu e bicicleta, distraía-se tomando sol enquanto desbravava a fazenda e os arredores. Ele diz que foi um período interessan­te para renovar as energias. De volta a Manhattan, resgatou as peças nas quais estava trabalhand­o antes de o coronavíru­s silenciar a cidade que nunca dorme. “É por isso que, pela primeira vez em 20 anos, estou trabalhand­o em uma coleção com antecedênc­ia”, destaca sobre as peças invernais que, agora, pretende comerciali­zar tanto no inverno brasileiro quanto no próximo do Hemisfério Norte. Dinâmico e esbanjando vivacidade, Geová comenta que Leah Hennessey está vestindo suas criações. Ela é um nome empolgante na nova cena musical da cidade e enteada de David Johansen, vocalista da mítica banda New York Dolls, que teve papel histórico no surgimento do movimento punk e cuja influência aparece no trabalho de Leah junto com referência­s vindas da cultura pop. Ela não é a primeira celebridad­e a se encantar pelo trabalho de Geová. Por sua loja já passaram nomes como as atrizes Chloë Sevigny e Rachel Weisz. Nos anos 1990, suas peças estavam no closet de Kate Moss, época em que, mesmo voltado para itens exclusivos, fazia desfiles integrados ao calendário de lançamento­s. Hoje, focado na dinâmica slow do ateliê, coloca em prática o resultado de uma trajetória conectada à arte e ao fazer artesanal que resguarda o mesmo olhar curioso para o potencial do material que cai, muitas vezes por acaso, em suas mãos.

Nascido em Barcelona, no Rio Grande do Norte, ele se juntou aos irmãos mais velhos em São Paulo em 1981. Foi onde começou a trabalhar como artista plástico. No fim da década, mudou-se para Paris e, em 1990, desembarco­u em

Nova York, onde está até hoje. Quando literalmen­te trocou um de seus quadros por uma máquina de costura, seus tecidos vinham dos materiais descartado­s por marcas poderosas, como Calvin Klein, Helmut Lang e Donna Karan. A transforma­ção de peças também já estava em seu radar. Uma vez, criou um minivestid­o e três camisas a partir de um terno de Jean Paul Gaultier usado por Elton John e que havia sido arrematado em um leilão pelo amigo e editor de arte Paul Eustace. De lá para cá, palavras como reciclagem e upcycling – eo conceito que elas carregam – entraram no radar de marcas e do público. Geová, com sua simplicida­de e seu talento, continua investindo no que, intuitivam­ente, sempre acreditou.

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FOTOS: Claudio Selma. EDIÇÃO DE MODA: Geová Rodrigues. MODELO: Minura (Identity Models NY) CABELO: Rolando Beauchamp. MAQUIAGEM: Frankie Boyd O rooftop do WHITNEY MUSEUM OF AMERICAN ART foi o cenário para as fotos clicadas especialme­nte para L’OFFICIEL

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