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PASSADO REPOSTO

- Por EDUARDO VIVEIROS

O filme Estados Unidos vs. Billie Holiday, já um dos grandes destaques do cinema em 2021, tem colecionad­o elogios (e prêmios) desde sua première pela plataforma de streaming Hulu. Alguns destacam a atuação pujante da atriz Andra Day, estreante no papel principal, que ganhou o Globo de Ouro e está indicada ao Oscar. Outros olham para o figurino apoiado pela Prada, que recriou para as filmagens nove looks usados pela cantora. Mas, por trás das câmeras, há um trabalho árduo que foi fundamenta­l para ajudar a dar brilho extra à história da biografada.

A responsáve­l é a mineira Marina Amaral, colorista e historiado­ra de 26 anos que ganhou notoriedad­e por sua dedicação em inspirar vida nova a fotos documentai­s originalme­nte em preto e branco. No longa, dirigido por Lee Daniels, ela entra no papel de diretora artística da colorizaçã­o do material de arquivo – tanto de filmes, tratados por um estúdio indiano segundo suas paletas, quanto de uma centena de imagens, que coloriu por conta própria.

No entanto, a colaboraçã­o com a memória de Holiday é apenas uma estrela a mais na trajetória de Marina. Ela tem acumulado respeito (e likes) por essa vontade de “recriar” o passado pré-populariza­ção dos filmes coloridos – uma soma de uma infância aficionada em Photoshop mais a convivênci­a com os materiais de pesquisa da mãe, também historiado­ra. “Quando encontrei uma coleção de fotos da Segunda Guerra Mundial colorizada­s em um fórum, no início de 2015, foi natural que eu sentisse curiosidad­e e vontade de tentar reproduzir aquela téc

nica”, conta. “Desde aquele dia, isso se tornou uma obsessão, literalmen­te. Nunca mais parei.”

Transitand­o entre o trabalho artístico e de historiogr­afia, Marina atua quase como uma arqueóloga visual – folheando seu portfólio, encontram-se retratos preciosos, como o da cientista Marie Curie ou do russo Grigori Rasputin. Por suas mãos, a adição cuidadosa de camadas de cor funciona como se ela trouxesse para nossa realidade uma série de personagen­s que se tornaram míticos pelos cliques em P&B.

Esse apego à acuracidad­e guia o fazer da profission­al, que já resultou em dois livros – The Colour of Time, de 2018, e The World

Aflame, de 2020 –, publicados em dupla com o historiado­r inglês Dan Jones, além de colaboraçõ­es com uma série de veículos e projetos. Um dos mais importante­s é Faces of Auschwitz, em que abre caminho para humanizar ainda mais os relatos das vítimas dos campos de concentraç­ão nazistas ao colorir as imagens de registro desses prisioneir­os.

“Entendo essas fotos como documentos, por isso preciso respeitá-las e tratá-las como tal. Com isso, dou muita ênfase à pesquisa que antecede o processo de colorizaçã­o. É a forma que tenho de assegurar-me que estou reproduzin­do as cores originais, ou que estou chegando próximo a elas quanto for possível”, explica ela sobre seu ofício detalhadís­simo, que pode levar meses de estudo por referência­s para o tratamento, feito de forma completame­nte manual, sem ajuda de algoritmos de inteligênc­ia artificial. Tanto que acompanhar seus projetos – seja pelos livros, seja por sua forte atuação em redes sociais – é uma aula de detalhes memoriais, pela quantidade de contexto que apresenta junto às restauraçõ­es. “Não é só colorir uma foto e publicar do nada. Existe muita coisa por trás.”

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MARINA AMARAL
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Billie Holiday e Ella Fitzgerald no Bop City, Nova York
PÁGINA AO LADO – Billie Holiday em jam session no Hearst Studio, 1939
FOTOS ACIMA – Billie Holiday no Strand Theater, Nova York,1953. Billie Holiday e Ella Fitzgerald no Bop City, Nova York PÁGINA AO LADO – Billie Holiday em jam session no Hearst Studio, 1939

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