Galliano-ization
Em outubro de 1996, o britânico John Galliano foi anunciado diretor criativo da Christian Dior, uma contratação considerada ousada, levando em conta que Bernard Arnault, presidente do grupo LVMH, convidou Alexander Mcqueen para substituir Galliano na Givenchy. Esse movimento, digno de um xeque -mate, foi tomado como uma invasão britânica em Paris e, também, uma possível mudança de padrões, com novos designers assumindo postos cobiçados na meca do luxo.
Marc Bohan, que foi chamado pela maison para ficar no lugar do jovem Yves Saint Laurent, declarou na época: “Elas (roupas criadas por Galliano e Mcqueen, especificamente) são muito exóticas para fotos, mas nunca vi em uma cliente”. Em parte, as críticas de Bohan e de tantos outros fashionistas tradicionalistas tinham a ver com um espírito de nacionalidade. Galliano, entretanto, fez exatamente o que Arnault esperava: revolucionou a Dior. Essa trajetória ganha, em fevereiro, uma publicação de peso: Dior by Galliano, com texto de Andrew Bolton, curador do Metropolitan Museum of Art’s Costume Institute desde 2006, e fotos de Laziz Hamani.
Até 2011, quando foi demitido após declarações antissemitas e racistas proferidas em um bar vazarem em um vídeo, Galliano foi responsável por criar algumas das coleções e imagens mais espetaculares da moda contemporânea, ao mesclar o gosto pelo inusitado com o design revolucionário de Monsieur Christian Dior. No fundo, ambos compartilhavam de uma visão romântica da feminilidade, a paixão por trajes históricos e até mesmo uma certa teatralidade que, no caso do estilista inglês, ganhou expressão máxima e virou sua marca registrada.
Não por acaso. Aluno prodígio desde muito cedo, com vocação para artes e línguas estrangeiras, foi aceito na prestigiosa Central Saint Martin’s e, para conseguir um dinheiro extra que ajudasse a custear os estudos, trabalhava em paralelo como dresser no National Theatre. Segundo Galliano, essa experiência o ajudou a moldar sua visão de drama, de roupa, de figurino e de como vestir uma pessoa. Ele também adorava passar horas visitando a coleção permanente do museu Victoria and Albert e lendo livros de história da moda. Durante suas pesquisas, descobriu Os Miseráveis, o romance de Victor Hugo, publicado em 1862 e transformado em peça e filme, sobre um grupo de rebeldes de uma subcultura aristocrática em Paris, considerados personagens precursores do movimento Novo Romantismo. Segundo Bolton, esses pós-revolucionários renegados afetaram o lifestyle e o visual do estilista, transformando-se em forte influência estética em seu trabalho. As criações de Christian Dior também estavam no seu radar desde que começou a criar suas próprias coleções. Depois, com o contato direto com o acervo da maison, o que se viu foi uma Galliano-ization de criações icônicas, já na coleção de estreia na alta-costura, em janeiro de 1997, e que comemorava, também, os 50 anos da casa Dior. Era a primeira vez que um designer atualizava os desenhos originais, principalmente o tailleur Bar. E ele continuou esse exercício durante os seus 15 anos à frente da grife.