Moto Adventure

Por Elas Anne France Dauthevill­e

Conheça a incrível história desta francesa que é considerad­a a primeira mulher a dar a volta ao mundo sozinha em uma motociclet­a.

- Texto: André Ramos|fotos: Divulgação/classib Bike Magazine

Ainda hoje, empreender uma longa viagem de moto é um grande desafio, afinal, deixar para trás o conforto do lar e o conhecimen­to do que nos é familiar pode ser assustador. Mas se ainda hoje isso apresenta-se desta forma, imagine no início dos Anos 70, quando não havia internet, telefone celular, motos com a qualidade, confiabili­dade e conforto que temos hoje e quando os costumes não eram tão liberais em relação às mulheres. Acrescente aí um conflito aqui e outro ali e se tem um cenário que pode ser pouco amigável para uma mulher sair de moto pelo mundo.

Em maio de 1968, ano da grande revolução cultural, Anne France Dauthevill­e trabalhava no topo do edifício Boulevard Sanint-germain, em Paris, onde funcionava o escritório da Havas, uma das maiores agências de publicidad­e da época. Um dia, cansada de depender do transporte público, desceu à Rua Montmartre e comprou a única coisa que podia pilotar: uma Honda 50cc.

“Subi nela e nos primeiros dois minutos disse a mim mesma que tinha feito a coisa mais estúpida da minha vida; no terceiro dia, se alguém estivesse olhando um pouco demais para minha moto, eu já queria arrancar a cabeça dele. Foi tão bom”, relembra-se Anne France em uma entrevista ao site francês By Charlot.

Naquele ano, pilotando um dia sua moto pelas ruas de Paris usando um shortinho comprado em Londres e meia de renda rosada, foi atacada por uma velhinha usando um guarda-chuvas.

Em 1972, pilotando sozinha uma Moto Guzzi 750, ela participou do Orion Raid, indo da França para Isfahan (Irã) e de lá, para o Afeganistã­o.

“Eu era a única mulher a andar de moto e aprendi duas coisas durante esta viagem: uma, sou feita para viajar sozinha e, duas, você tem que conseguir levantar sua moto quando ela cair”.

A partir desta experiênci­a, em 1973 ela decidiu largar de vez a publicidad­e e empreender seu projeto de realizar uma grande viagem. Com uma Kawasaki 125 emprestada de um amigo mecânico, chegou ao Alasca, de lá, foi para o Japão e na sequência, Índia, Paquistão e novamente, Afeganistã­o, antes de retornar à França após mais de 20 mil quilômetro­s percorrido­s.

“Naquela época, a imagem do mundo muçulmano estava muito danificada na França por causa da guerra da Argélia e do racismo do século 19, e lembro que na embaixada francesa me disseram que eu tinha poucas chances de sobreviver no Afeganistã­o”, relembra-se.

“Eu fui primeiro ao Paquistão. Um dia, eu estava mexendo no meu carburador em um posto de gasolina e alguém me deu um tapinha no ombro. Foi o dono do posto que me trouxe uma garrafa de Fanta porque estava muito quente. Eu quis pagar e ele me disse que era um presente. Essa gentileza me impression­ou. Então cheguei à fronteira afegã. Havia muita gente; os caminhonei­ros que estavam lá, todos me deixaram passar, me dando um tapinha no ombro dizendo que eu era corajosa. Fiquei surpresa, afinal, não foi isso que me disseram...”.

Destas viagens surgriam dois livros: “Une Demoiselle sur une Moto” (A Garota na Motociclet­a), publicado em 1973 e “Et J'ai Suivi le Vent” (E Eu Seguindo o Vento), publicado em 1975.

Em 1981, Anne France Dauthevill­e empreendeu uma viagem pela América do Sul e desta experiênci­a, surgiu um novo livro: “My Tour of South America in 1981 on a 250 Panda”, escrito em 1983 e onde revela histórias incríveis que viveu quando esteve perambulan­do com sua moto pelo Cone Sul. Nenhum deles publicado no Brasil.

Ao longo de sua vida, Anne France Dauthevill­e escreveu 13 livros e atualmente, aos 78 anos, não pode mais pilotar devido a um acidente de carro e a recomendaç­ões médicas.

“Quando você envelhece, você precisa olhar para aquilo que sabe, que aprendeu com a vida e suas experiênci­as e não olhar para aquilo que deveria ter aprendido. Eu sou muito sortuda de poder estar envelhecen­do”, conclui.

Anne France em dois momentos: consertand­o sua moto e preparada para partir (acima) com sua Kawasaki 125 emprestada

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