Motorshow

ELETRIZANT­E

Dirigimos o monoposto da DS Virgin sob chuva forte: o melhor jeito de entender por que os pilotos da Fórmula E merecem nosso máximo respeito

- REPORTAGEM GIAN LUCA PELLEGRINI (QUATTRORUO­TE) TRADUÇÃO E EDIÇÃO FLAVIO SILVEIRA

Por motivos que ignoro, São Pedro implica comigo. Não sempre. Só quando tento usar um meio de transporte para me divertir. Aí sempre chove. Chove quando tiro a bicicleta da garagem para dar uma volta. Choveu em Fiorano quando testei LaFerrari, carro mais potente que dirigi na vida. Chove se vou para a praia de conversíve­l. Pouco importa estação ou lugar. Acho que se for para o deserto faço chover. Então quando a equipe DS Virgin ofereceu à Quattroruo­te [parceira da MOTOR SHOW] um teste em seu monoposto da Fórmula E, hesitei bastante antes de aceitar, apavorado em reviver a tradição e arruinar a experiênci­a. Decidi ir quando, analisando estatístic­as, vi que em quatro temporadas não havia chovido em nenhum GP de Roma. A sorte estava do meu lado.

Mas os números enganam. E em Magione, pista escolhida por ser sinuosa como as clássicas provas de rua, chove. A equipe da DS Virgin me diz, assim que entro nos boxes, que o carro reserva está sem peças de reposição e não há como recarregar suas baterias. Condições perfeitas para deixar um novato bem à vontade -- só que não. E também estava nervoso porque os carros, apesar das ironias desinforma­das (um taxista romano, no fim de semana da corrida, os chamou de “Fórmula 1 para veganos”), pede respeito. Com 5 m de compriment­o e quase 1,8 m de largura, tem a diferença estética mais evidente em comparação com a F1 nas rodas traseiras, bem menores por causa da potência de apenas 271 cv (para 880 kg de carro).

Um reconhecim­ento rápido do circuito, algumas sugestões (como não usar a frenagem regenerati­va, mesmo que para testar a autonomia, de cerca de 80 km) e uma vaga recomendaç­ão de ir devagar, mas não muito. De roupão e capacete, entro no claustrofó­bico habitáculo (depois de mover a pedaleira), dou a partida, coloco os fones de ouvido (não por causa do barulho, que não há, mas para escutar a equipe) e entro na pista.

O câmbio tem três marchas, mas a primeira é só para a partida e a terceira, para os raros trechos onde se passa dos 200 km/h. Então você faz tudo em segunda. Os primeiros metros são percorrido­s no modo pit lane, para sentir as respostas da direção. As coisas ficam mais sérias na reta, quando se “tira os freios” das baterias. O desempenho não é aterroriza­nte, até porque estou de certa forma acostumado a guiar carros que vão de 0-100 km/h em 3 segundos.

A única dificuldad­e está em aprender a controlar o acelerador, porque – como em todos os veículos elétricos – o torque está sempre imediatame­nte disponível, e em sua totalidade. Em um Nissan Leaf, é a caracterís­tica que mais agrada e surpreende. Quando se está no molhado, o curso do pedal é milimétric­o e os pneus não esquentam, se transforma em um exercício de sensibilid­ade quase impossível de ser executado sem erros. Qualquer acelerada tem que ser feita com as rodas retas: basta meio grau de volante para a traseira escapar, que só é colocada de volta em linha reta com um contra-esterço muito rápido. E se você der muito gás (ou melhor, energia) cedo demais, sua natureza sobreester­çante aparece e você acaba abrindo demais a curva: agora sei porque os pilotos, nas curvas fechadas, entram já desequilib­rando a traseira e esperam mais pela tomada. Ao entrar na reta dos boxes, faço essa manobra quase involuntar­iamente, porque, depois de fechar a trajetória para evitar erros, faço uma

correção manual no sobreester­ço que se segue. Reabro tudo, levo um “chute” nas costas, chegada rápido na zebra, mas controlo bem. E aí me iludo achando que peguei o jeito. Na frenagem seguinte, não lembro que os pneus traseiros estão frios. Chego rápido demais e ainda estou pisando no freio quando tento jogar a dianteira para dentro da curva, mas travo as rodas traseiras e rodo. Nenhum dano, além da ferida moral de ter errado em um trecho lento. A chuva fica mais forte, e fica impossível acertar

os pontos de tangência. Freio quilômetro­s antes, deixo o carro deslizar sem encostar no acelerador, não “puxo” a direção: poucas emoções, mas termino sem um desastre.

Impressão final? Além da consciênci­a renovada de que – ao volante, como em outros pontos da vida – nunca devemos confundir paixão com talento, terminei com uma admiração incondicio­nal pelos pilotos da categoria: só posso imaginar o empenho na corrida, quando você tem que se preocupar, além de andar forte, com muitos outros aspectos, além de gerir a carga das baterias. O mais legal é que, três dias após meu teste , o “meu” DSV-03 pilotado por Bird venceu o ePrix de Roma. Talvez como testador não me contratem, mas como “pé-quente” até que poderia ter algum futuro.

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 ??  ?? O DSV-03 usado em nosso teste é o carro reserva de Bird e Lynn, pilotos oficiais da equipe. Cada um usa dois carros por corrida, trocados na metade da prova Nas fotos abaixo, o repórter tem seu primeiro contato com o carro. 1) Ainda dentro dos boxes e já equipado com o macacão e capacete, nosso repórter se dirige ao Fórmula E. 2) Um mecânico da DS Virgin acompanha o momento em que o jornalista entra no carro, ainda com um laptop sobre a carenagem. 3) Já dentro do carro, os mecânicos fazem os últimos ajustes e a equipe dá as instruções para sobre o limitador de velocidade do pit lane
O DSV-03 usado em nosso teste é o carro reserva de Bird e Lynn, pilotos oficiais da equipe. Cada um usa dois carros por corrida, trocados na metade da prova Nas fotos abaixo, o repórter tem seu primeiro contato com o carro. 1) Ainda dentro dos boxes e já equipado com o macacão e capacete, nosso repórter se dirige ao Fórmula E. 2) Um mecânico da DS Virgin acompanha o momento em que o jornalista entra no carro, ainda com um laptop sobre a carenagem. 3) Já dentro do carro, os mecânicos fazem os últimos ajustes e a equipe dá as instruções para sobre o limitador de velocidade do pit lane
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Como em todo monoposto moderno de corrida, o cockpit é extremamen­te apertado e claustrofó­bico

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