Ferrari SF90
MARANELLO SURPREENDE E DESENVOLVE UM SISTEMA HÍBRIDO PLUG-IN PARA SEU MODELO TOPO DE LINHA. E OS RESULTADOS SÃO EXTRAORDINÁRIOS: COM 1.000 CV DE POTÊNCIA, A NOVA FERRARI SF90 ÉA MAIS POTENTE E RÁPIDA DA HISTÓRIA. E PERFEITAMENTE ADAPTÁVEL AO USO DIÁRIO
Já aceleramos, nos Alpes e na pista, o novo esportivo com 1.000 cv de potência.
O INTERIOR DESSA FERRARI REVOLUCIONA, PORQUE ABRE AS PORTAS PARA UM NOVO MUNDO DOS HIPERCARROS
Revelo um segredo, antes de tudo: fui o primeiro jornalista do mundo a experimentar a SF90 Stradale, e a única coisa da qual não gostei foi de seu vídeo de lançamento em Montecarlo. Espera que ele exorcizasse o fracasso em celebrar o GP devido ao novo coronavírus, criando uma oportunidade única de ver o enfant du pays Leclerc como motorista. Amante da sétima arte, fiquei ansioso com o “remake” – que usou como “gancho” as ruas vazias – de “C’était un rendez-vous”, (“Era um encontro”) curta dos anos 70 em que, em oito minutos e sete segundos, um cara atravessa loucamente uma Paris semideserta para abraçar sua namorada na Sacré Coeur (Sagrado Coração). Um filme eticamente questionável, que acabou sendo apreendido e escondido por longo tempo. Dada a causa, o contexto e os protagonistas, esperava uma obraprima no mesmo nível da original. Mas não foi o que aconteceu. O velho Lelouch ainda tem a mão, Leclerc traça trajetórias em um caminho que conhece bem, mas há um problema: eu, que dirigia o SF90 por uma semana antes do lançamento do filme, percebi imediatamente que o trabalho de Lelouch não mostra nada da alma, do encanto e do significado deste carro, destinado a marcar um ponto de mutação no império dos hipercarros.
UM OLHO NO MEIO AMBIENTE
Acho que é importante deixar claro logo de cara: meu entusiasmo por um carro não enxerga seu emblema, embora eu deva reconhecer que a Ferrari nos acostumou à sua tensão obsessiva pela excelência. Ciente de viver em um mundo onde equilíbrio e proporções são indispensáveis, e onde afirmações absolutas lutam para passar no teste do tempo, não temo dizer que, na minha opinião, a SF 90 é uma divisora de águas no design automotivo como um todo. Explico. A Ferrari, que registra lucros há décadas, mas certamente não tem os recursos, por exemplo, da Porsche (35.429 funcionários, 2,2 bilhões de euros para pesquisa e desenvolvimento, e ainda podendo compartilhar componentes com outras marcas do Grupo Volkswagen), poderia ter adicionar um supercarro à linha continuando na vertente evolutiva das soluções já testadas. Em vez disso, decidiu revolucionar colocando como prioridade na equação de engenharia uma instância até agora não prioritária neste segmento: sustentabilidade. Ainda assim, em Maranello eles tinham duas opções: fazer como muitos, eletrificando o existente, ou fazer tudo do zero. Acabaram escolhendo a mais difícil, e “inventando” um esportivo turbo V8 híbrido plug-in no qual todos os seus novos componentes – sistema híbrido, tração integral, motor a combustão, chassi, caixa de câmbio, instrumentação, tudo – visam abrir novas perspectivas para uma marca que sempre fez do progresso e da evolução algumas de suas bases vitais. Esse é de fato um projeto cujo calibre ofusca todos os antepassados desde a F40. Mil cavalos, 0- 100 km/ h em 2s5, 0- 200 km/ h em 6s7: todos estes recordes de uma Ferrari feita em série. E tudo isso emitindo só 146 g/km de CO e por um terço do preço da LaFerrari (€ 413 mil) e sem restrições de unidades. A SF 90 Stradale (SF significa Scuderia Ferrari, e 90 marca o aniversário da equipe fundada por Drake) fará parte da linha “normal”, que será entregue em dois anos. Se desejado, a versão Assetto Fiorano tem longa lista de componentes específicos – e há rumores de que já está entre a favorita dos clientes.
HORA DO RESET
Foi partindo dessa premissa, simplesmente fundamental para aqueles que amam carros cujo significado vai além da função, que eu queria entender como esses números se traduzem na vida cotidiana. A primeira impressão é que é essencial redefinir as regras aprendidas após anos de visitas à Ferrari: a experiência na cabine é verdadeiramente sem precedentes. Começando com o volante, a peça central da nova interface homem-máquina. A única coisa que ficou como antes é o manettino à direita. O resto foi completamente redesenhado, do zero, e isso incluiu até mesmo eliminar um detalhe icônico das Ferrari: o botão de partida vermelho, que foi substituído por um modesto botão sensível ao toque (como todos os outros no carro). Uma vez pressionado, ele dá vida não apenas ao esportivo, mas também a todo o volante. Este se acende para revelar toda a infinidade de comandos com os quais gerenciar a “nave espacial”. Eu estaria mentindo se dissesse que entendi imediatamente como usar o sistema (que aparecerá em outros modelos). De fato, a triste verdade é que, durante trinta minutos, procurei o volume do rádio, para depois descobrir comandos escondidos e aprender a tocar o touchpad certo, que – entre dezenas de funções – configura a aparência e o layout da espetacular tela colorida de alta definição (e, pela primeira vez, um head-up display).
TUDO PELA INTEGRAÇÃO
O volante é na verdade apenas uma porta de entrada para este novo mundo da Ferrari, marcado principalmente pelo inédito e- manettino. O novo comando no volante escolhe o modo de propulsão, e agora pode selecionar quatro opções diferentes: eDrive (modo elétrico), Hybrid (motor térmico funciona em sinergia com dois elétricos dianteiros), Performance (o V8 fica sempre ligado e garante a manutenção da carga da bateria em 7,9 kWh) e Qualify (tira o máximo proveito do sistema às custas da carga da bateria). Na partida, o padrão é Hybrid, e você se vê imediatamente em uma Ferrari em total silêncio. Os motores elétricos nas rodas dianteiras, além de garantir tração integral e o vetor de torque resultante, garantem 25 km de autonomia. E admito: passei a primeira meia hora no modo EV, para provar um sabor até agora proibido. No modo Hybrid, toda a sofisticação de um sistema excepcional na integração de várias naturezas é melhor compreendida: em qualquer situação, é impossível perceber o intenso fluxo de energia que ocorre entre o motor a combustão (o da F8 Tributo, mas radicalmente modificado) e o coração elétrico da SF 90. No fim, o trabalho de ajustar o acelerador torna-se divertido quando você fica tentando entender como aumentar o limiar no qual os kWh se fundem com a vigorosa virilidade dos oito pistões – e fazê-los trabalhar em uníssono do melhor modo possível. Para os entusiastas, esta é uma epifania, pura diversão. Temos a percepção de que, em um progresso histórico, nem um grama da personalidade das Ferrari foi perdido. Há inesperados harmonia e equilíbrio. O sistema híbrido plug-in se une à perfeição dinâmica com a qual os mais recentes modelos da Ferrari nos acostumaram. O sentimento principal é de leveza, o que definitivamente não se espera de um carro com 1.000 cv. Você entende imediatamente o trabalho realizado em materiais e centros de gravidade para compensar o aumento de peso do híbrido (a caixa de dupla embreagem e oito marchas ganha apenas dez quilos em relação à de sete: eles tiraram até mesmo a marcha à ré, e a SF 90 precisa usar seus motores elétricos para isso). Toda a complexidade do projeto deste superesportivo ficou ainda mais clara em nosso breve teste na pista de Fiorano. O dia chuvoso, além de reviver meu inimigo pessoal (quando dirigi a LaFerrari, em 2013, a pista estava inundada), serve para testar a ajuda da vetorização de torque: graças à combinação dela com os sistemas RAC-E (que gerencia a atitude nas curvas) e ESSC (estabilidade e tração) há ótimos ângulos de esterço e estabilidade em curvas. Mais do que a frenagem no final da reta, a 225 km/h, uma consequência quase automática da cavalaria e da aerodinâmica aterrorizantes, o que mais me impressionou foi a docilidade desta máquina. A SF90 Stradale não precisa ser domada, apenas apoiada. Mas, se alguém fizer a loucura de desligar completamente os controles eletrônicos, colocando o manettino na sua última posição, é melhor ter habilidades de condução equivalentes à conta bancária…