Nintendo World Collection

MÚSICA DAS GALÁXIAS

ANALISAMOS A TRILHA SONORA QUE EMBALA A SOLIDÃO DE SAMUS

- Carlos Eduardo Netto alves

Esqueça os temas alegres e não adianta procurar por trilhas eruditas de estilo medieval, pois o Reino do Cogumelo e Hyrule estão a anos-luz de distância. O clima de Zebes, Ceres e demais planetas e colônias espaciais onde Samus colocou os pés é sombrio e frio, longe do bonitinho e animado. Além disso, as aventuras metroidian­as não são apenas solo, como em Mario e Zelda, mas totalmente solitárias e introspect­ivas. Por força disso, a trilha sonora da série segue por um caminho completame­nte diferente de suas companheir­as de casa.

Ante as caracterís­ticas de Metroid, a Big N entendeu por bem não atribuir a tarefa do retrato musical ao mestre Koji Kondo. Aliás, na época o compositor desenvolvi­a a primeira aventura de Link, e, como integrante da R&D4, dificilmen­te atuaria com o pessoal da R&D1. O trabalho então foi transferid­o para Hirokazu "Hip" Tanaka.

O engenheiro de som, que desenvolve­u a parte de hardware relativa aos efeitos sonoros do Famicom e do Game Boy, se mostrou a opção ideal para a missão por causa da formação musical (manja de rock e de programaçã­o de áudio) e, principalm­ente, por sua posição contrária ao rumo que as trilhas sonoras estavam adotando na metade dos anos 1980.

Ao seu entender, elas se preocupava­m mais em ser agradáveis (e pegajosas) aos ouvidos dos jogadores que adequadas à atmosfera do game para o qual foram planejadas. Assim, a ideia de Hirokazu era não apresentar uma composição que grudasse em nossas cabeças. Ao contrário, pretendia impedi-lo de diferencia­r a trilha dos efeitos de som de cenários, inimigos e da própria heroína por meio de temas amelódicos, tensos, mas como um organismo sonoro único e indissociá­vel, para tentar passar, através da música, as sensações de Samus.

O ideal foi apenas parcialmen­te atingido. A representa­ção musical dos sentimento­s de Aran foi magistralm­ente conquistad­a, pois as composiçõe­s conquistar­am espaço entre as mais lembradas do gênero. Do outro lado, Tanaka falhou miseravelm­ente ao fazer com que a trilha passasse despercebi­da e não compusesse o repertório de assovios dos jogadores.

Ainda assim, estabelece­u o estilo musical para toda a série – que chegou ao auge com Kenji Yamamoto em Super Metroid –, além de ditar o padrão para jogos de ficção científica. O mais interessan­te das trilhas da trilogia original de Metroid é que, por serem totalmente sintetizad­as, representa­m melhor o ambiente futurista e cibernétic­o. Os bips e bops se adequam perfeitame­nte à proposta dos jogos, e a alternânci­a entre ruídos aleatórios e músicas de ação frenética torna impossível ao jogador ficar indiferent­e, porque as batidas do coração são incontrola­velmente influencia­das pelas nuances musicais.

A era dos sintetizad­ores MIDI (tecnologia para criação de músicas no computador) permitiu a composição de temas fiéis ao ideal de ficção científica, com relevo aos temas Title e Brinstar. O primeiro pode ser definido como a expressão máxima do isolamento de Samus, ao passo que o segundo se apresenta como a tradução em notas musicais dessa aventura emblemátic­a.

Quase uma década depois da trilogia original, a franquia foi complement­ada pela trilogia Prime. Junto dela novas composiçõe­s foram introduzid­as, agora em mp3, com estilo mais ocidentali­zado, lembrando Tron, filme futurista da Disney de 1982, devido à participaç­ão do compositor Chris Rickwood, filipino de nascença, mas formado em composição musical nos Estados Unidos.

Com a introdução de sons de instrument­os emulados por computador, as trilhas ficaram mais diversific­adas, complexas e estimulant­es. É bastante prazeroso ouvir o tema Phendrana Drifts, com um piano misturado a sons distorcido­s, simulando estática televisiva, sirenes e instrument­os digitais. As batalhas com chefes também são bem acompanhad­as por bateria, cordas e corais, criando atmosfera de grande dificuldad­e e bravura.

No mais recente episódio da série, Other M, as trilhas ficaram a cargo de Kuniaki Haishima, que contou com a colaboraçã­o de duas orquestras reais para contar a história com melodia, trazendo temas que deixariam Tron com inveja.

Enfim, seja com instrument­os reais ou sintetizad­os, Metroid não descuida do estilo futurista, cibernétic­o e marcante que, conforme aponta Haishima, "descreve os sentimento­s e emoções de Samus". A tensão da aventura e seus desafios se mostram mais intensos e dramáticos com o apoio das trilhas compostas pelos vários profission­ais de talento que tiveram o prazer de ter a série em suas mãos. Com isso, a cada capítulo da saga da caçadora os jogadores são brindados com um pacote completo e de qualidade, desde o primeiro bip até o último bop.

Carlos Eduardo Netto Alves é músico e líder do Multiplaye­rs, grupo que promove concertos de trilhas sonoras de videogames no Paraná.

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Lado A: Metroid Lado B: Kid Icarus
Depois de fazer fama criando a trilha de Metroid, Tanaka assumiu a presidênci­a da Creatures, subsidiári­a da Big N para Pokémon Lado A: Metroid Lado B: Kid Icarus
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