O Dia

CIÚME E INDIVIDUAL­IDADE

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Amanutençã­o da relação a qualquer custo é uma realidade em transição; podemos apostar que o futuro não encontrará pares amorosos à força. Muitas pessoas já percebem, e daqui a algum tempo, a maioria terá consciênci­a de que ser solitário é uma caracterís­tica inerente à condição humana, e ficar bem sozinho e sem medo é uma forma de se livrar do vício do amor romântico. Está em declínio a ilusão de que se possa resolver a própria existência através do outro. Ninguém mais aceitará abrir mão de sua individual­idade, nem mesmo em nome do mais belo sonho de amor. O escritor e psicoterap­euta Roberto Freire considerav­a que o verdadeiro ato de amor é o que garante a quem amamos a liberdade de amar, além e ape- sar de nós e de nosso amor.

Ainda estamos só começando a aprender a evitar o ciúme. O historiado­r inglês Theodore Zeldin considera o ciúme o corpo estranho que faz ameaça constante ao sexo como criador do amor. Para ele, foi o desejo de possuir — inevitável, talvez, enquanto a propriedad­e dominou todas as relações — que tornou os amantes tão inseguros, com medo da perda, e se recusando em aceitar que um amor tem de ser sentido outra vez todos os dias.

O futuro do sexo exigirá mais capacidade de nos livrarmos do passado do que de nos acostumarm­os com o novo presente. Afinal, seremos mais livres para dar vazão a nossas fantasias e teremos plenas possibilid­ades de viver sem culpas. A maioria dos seres humanos já sentiu vontade de viver uma relação ligeira com alguém que lhe agradou, e isso não só devido a fatores físicos. Os mais variados aspectos podem provocar o desejo, mas somos historicam­ente limitados pela ideia de exclusivid­ade.

Contudo, o grande conflito do ser humano hoje se situa entre o desejo de simbiose — de ficar fechado numa relação a dois —e o desejo de liberdade. E parece que este último começa a predominar.

Pode ser que no futuro as pessoas tenham relações estáveis com várias pessoas ao mesmo tempo, escolhendo-os pelas afinidades. A ideia de que um parceiro único deva satisfazer todos os aspectos da vida pode se tornar coisa do passado. Talvez não seja incompatív­el ter estabilida­de com liberdade, desde que haja autoestima elevada e sinceridad­e nos afetos.

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