O Dia

LIBERDADE PELA EDUCAÇÃO

Presidiári­o que se formou no cárcere e passou no Enem diz que leitura liberta

- WILSON AQUINO wilson.aquino@odia.com.br

Dos 45 mil presos no sistema penitenciá­rio do Rio ,3.351estão estudando. A maioria faz cursos profission­alizantes. Jefferson Cunha Pereira, preso há oito anos por homicídio, foi um dos primeiros classifica­dos do Enem no Estado.

Mahatma Gandhi pregava que “a prisão não são as grades, e a liberdade nãoéa rua; existem homens presos na rua e livres na prisão”. A liberdade, para o líder indiano, está na consciênci­a. As centenas de milhares de pessoas encarcerad­as no sistema penitenciá­rio brasileiro parecem longe de compreende­r aforça deste ensinament­o. Apenas cerca de 10% usam seu tempo para ‘escapar’ dos horrores do cárcere através da educação. No Rio, a situação é ainda pior.

Dos cerca de 45 mil internos no estado, só 3.351 estudam. Vinte e dois deles são presos de regime aberto e semi aberto que fazem faculdade. A socióloga Edna Del Pomo de Araújo, professora do Departamen­to de Sociologia da UFF, destaca na publicação ‘Prisão e Socializaç­ão: a penitenciá­ria Lemos Brito’, que “é preciso libertar os indivíduos por meio do trabalho e da educação”. “Os homens que hoje estão presos serão livres amanhã e, caso não tenham cumprido apena em buscada recupera- ção, provavelme­nte voltarão a delinquir”, alerta.

Jefferson Cunha Pereira, 37 anos, que completa oito anos na prisão em abril, decidiu trilhar caminho oposto. “Ler é uma fuga. Quando a gente está lendo, se desliga do ambiente onde está: o cárcere. A mente navega para fora daqui”, afirma Pereira.

Ex-policial militar, ele foi condenado a 20 anos de ca- deia por homicídio. Aproveitou o tempo ocioso na cela para estudar, e o resultado f oi animador. Foi um dos primeiros classifica­dos do Rio, no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), concorrend­o com outros estudantes da rede pública. Ganhou uma vaga para cursar Administra­ção de Empresas na Universida­de Federal Fluminense (UFF) e Di- reito na Faculdade Anhanguera, em Niterói, pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Cabe agora à Vara de Execuções Penais decidir se ele cursará ou não.

O secretário de Administra­ção Penitenciá­ria do Rio (Seap), coronel PM Erir Ribeiro Costa Filho, também concorda que esse é o caminho. “É a parte da ressociali­zação e de humanizaçã­o do sistema penitenciá­rio que todos nós temos que buscar para devolver à sociedade um novo cidadão”, acredita.

Adquirir conhecimen­to e t er a possibil i dade de s e transforma­r não é a única vantagem para o preso que estuda. A Lei de Execuções Penais assegura o direito à remição (abatimento da pena) na proporção de um dia a cada 12 horas de frequência escolar. A lição de Gandhi é ainda mais útil quando combinada com a do filósofo Montesquie­u: “Liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as l eis permitem.” Estudar para reduzir a pena, por exemplo.

“Ler é uma fuga. Lendo, a gente se desliga do ambiente onde está: o cárcere. A mente navega para fora”

Jefferson Cunha Pereira, presidiári­o

 ?? DANIEL CASTELO BRANCO ??
DANIEL CASTELO BRANCO
 ?? DANIEL CASTELO BRANCO ?? O ex-policial militar Jeferson, preso em Bangu, depende de autorizaçã­o da Vara de Execuções Penais para poder cursar Administra­ção na UFF
DANIEL CASTELO BRANCO O ex-policial militar Jeferson, preso em Bangu, depende de autorizaçã­o da Vara de Execuções Penais para poder cursar Administra­ção na UFF

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil