O Dia

Feliz encontro

- Gabriel Chalita Professor e escritor

Era um dos tantos feriados que há pelo ano. Em uma cidade do interior. Uma daquelas antigas, com ladeiras íngremes. Com ruas preenchida­s por pesados paralelepí­pedos. Calçadas cheias de histórias de pés que conduziram encontros e despedidas. Durante décadas. Durante séculos. Viram crianças se tornando adultos. E adultos voltando a ser crianças. Com seus desejos permeados de equívocos. Com seus choros exagerados e, certamente, com muitos acertos.

Erik convidou alguns amigos. O passeio valia. A cidade estaria lotada, mas seria bom sentir o seu aroma. Havia flores, plantadas e regadas, em diferentes circunstân­cias. E lá foram eles. Pegaram a estrada e chegaram. E demoraram para conseguir algum lugar para estacionar o carro. Ladeira aqui, ladeira ali. Pararam e, absortos pela beleza da cidade, caminharam sem preo- de retorno. Tiraram fotos. Tomaram café. Comeram delícias típicas do local. Entraram e saíram de antigas construçõe­s. E chegaram ao momento de despedir. Era preciso voltar. E quem se lembrava de onde estava o carro?

Erik deu o seu palpite. Errado. Os outros dois tentaram. Erik mostravase arquiteto nos cálculos do espaço e do tempo que os levariam ao destino certo. E nada. E foram de um lado. Pensaram na mão e na contramão, no traçado feito anteriorme­nte. No caminho que não dava opções para paradas. E nada. Um deles mostrou preocupaçã­o. O outro aliviou. “É feriado. Não estamos com nenhum compromiss­o. E estamos felizes”.

Estar feliz faz toda diferença. As angústias incendeiam momentos como esses. Sempre haverá alguém a estampar desespero em sua fronte. Ou a reclamar de descuidos. Ou a praguejar sobre a infeliz ideia de estarem ali. Mas os três estavam felizes. E isso minimizava qualquer outro senão.

Um sugeriu que pegassem um táxi e ficassem perambulan­do pela cidade até encontrar. O outro deu outro palpite. A caminhada estava boa. Era melhor prosseguir passo a passo. Mesmo em ladeiras desafiador­as. E foram. E tiveram tempo de esquecer um pouco a procura para assistir ao pôr do sol. Que belo! As fotografia­s não registrari­am tudo. Há imagens que só almas felizes são capazes de armazenar.

E viram um banco antigo. E sentaram. E prosseguir­am a prosa. E um dos amigos insistiu no primeiro palpite. Voltaram, então. Brincaram de fazer apostas. Do tempo que demorariam para encontrar. Ao longe, estava ele, o carro. Os faróis pareciam sorrisos. A brincadeir­a havia chegado ao fim. Exaustos nas pernas e leves na alma, foram ao encontro, ao feliz encontro.

Na verdade, o feliz encontro veio antes. Quando se conheceram. Amizades emprestam suavidade ao calor das procuras. Estaremos sempre em busca de algo. Algo sempre será perdido e nos desafiará a ser encontrado. Com amigos, tudo fica mais fácil, mais prazeroso. Erik foi dirigindo e contando as histórias que sabia da velha cidade. Era uma nova amizade se espreguiça­ndo. Que bom estar ali.

 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil