A síndrome da multipresença
Não são poucas as piadas que têm como pano de fundo a nossa dependência da conectividade digital através de celulares e o quanto ela está afetando as relações pessoais. Talvez a mais conhecida seja a da avó, recebendo a visita da família e ficando em meio a todos, silenciosos, cada um com suas mídias sociais.
Outra consequência da hiperconectividade, talvez ainda pouco notada, é a síndrome da multipresença. Diante da facilidade de nos comunicar e da crescente possibilidade de fazer isso através de vídeo, estamos desenvolvendo a sensação de estar em vários lugares ao mesmo tempo. Isso não só dificulta nossas relações pessoais, mas também distorce nossa relação com o espaço em que nos encontramos. Parece que estamos perdendo a noção do lugar em que estamos e ultrapassando as barreiras do bom senso. Outro dia, numa estação do metrô, vi uma mulher de cócoras filmando várias folhas espalhadas no chão e dando broncas, acredito eu, em sua secretária. Mães dando bronca em filhos através de videochamadas em salas de espera e executivos discutindo projetos em reuniões virtuais em pleno aeroporto já se tornaram figuras comuns.
Muito além da fantasia de que podemos estar em vários lugares ao mesmo tempo e de agirmos como se realmente estivéssemos, está o risco da perda de contato com a realidade que nos cerca. Já podemos vivenciar cenas hilárias (se não fossem trágicas) em que pessoas num mesmo espaço encontramse cada uma em um lugar diferente. Os acessórios básicos são um celular e um fone de ouvido. Funcionam como uma máquina de teletransporte que tira de nós, inclusive, o bom senso e a boa educação. Chegamos ao ponto de considerar impertinente ou louca a pessoa que insiste em puxar assunto e obriga-nos a perceber e permanecer no lugar onde nos encontramos.
Um dos únicos lugares onde as crianças e os jovens são convidados a se afastar da ‘máquina de teletransporte’ é a escola, um lugar potencialmente rico em possibilidades de fazer com que eles vivam experiências dinâmicas, intensas e transformadoras que desenvolvam a vontade de se relacionar com o espaço que os cerca. A escola precisa, urgentemente, se tornar um antídoto para a síndrome da multipresença, sob pena de estarmos criando uma geração “multiausente” e fora da realidade.
Um dos únicos lugares onde crianças e jovens são convidados a se afastar da ‘máquina de teletransporte’ é a escola