O Dia

Fake news: maioria de votos nulos não causa cancelamen­to da eleição

Anular o voto não cancela eleições

- CÁSSIO BRUNO cassio.gomes@odia.com.br

Informação falsa circula a cada dois anos, em tempos de campanha eleitoral. Apesar do repetido alerta do Tribunal Superior Eleitoral, muitos ainda acreditam nisso. Quem anular apenas transfere para outros a decisão.

Paulo César Guedes Ferreira é vendedor de carros. Tem 53 anos. Morador de Duque de Caxias, casado e pais de duas meninas, ele iniciou, há três anos, uma campanha nas redes sociais para pregar o voto nulo. Fez vídeos, escreveu e compartilh­ou mensagens. Acreditava no esforço e na dedicação da “manifestaç­ão apolítica” para anular as eleições.

“Até o ano passado, eu usei o Facebook. Mas descobri que tudo isso era apenas uma ilusão, uma desinforma­ção. Fui pesquisar e cheguei à conclusão que aquilo não acabaria com o pleito”, explicou Paulo César.

Apesar dos alertas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tem gente que ainda crê no voto nulo para cancelar a eleição, caso essa opção alcance a maioria nas urnas eletrônica­s. A fake news (notícia falsa) circula na internet pelo menos desde 2010 e ganha força a cada dois anos.

“A crise de representa­tividade dos candidatos e os escândalos de corrupção fazem com que as pessoas acreditem nisso”, explica Silvana Batini, professora da Fundação Getulio Vargas (FGV) e procurador­a regional da República.

Para Silvana, a própria lei eleitoral deixa brechas para confundir a cabeça do eleitor. O artigo 224 do Código Eleitoral prevê a necessidad­e de marcação de um novo pleito se a nulidade atingir mais da metade dos votos. No entanto, a situação só ocorre em razão de uma irregulari­dade ou cassação da chapa vitoriosa.

“Se a chapa que ganhar sofrer processo por algum abuso, a Justiça Eleitoral anula apenas os votos desses candidatos. O eleitor que anula o voto está saindo da disputa”, ressalta Silvana Batini.

No Rio, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) fará eleições suplementa­res em Aperibé, Iguaba Grande, Laje do Muriaé e Mangaratib­a para prefeito e vice em 28 de outubro, após ter constatado irregulari­dades envolvendo os atuais gestores. Em junho, um novo governador foi eleito em Tocantins depois que a chapa vencedora em 2014 foi cassada.

FORA DO CÁLCULO

“Se todas as pessoas tiverem a mesma ideia (votar nulo), acho que anula a eleição. Eu sempre votei nulo”, conta a vendedora ambulante Maria Marques de Brito, de 56 anos, moradora do Engenho Novo.

O soldador José Maria Gomes da Silva, de 37 anos, de Bento Ribeiro, também não votará em nenhum candidato, mas ficou na dúvida se isso provoca o cancelamen­to do pleito. “Não sei ao certo. A única certeza é que eu não acredito em político nenhum”, diz.

A doméstica Michele do Nascimento, de 35 anos, que vive em Vila Isabel, afirma estar convencida da veracidade da fake news. “Os políticos prometem e não cumprem. Os hospitais estão abandonado­s. Nada muda”, reclama.

A atendente Josélia Fernandes Amorim, de 33 anos, também faz fé nos boatos das redes sociais. Moradora de Duque de Caxias, ela é mãe de um menino de um ano e se preocupa com o futuro do filho.

“Ainda não apareceu nenhum candidato que eu queira votar. A última vez que votei em uma pessoa eu tinha 17 anos. Anulei em todas as eleições. Acreditava que a eleição poderia ser cancelada”, afirma.

Fábio Vasconcell­os, cientista político da Universida­de do Estado do Rio (Uerj), reforça que os votos nulos e brancos são descartado­s.

“É eleito quem obtiver 50% mais um dos votos válidos. Os votos válidos, nesse caso, são aqueles em que o eleitor votou no candidato A ou B. Portanto, quem opta pelo branco/nulo não entra no cálculo para decidir”, diz.

Vasconcell­os destaca o índice de abstenção no primeiro turno das eleições presidenci­ais de 2002 (17,7%) e no de 2014 (19,4%). “Parte está associada à desatualiz­ação do cadastro eleitoral. Mas a descrença ou desânimo com o contexto político incentiva o não comparecim­ento. O eleitor não acredita em mudanças pelo voto”.

Em 2015, comecei a fazer campanha na rede pelo voto nulo por acreditar que isso anulava a eleição

PAULO CÉSAR, vendedor

Os políticos prometem e não cumprem. Os hospitais estão abandonado­s

MICHELE DO NASCIMENTO, doméstica

Que eu saiba, se todas as pessoas se unirem, a eleição é anulada. Nem sei quem são os candidatos

MARIA MARQUES, ambulante

A única certeza é que eu não acredito em político. Vou anular. Mas não sei se cancela (a eleição)

JOSÉ DA SILVA,soldador

Ainda não apareceu nenhum candidato em que realmente eu queira votar. Voto nulo desde os 17 anos

JOSÉLIA AMORIM, atendente

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FOTOS DE MARCIO MERCANTE / AGENCIA O DIA
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