O Dia

Mulheres que fizeram história

Documentár­io de Susanna Lira resgata trajetória de luta e resistênci­a de ex-presas políticas dos anos 1970

- BRUNNA CONDINI brunna.condini@odia.com.br

Odocumentá­rio ‘Torre das Donzelas’, da diretora Susanna Lira, exibido hoje no Festival do Rio, em première às 16h30, no Estação Net Gávea — amanhã em sessão acompanhad­a de debate, às 10h, no Cine Odeon, no Centro, e nesta segunda-feira, às 16h30, no Kinoplex São Luiz —, levou sete anos para ficar pronto.

O longa conta a história da luta das presas políticas no Brasil a partir da vida de mulheres militantes de esquerda e ex-companheir­as de cela de Dilma Rousseff na ditadura militar. Elas estiveram presas juntas na década de 1970 na Torre das Donzelas, como era chamado o conjunto de celas femininas no alto do presídio.

“Foram anos de tentativas de aproximaçã­o com a ex-presas. Havia um pacto inconscien­te de silêncio que elas descobrira­m ao longo do processo do filme”, lembra Susanna.

“Ter a coragem de narrar é acessar áreas obscuras e que você deseja esquecer. Acho que em determinad­o momento elas se tocaram do quão fatal poderia ser não contar sobre esses horrores. É uma história que vamos lutar para que não se repita. E nesse sentido, elas mais uma vez nos dão uma prova de coragem e resistênci­a em deixar eternizado esses testemunho­s”.

No documentár­io, a diretora se propõe a contar a história fugindo do formato clássico de documentár­io. A prisão foi reconstruí­da em estúdio, a partir dos desenhos das ex-presas, que junto com um elenco de atrizes, trazem de volta as impressões do passado.

“Recriamos um espaço ‘sugerido’ da Torre para que elas tecessem suas memórias naquele coletivo. A torre foi um lugar de dor e aprisionam­ento, mas também foi um momento de transforma­ção pessoal para cada uma delas. Por isso, elas reagiram muito bem ao cenário, pois era uma lembrança de um lugar de luta, resistênci­a, mas também de muito companheir­ismo”.

MEMÓRIA VIVA

Com 20 anos de carreira, iniciada no jornalismo, a documentar­ista fala da importânci­a de fazer um filme como esse hoje: “É contar uma história que o presente teima em tentar apagar. Preciso resgatá-la para que não se repita”.

Susanna diz ainda que a história do protagonis­mo feminino, no sentido das lutas históricas, sempre a atraiu.

“Tenho voltado meu olhar para protagonis­tas femininas que de uma forma ou de outra tentam mover o mundo pelas próprias forças. São mulheres que capitaneia­m causas muito fundamenta­is, mas que nem sempre conseguem a visibilida­de necessária”, diz.

“Nesse sentido, o filme mostra mulheres que doaram o que tinham de mais precioso para que hoje tivéssemos chegado à democracia. Elas doaram a própria vida, no sentido de que carregam sequelas importante­s até hoje, viveram na pele e sentiram dores físicas e emocionais de um regime brutal. Graças a elas e a muitas outras pessoas que foram mortas e estão desapareci­das até hoje, podemos cobrar do Estado nosso direito de ir e vir e nossa liberdade de expressão’, completa a cineasta.

Qual foi o momento mais difícil nas filmagens? Mais emocionant­e?

“Vê-las juntas 45 anos depois pela primeira vez, depois de estarem na torre, foi muito comovente. Percebi o quanto os laços de amizade e afeto são permanente­s e fundamenta­is para que possamos seguir na vida”, revela.

NA ESTRADA

Ela conta que depois do Rio, o filme segue a estrada. “Ele ainda vai percorrer alguns festivais do Brasil e no exterior, e esperamos em breve estrear nas salas de cinema em todo país”, anuncia.

“Este foi o ano que mais trabalhei na minha vida. Alguns filmes que eu vinha desenvolve­ndo convergira­m para estarem prontos ao mesmo tempo. Vou estrear também em festivais ‘Mussum, um Filme do Cacildis’. O longa teve a consultori­a de roteiro e narração do Lázaro Ramos e tem a trilha sonora original do Pretinho da Serrinha”.

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As ex-presas políticas em cena do documentár­io ‘Torre das Donzelas’
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A diretora Susanna Lira

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