O Dia

BÁRBARA BORGES FALA PELA PRIMEIRA VEZ SOBRE O VÍCIO EM ÁLCOOL:

‘O ARTISTA NÃO ESTÁ LIVRE DE SOFRIMENTO’

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Atriz conta ao colunista como superou o alcoolismo e os riscos que correu nesse período.

> PRESTES a completar 40 anos no dia 26, Bárbara Borges teve a coragem, mesmo sem ter a intenção de levantar qualquer bandeira, de expor publicamen­te um problema que aflige a sociedade: o vício em álcool. Ela contou estar há quatro meses livre da dependênci­a. Em sua primeira entrevista sobre o assunto, a atriz nos revela detalhes de como enfrentou a doença. Bárbara, no ar em ‘Jesus’, da Record, explica como foi o seu ‘fundo do poço’ e quais foram as formas encontrada­s para identifica­r e lidar com o problema. Mãe de dois meninos, Martin Bem e Theo Bem, ela revela ter encontrado nos filhos e na espiritual­idade a sua força para dizer não ao álcool.

O que te motivou a fazer N um depoimento nas redes sociais sobre o alcoolismo?

● Minha exposição vêm de um movimento maior de transforma­ção que começou lá atrás, principalm­ente com a maternidad­e. Não foi do nada. Quem já me segue sabe que grande parte dos meus posts falam de despertar da consciênci­a, autoconhec­imento, meditação... tudo o que tenho aprendido e que tem me ajudado no meu processo de evolução. Sei da força das redes sociais hoje em dia, o alcance, o poder de conseguir falar com mais pessoas do que imaginamos. E eu me questionav­a sobre o objetivo e propósito desse uso. Sou atriz e estou com uma novela ‘Jesus’, na Record, e adoro compartilh­ar meu trabalho. Mas já há algum tempo entendi que eu também tinha um propósito além do meu ofício de atriz: trabalhar pelo despertar da consciênci­a coletiva compartilh­ando as minhas experiênci­as pessoais. E me sinto forte o suficiente para trazer o assunto à tona e tocar nas pessoas que estejam passando pelo o que eu passei. Fazer o bem, me faz bem. Essa é a minha motivação.

Vamos começar pelas N etapas. Quando você percebeu que o álcool estava sendo danoso e um vício para a sua vida?

● Eu, que sempre me reconheci como uma buscadora espiritual, conheci em 2012 um caminho de libertação das minhas dores emocionais através da prática da meditação. Entrei em contato com muitos pensamento­s fervilhand­o na minha mente. Me aprofundei e passei a fazer terapia, astrologia, numerologi­a, usando todas as ferramenta­s possíveis para me conhecer melhor. A princípio eu estava apenas concentrad­a nas questões psicológic­as e não tinha a consciênci­a do uso abusivo de álcool. Mas a medida que eu fui mergulhand­o internamen­te e enfrentand­o meus traumas e dores, a espiritual­idade foi ampliando e me conduzindo para o meu despertar. Antes de engravidar do meu primeiro filho Martin Bem, eu vivi o que eu considero o auge do meu consumo de álcool e comecei a ficar incomodada porque ficava feliz queria beber, ficava

triste queria beber, tudo era motivo para beber e foi então que tive a primeira luz de consciênci­a da minha dependênci­a por não conseguir parar. Lembro de ter falado pra mim mesma “Quando eu engravidar, meu filho vai me salvar, porque vou parar de beber.” Engravidei logo em seguida e de fato fiquei mais de um ano sem beber, levando em consideraç­ão gestação e amamentaçã­o.

N E foi difícil?

● No início sim. Em alguns momentos, eu até usei o recurso de beber uma cerveja sem álcool. Mas não cheguei a sofrer porque a alegria de gerar meu filho foi muito maior do que deixar de beber álcool. E eu tinha muita responsabi­lidade de me alimentar bem, de estar saudável, principalm­ente pela saúde do meu filho. Eu tive a motivação que eu precisava. Dei meu primeiro passo. A maternidad­e chegou e abriu ainda mais o meu portal espiritual, vivi o início de uma mudança avassalado­ra. Martin Bem nasceu em 2014 e de lá pra cá fui caminhando passo a passo.

E entre um filho e outro? N Como foi sua relação com o álcool entre o Martin e o Theo?

● Voltei a beber entre uma gestação e outra mas é importante destacar que nas duas gestações não bebi álcool. Inclusive na amamentaçã­o. Por mais que tivesse parado de beber por um tempo, as consequênc­ias do consumo excessivo de álcool ficaram mais fortes nos últimos anos. As amnésias alcoólicas foram ficando ainda maiores. Eu estava avançando no meu despertar espiritual e começou a dar ruim. Eu tinha o álcool como uma válvula de escape, bebia para desestress­ar mas já não fazia mais esse efeito. Potenciali­zou as minhas dores. Era angustiant­e no dia seguinte. Eu passei a encontrar na meditação, no silêncio, um caminho pro meu “desestress­ar” e vivia esse choque, um duelo. Eu sabia que queria parar mas ainda não conseguia.

Quando você teve sua N consciênci­a total?

● Gosto de escrever e tenho cadernos onde eu escrevo

meus sentimento­s. Foi em 2017 que mais escrevi sobre as minhas angústias e ao mesmo tempo que mais tive clareza e consciênci­a de que aquele momento era um divisor de águas na minha vida. Falei com meu marido, minha família.

N Você externava isso?

● Sim, já externava um incômodo, uma insatisfaç­ão, sensação de desencaixe. Mas não sustentava minha convicção pois o álcool continuava presente na minha vida social e eu não estava suficiente­mente forte internamen­te. N É o grande problema dela. A bebida é o social, certo?

● Se você não está forte o suficiente sim. Eu me empoderei tanto, foi uma luta mas muito necessária. Eu falava de liberdade mas não era livre. Não é um começo nem um fim, é o agora. E está me fazendo bem pensar que sou a criadora dessa nova jornada que estou vivendo. Já vejo como eu mudei internamen­te, como eu já mudei com amigos e família, em tudo. Eu não posso dizer que eu tenho a fórmula, eu tenho consciênci­a de que isso acontece com várias pessoas. Nós olhamos para as pessoas e nunca vemos

as dores que estão estão enfrentand­o. Tudo parece lindo e maravilhos­o.

Você disse que está há 4 N meses “limpa”. Você chegou a algum fundo do poço antes disso?

● Eu escrevi que abandonei alguns hábitos que não são mais compatívei­s com a minha nova jornada, entre eles o consumo de álcool. Eu me sinto livre e leve e não limpa. E sim, claro, vivi meu fundo do poço. E a negação foi o que me conduziu até lá. Não queria aceitar enxergar o mal que estava fazendo comigo mesma. Eu era minha inimiga. A luta era comigo mesma. Tentei negociaçõe­s que não davam certo: “Ah, só vou tomar três cervejas” e era sempre mais, não cumpria. Não existe negociação! Eu fui forçando, resistindo até que me coloquei cara a cara com uma dor muito grande! Tive a certeza que não seguiria adiante. Ali era o fim. As motivações que tive nas duas vezes que consegui ficar sem beber foram as gestações dos meus filhos e agora minha motivação é a gestação de uma nova Bárbara! Uma nova maneira de viver a minha vida. Mas é importante dizer que procurei e tive ajuda e encorajo as pessoas que estão querendo parar também a pedir ajuda.

N Como sua família reagiu?

● A princípio minha família ficou surpresa com a minha atitude. Em geral as pessoas acham que não é bem assim, não é pra tanto. O entendimen­to do alcoolismo infelizmen­te é distorcido, mal compreendi­do e visto preconceit­uosamente e ao mesmo tempo naturaliza­do! “Ah, mas você não bebe todos os dias!” “Você ficou sem beber grávida”. “Ah, você não é alcoolatra!” Infelizmen­te não há o conhecimen­to real dessa doença que é mais comum do que imaginamos e atinge as pessoas em diferentes níveis. N Como foi participar do ‘Dancing Brasil’?

● Foi ótimo, maravilhos­o. Libertador. Eu tinha acabado de voltar a trabalhar depois do nascimento do Theo Bem. Gravei a novela Belaventur­a na Record e já tinha sido ótimo mas a participaç­ão no Dancing Brasil resgatou minha paixão pela dança e floresci artisticam­ente. Foi um processo intenso e a dança me fez bem. Inclusive foi ótimo porque meu foco ficou todo na dança e me ajudou na diminuição do álcool, diminuiu a vontade de beber.

Você chegou a tomar algum N remédio?

● Não. A meditação foi uma

ferramenta que me ajudou muito, me ajuda.

N Vivemos num mundo de aparências e você nunca aparentou nada. As pessoas não escutavam falar de você bêbada nas festas ou de algum vexame, certo?

● Vejo que esse é o ponto mais importante: o mundo de aparências não é real e o alcoolismo não tem uma imagem padronizad­a. Existem muitos graus do alcoolismo e eu vivi o meu, eu entendi onde bastava pra mim. Posso considerar sorte a minha não ter tido minha imagem exposta numa situação dessas porque ao invés de olharem pra pessoa que passa por isso com cuidado, vendo que precisa de ajuda, a pessoa é ainda mais exposta, ridiculari­zada e tratada com preconceit­o. Posso dizer que tive sorte de a única vez da minha vida em que vivi uma situação de risco e vulnerabil­idade por causa do álcool, num show do Rock in Rio em 2015, ter tido a ajuda de um homem que eu não conhecia. Somente dois anos depois é que ele me mandou uma mensagem e pude agradecê-lo. Isso me marcou. Estou prestes a completar 40 anos e é mais do que natural nessa etapa da vida fazermos um balanço do que vivemos, fazer ajustes do que já não se encaixa, do que precisa ser abandonado pra seguir adiante.

Como foi a reação N das pessoas após a sua declaração? ● Recebi muitas mensagens de apoio e principalm­ente de agradecime­nto, o que mais fez meu coração bater e indica que fiz o que realmente faz sentido pra mim! Mas é importante deixar muito claro que está tudo bem comigo.

O que hoje você evita N fazer? Situações como um barzinho num fim de semana? ● Não evito lugares por causa de álcool. Evito lugares onde não me sinto bem.

Você está forte a ponto N de ir a barzinho? ● Sim! Inclusive, tem na minha casa, meu marido bebe. Saí pra chopp de fim de ano com minhas amigas de infância. O álcool continua na minha vida social mas já não tem problema porque eu não tenho mais vontade de beber álcool e bebo suco de frutas. Aliás estou investindo em experiment­ar sucos de frutas variadas.

Pra finalizar, você não quis N levantar nenhuma bandeira com seu post, certo?

● Não tive a intenção de levantar bandeira, apenas compartilh­ei o que me faz bem e esse foi um elemento dentro de toda a transforma­ção que tenho vivido. É importante desconstru­ir a ideia de que o artista está livre de sofrimento. Minha bandeira é fazer o bem.

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EDDUH MORAES DIVULGAÇÃO

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