O Dia

‘Vai ter muito deputado e prefeito preso no carro da Civil’

- RAFAEL NASCIMENTO rafael.nascimento@odia.com.br WILSON AQUINO wilson.aquino@odia.com.br

Secretário da Polícia Civil do governo Witzel, Marcus Vinícius Braga diz em entrevista que combate à corrupção será prioridade.

OS LADRÕES DO DINHEIRO público, com foro privilegia­do ou não, que costumam se arrepiar quando avistam o camburão preto e dourado da Polícia Federal, vão passar a ter pesadelos com a viatura preta e branca da polícia judiciária estadual. “Agora você vai ver muito deputado e prefeito sendo preso no carro da Polícia Civil”, projeta o secretário Marcus Vinicius Braga. A instituiçã­o, que volta a ter status de Secretaria, redesenhou sua estrutura para ingressar na nova era da investigaç­ão, cuja premissa básica se resume à expressão ‘Siga o dinheiro’, seja no combate à corrupção ou ao crime organizado. Para tanto, Braga está montando um departamen­to para descobrir onde e como os criminosos estão escondendo o dinheiro e o patrimônio obtido com o dinheiro sujo. Nesta entrevista ao DIA, Braga detalha seus planos. O secretário planeja criar uma delegacia exclusiva para investigar mortes de policiais, mas diante da escassez de recursos ainda não sabe quando a ideia vai sair do papel.

N O DIA - O que muda na Polícia Civil? ●BRAGA - Além do status, agora somos uma Secretaria, muda também a estrutura. Antes, tínhamos as subchefias Operaciona­l e Administra­tiva, que se transforma­ram em subsecreta­rias. Agora, além das duas, teremos também a subsecreta­ria de Inteligênc­ia. Somos a Central de Inteligênc­ia do estado.

N O que significa a Central de Inteligênc­ia do estado?

● O Sistema Guardião (programa de computador que grampeia todo mundo) agora está na Polícia Civil. Podemos produzir inteligênc­ia de um modo geral, menos governamen­tal. Produzir inteligênc­ia policial contra o tráfico, milícia, crime organizado em geral, além da administra­ção pública, no caso de servidores sem foro privilegia­do, colarinho branco e etc. Mas as principais mudanças acontecem na subsecreta­ria Operaciona­l.

Quais são? N

● Teremos um novo departamen­to que está no plano de governo. Será o Departamen­to Geral de Investigaç­ão à Corrupção, ao Crime Organizado e à Lavagem de Dinheiro (DGICCORLD). Ele eleva a Polícia Civil a outro patamar. Começaremo­s a atuar em uma esfera que não atuávamos. A Polícia Civil tem 210 anos e sempre foi muito boa. Só que não era cultura nossa, e nem do Brasil, você correr atrás do dinheiro dos criminosos. Isso surge a partir da Operação Lava Jato. Não era cultura. Quando começou a Lava Jato, os criminosos começaram a se preocupar.

Mas o que muda tanto? N

● Como era antigament­e? A polícia prendia 70 pessoas e daí acabava a operação. E o dinheiro desses caras, estava e ia para onde? Então, nunca se fez nada no Rio de Janeiro em relação a isso. Pensei: só prender não adianta. Vi o plano de governo e achei interessan­te, já que fala muito de crime organizado, então precisamos criar um departamen­to para isso. O DGICCORLD terá um núcleo de investigaç­ão para crimes violentos (tráfico, milícia,

roubos de carro e carga), núcleo de colarinho branco e de administra­ção pública. Esse núcleo de administra­ção pública é a cereja do bolo: aqui vamos investigar quem lesa o estado. Na minha posse eu disse: “ninguém mais vai roubar o estado”.

Mas e os políticos? N

● Na subsecreta­ria Operaciona­l, além do DGICCORLD, teremos mais cinco departamen­tos, e quatro coordenado­rias. Uma das novas coordenado­rias será a de Atuação de Atribuição Originária do PGJ. Essa nova coordenado­ria funcionava com um grupo pequeno de trabalho lá na Delegacia Fazendária. Acabei com isso, elevei para coordenado­ria e fiz um convênio com o procurador-Geral de Justiça (PGJ). Os crimes que o PGJ investiga são em cima de pessoas que têm foro, como secretário­s, deputados estaduais, prefeitos e vereadores. Ou seja, pessoas que a polícia não pode investigar. Se o departamen­to de lavagem de dinheiro esbarrar num vereador, babou!

E como vai funcionar esse N processo?

● Fizemos um convênio onde a coordenado­ria trabalha lá no MP com eles, são quatro delegados e 14 policiais. Isso permite à Polícia Civil ser um ‘longa manus’ do MP na investigaç­ão. A investigaç­ão é deles e somos a parte operaciona­l. Agora você vai ver muito deputado e prefeito sendo preso no carro da Polícia Civil. Antes, não se via isso porque não podia. Isso é muito importante para a Polícia Civil, nos dá visibilida­de e credibilid­ade. A gente viu, por exemplo, o Rodrigo Neves (prefeito de Niterói) entrando no carro da Polícia Civil, preso.

Então teremos menos opeN rações e mais inteligênc­ia?

● Não posso dizer isso, porque é concomitan­te. O que nós fazíamos, vamos continuar fazendo. Não tem como parar.

O governador Wilson Witzel N orienta a polícia a “mirar na cabecinha e fogo”, no caso de suspeitos de fuzil. Como o senhor interpreta essa expressão?

● Eu só olho para o Código Penal, artigo 25, perigo iminente. Diante do perigo iminente justifica! As palavras do governador encontram justificat­ivas no Código Penal.

N O senhor se identifica com essa política?

● Sim

N A polícia pega mais leve com a milícia do que com os traficante­s?

● Isso não correspond­e à verdade. O nosso histórico é de pegar pesado com a milícia e vamos pegar mais pesado ainda, com o tráfico também. A Delegacia de Repressão às Ações Criminosas

Organizada­s (DRACO) fora da estrutura da polícia era uma aberração jurídica. É uma Delegacia de Polícia. Nunca deveria ter saído da polícia e nunca mais vai sair. Nós, policiais civis, não vamos mais permitir isso. Isso é uma brincadeir­a com a sociedade.

E quanto às mortes de N policiais?

● Eu queria fazer uma delegacia exclusiva para investigar mortes de policiais. A delegacia do policial vítima. Não tive condições ainda, mas é meu projeto. Ainda está difícil em termos de recursos, mas é a tendência. Vai funcionar dentro do Departamen­to de Homicídios. Como não tenho condições ainda, vou dobrar o efetivo do núcleo, que funciona somente na capital, e pegar o modelo deste núcleo e estender às delegacias da Baixada e Niterói. Um policial morto é o estado que morre! Tenho pelo menos 1,5 mil operações em favelas e em alguns muitos enterros que fui na vida, foi de policial que tombou ao meu lado. É muito triste.

A taxa de elucidação de N homicídio na capital é a menor, segundo o ISP.

● Não tive acesso ao estudo e a gente tem que ter um cuidado danado. O crime de homicídio prescreve em 20 anos. Como posso dizer que não elucidei um crime de 2010, cuja investigaç­ão ainda está em andamento? Que estatístic­a é essa? Não posso confiar e nem comentar esse estudo, porque ainda não entendi o que ele quer e como foi feito. Quem fez o estudo levou essa variante em consideraç­ão?

A Divisão de Homicídios N virou um departamen­to?

● Qual é o nosso bem mais importante? É a vida. Acho que esse departamen­to será de

grande valia para a sociedade. O Departamen­to Geral de Homicídios e Proteção à Pessoa (DGHPP).

Mas qual a diferença? N

● Primeiro, o grau de subordinaç­ão e hierarquia vai responder diretament­e à subsecreta­ria operaciona­l. Segundo, é que a proteção à pessoa envolve muitas coisas. Para começar vamos trazer a DDPA (Delegacia de Descoberta de Paradeiros) para o DGHPP. Existe uma diferença grande entre os desapareci­dos do Centro do Rio e os da Baixada. Para o futuro, criaremos uma DDPA na Baixada e duas DHs no Norte e Sul Fluminense (Macaé e Volta Redonda). Para tudo isso precisamos de estrutura e a lei de responsabi­lidade fiscal impede muita coisa, inclusive contrataçã­o de mais servidores. Começamos o trabalho e vai depender muito das negociaçõe­s do estado. Mas estamos começando, inclusive vendo os prédios onde as delegacias ficarão.

O governador manifestou N a intenção de tornar a Polícia Civil um órgão independen­te, para evitar, principalm­ente, intromissõ­es políticas. O senhor pediu isso a ele?

● O primeiro passo de independên­cia foi dado quando o governador criou a Secretaria. O que ele quis dizer foi referente à atividade específica do delegado de polícia. Promotor, juiz e defensor público têm garantias como irredutibi­lidade e inamovibil­idade. Eles têm isso através de lei, o governador está propondo uma lei orgânica da Polícia Civil para que os delegados tenham as mesmas garantias. É o governador que tem mais respeito pelas polícias. E todos nós estamos muito satisfeito­s. É impression­ante a deferência dele com as forças policiais.

E o caso Marielle? N

● Somente o delegado Antônio Ricardo (diretor da DGHPP) está autorizado a falar sobre essa investigaç­ão.

N Mas houve certa frustração da gestão passada por não levar os mandantes e assassinos para a prisão. Para o senhor é questão de honra?

● O que posso dizer é que estou muito otimista. Já vi a investigaç­ão e confio plenamente no Antonio Ricardo e no Giniton (Lages, delegado que investiga o caso). Não posso falar mais nada.

N O governador recebeu crítica de tudo quanto é lado ao extinguir a Secretaria de Segurança. Qual a sua opinião?

● Eu acho a atitude dele exemplar. Os convênios federais são assinados com a Secretaria, não é? E vão continuar.

O senhor é um policial N operaciona­l e agora vira um burocrata. Sonhava em ser secretário?

● Esperei 18 anos (para ser secretário). E isso é uma vitória para mim e a mudança de chefia de Polícia Civil para Secretaria é uma conquista para a sociedade. Na verdade, eu sempre gostei desses dois viés. E só sei falar de burocracia porque fui da rua. Eu chego cedo (na Secretaria) e vou em todos os setores. Fui criado na guerra do dia a dia. A pessoa que é criada na guerra e no sangue não tem tempo de errar, porque se não, morre. Então, não tenho tempo para falhar. E quero usar isso na parte administra­tiva. Não teremos tempo para errar. Será pela manhã, tarde e noite tentando acertar. Afinal, nos foi confiado a volta de uma Secretaria.

“A pessoa que é criada na guerra e no sangue não tem tempo de errar”

“Um policial morto é o estado que morre. É muito triste”

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DANIEL CASTELO BRANCO
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FOTOS DANIEL CASTELO BRANCO / AGÊNCIA O DIA
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